DIGESTIVOS
Sexta-feira,
15/9/2006
Digestivo
nº 296
Julio
Daio Borges
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Imprensa
>>> Sempre cabe mais um
E não deu outra: assim como há algumas semanas a Economist matou os jornais, nesta semana a Veja mata a televisão. A Veja, não: a internet, o YouTube. (A mesma internet que “matou” os jornais, segundo a Economist.) A diferença é que – por incrível que pareça – a matéria da Veja é melhor, em termos de morte matada. A Veja usa, para embasar suas teses, um livro que acabou de sair (e que a Campus acabou de traduzir) – The Long Tail (ou, em português, A Cauda Longa) –, enquanto que a Economist usou um livro do ano passado. (Em termos de internet, um livro velho já.) A Veja diz que o brasileiro vai continuar assistindo à novela das oito (até porque a Veja vive de dar umas tantas capas por ano para as novelas da Globo...), mas, na mesma matéria, diz que os norte-americanos não assistem mais à TV como na época de I Love Lucy (o chute é por conta da Veja e os dados são por conta de The Long Tail). Qual a conclusão? A conclusão é que, como os americanos, os brasileiros também vão deixar de assistir à novela das oito. Quando? Talvez quando os jornais acabarem – segundo o respectivo livro – só em 2043... Até lá, vamos ter de esperar. Enquanto isso, a Veja fica especulando se o YouTube vai agüentar gastar meio milhão de dólares em infra-estrutura por mês, a fim de manter apenas o site no ar. E a mesma Veja sugere que o YouTube pode afundar no mar de processos por direitos autorais, como afundou o Napster. Dez anos atrás até poderia ser, quando as gravadoras ainda eram fortes e os artistas, dos grandes catálogos, vociferavam contra Shawn Fanning nos tribunais. Hoje, o cinema está mancando, Tom Cruise é um exemplo de como os artistas estão baixando a bola – e nenhum dos dois grupos tem fôlego para brigar com o YouTube (Yahoo! Video, Google Video, essas coisas). Já as TVs preferem ficar “de bem” com o iTunes, e com o Steve Jobs – pois vêm perdendo fôlego desde antes, nos EUA, com o TiVo. A Veja, que cansou de ouvir que a internet iria acabar com o papel, agora está se vingando: “[O YouTube] é a revolução que marca o fim da TV como se conhecia até hoje”. E dá-lhe, Veja; e dá-lhe, YouTube.
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>>> A nova era da televisão
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Música
>>> Desengomando
Quem presta atenção em música brasileira, certamente conhece Henrique Cazes. À frente do cavaquinho, é instrumentista de primeira água: já dividiu o microfone com Raphael Rabello e ampliou o repertório do instrumento como ninguém nas últimas décadas. Como autor de livros, Cazes biografou nada mais nada menos que o choro, em volume que se tornou referência pela Editora 34. Também não deixou de publicar histórias engraçadas sobre a vida de músico (no Brasil, tragicômica). Para completar, Henrique Cazes celebra 20 anos como produtor musical, pela Kuarup, e a gravadora relança agora seus primeiros três discos. São exatamente 30 anos fazendo as honras do instrumento que tem Waldir Azevedo como santo padroeiro, o compositor do inescapável “Brasileirinho”. Cazes homenageia Azevedo logo no seu segundo disco “solo” (de 1990), onde divide faixa com outra referência destes tempos, Paulo Moura (em “Pedacinhos do Céu”). No seu début, Henrique Cazes (1988), passeamos por peças de gente como Pixinguinha e Hermeto Pascoal, fora obras do próprio Cazes: “Estudo nº 1”, “Valsa para Radamés” e “Coisa de Garoto” – para o repertório de um estreante, as referências já anunciavam um futuro promissor. (Se os inúmeros debutantes em disco de hoje conhecessem, assim, os fundadores da música instrumental brasileira, teríamos muito mais qualidade nas estréias – e muito menos CDs...) O terceiro álbum, justamente, dá conta de uma “breve história do choro”: Desde que o Choro é Choro (1995) – um título que parece conversar com “Desde que o samba é samba”, de Caetano Veloso, presente no Tropicália 2 (de 1993). Curiosamente, a rivalidade choro-samba às vezes desponta, como desponta aquela resistência à música instrumental por parte de quem, ainda mais no Brasil, prefere “música com letra”. Para acalmar o ânimo de todos, sambistas e chorões, basta lembrar que a canção que deflagrou a bossa nova (para João Gilberto, era tudo samba), era um autêntico choro: “Chega de Saudade”. É, em resumo, a mensagem de Henrique Cazes desde 1976.
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>>> Henrique Cazes | Henrique Cazes tocando Waldir Azevedo | Desde que o Choro é Choro
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Artes
>>> Action culturelle
Todo ano tem o seu megaevento cultural. Desde o Rodin que provocou filas no quarteirão da Pinacoteca do Estado até Guerreiros de Xi’an que foi o canto de cisne de Edemar Cid Ferreira, grande parte dos paulistanos parece que ainda precisa de um estouro de bilheteria para sair de casa uma vez por ano. Em 2006, é a vez do Cirque du Soleil. Outdoors do Bradesco com os principais personagens do espetáculo ornam a cidade inteira – e se é verdade que o patrocinador obteve lucro recorde no último exercício, será que precisava de Lei Rouanet? Se o Bradesco não patrocinou enfiando a mão no próprio bolso, mas pagando grande parte com dinheiro do Governo, e os ingressos continuam caros, alguma confusão contábil deve haver. E com ingressos caros assim, como é possível que esteja tudo “sold out” antes mesmo de a temporada começar? Os marqueteiros dos eventos culturais na metrópole têm necessidade de criar (e de alimentar) mistérios desse porte... O Circo é um circo mesmo, mais estilizado, sem os animais na jaula e sem as aberrações de outrora, como o anão e a mulher barbada. Em princípio, para efeito de show, cada modalidade é levada ao seu extremo. Então os trapezistas se arriscam muito mais que o necessário, as demonstrações de força e de equilíbrio beiram os limites do iron man, e a habilidade com as mãos, aliada à velocidade dos movimentos, tem de impressionar o público dos efeitos especiais do cinema. Aliás, nesse ponto, o palhaço é ilustrativo, combinando mímica e sons de videogame. A história do entretenimento começa no circo, no pão-e-circo – e nas olimpíadas. No presente, com tanta concorrência da tecnologia, não é fácil reinventar o circo. É preciso matar mais de um leão por dia. Logo, o Cirque du Soleil, apesar de toda a pirotecnia via marketing, talvez mereça o sincero aplauso do respeitável público...
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>>> Cirque du Soleil
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Internet
>>> Entertaining entrepreneurship
Dizem que o brasileiro é um povo empreendedor, mas o melhor podcast sobre o assunto vem dos EUA e se chama Venture Voice. E por que o empreendedorismo poderia interessar nesta altura do campeonato? Porque ele é, hoje, o motor da internet. Toda a propalada revolução da Web 2.0 passa, como não poderia deixar de ser, pelos empreendedores da internet. E Gregory Galant, do Venture Voice, conversou com boa parte deles. Detalhe: neste momento, em que a História está acontecendo – e não anos, décadas ou séculos depois do fato, como fazem os jornalistas da mídia velha. Quer saber sobre blogs e sobre o sujeito que cunhou o adágio “a blogosfera dobra de tamanho a cada seis meses”? Ouça o episódio com David Sifry, fundador do Technorati. Quer descobrir porque os chamados “social bookmarks” estão matando o editor e transferindo todo o controle, sobre as manchetes, para a audiência? Ouça Jay Adelson, junto com Kevin Rose – o homem de 60 milhões de dólares da Business Week –, fundadores do Digg. Galant, ao contrário de outros podcasters, não se perde em intrigas geradas pelo mercado: foca no que há de empreendedorismo nessas e em outras iniciativas. Quanto você gastou para começar sua empresa na internet? Quando você percebeu que precisaria da ajuda de investidores? Como fez a transição de um time centrado em você para uma organização que precisava andar pelas próprias pernas? Caetano Veloso, depois de ler Joaquim Nabuco, saiu proclamando aos quatro ventos que o sonho de todo brasileiro era ser funcionário público. Ué, e o nosso lado “empreendedor”? No Venture Voice, fica registrado que não existe inimigo maior do empreendedorismo, e da inovação, do que a cadeira confortável do emprego. Se alguém se animasse a montar uma “filial” do Venture Voice no Brasil, ainda em formato podcast, talvez o brasileiro pudesse se convencer do contrário – com exemplos.
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>>> Venture Voice
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Literatura
>>> Corpo de delito
Ao contrário de André Laurentino que teve as bençãos da organização, Cesar Garcia Lima passou alguns anos indo à Flip e observando. Na edição de 2005, distribuiu versões de seus poemas em forma de cartão postal – e alguém que recebeu, sugeriu de chofre: Por que você não faz um livro disso? Cesar fez, e lançou na Flip 2006 – mais precisamente, no Off Flip 2006. Agora, no dia 13, esse acreano que atualmente reside no Rio, e trabalha com jornalismo, vem a São Paulo promover Este livro não é um objeto, sua coleção de poemas-postais, às 19 horas na Casa das Rosas. Na Flip 2006, Cesar observou que a poesia parece que ainda precisa de explicação, enquanto que a prosa é lida pelas pessoas sem bula ou manual de instrução. Cesar estava desanimado com a mesa de poesia da Flip que, conforme o adágio, traz anualmente um poeta de verdade e dois de mentira. Assim como a antiga mesa de “literatura feminina”, a mesa de poesia provoca sempre um certo estranhamento, como se poesia não fosse literatura. A mesa de literatura feminina foi abolida em 2005; a de poesia, ainda não. As cantigas de Cesar não são muito de amor, nem de amigo, são mais de escárnio e maldizer, como este trecho do poema título: “Não alimente o animal acometido de loucura e carinho a vagar entre a ficha catalográfica e a orelha”. Cesar está falando do autor (ou do leitor)? Cesar, se quer vender seu livro, deve estar falando de si próprio. Cesar é um grande crítico de si: “Poemas publicados são angústia, filhos imperfeitos ao alcance dos erros”. E deixa escapar, nesse embalo, alguma observação para toda a sociedade: “Jovem culto e vazio procura mulher oca para troca de silêncios”. A idéia de Este livro não é um objeto soa divertida, e o leitor pode cometer um verdadeiro atentado poético remetendo um cartão bem ácido ao seu maior desafeto. Cesar Garcia Lima, com Flip ou sem Flip, está organizando seu happening. E provando que a literatura pode ser salva, também, com idéias extraliterárias.
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>>> Cesar Garcia Lima
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>>> O CONSELHEIRO TAMBÉM É ENTREVISTADO NO RÁDIO
Ouça aqui a entrevista que Julio Daio Borges, Editor do Digestivo, concedeu a Cristiana Brandão, para o programa Diversão e Arte, da Rádio Guarani (FM 96,5 Mhz), de Belo Horizonte, que foi ao ar nesta terça-feira, dia 12, às 21 horas, e que reprisa na próxima segunda, dia 18, às 6h30.
>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA
O Viandier, Casa de Gastronomia, convida novamente os Leitores do Digestivo Cultural para o workshop "Sabores do Mediterrâneo", com o chef Pier Paolo Picchi, nesta quarta-feira, dia 13, às 19h30, e para a palestra "A Renascença e as Navegações", com o professor Ricardo Maranhão, nesta quinta-feira, dia 14, também às 19h30, (O Viandier fica na alameda Lorena, nº 558, nos Jardins e o telefone, para reservas, é: 11 3057-2987 ou 3887-2943 – ou pelo e-mail).
>>> Palestras
* Manual de Treinamento e Desenvolvimento
Gustavo Boog e Magdalena Boog
(Ter., 19/09, 19h00, VL)
* O profissional competitivo: razões, emoções e sentimentos
Carlos Roberto Faccina
(Qui., 21/09, 19h30, VL)
>>> Autógrafos
* Histórias de viagens contadas por quem sabe - Rodrigo Pereira
(Seg., 18/09, 19h00, CN)
* Franquias: bares, restaurantes, lanchonetes, fast-foods e similares
Percival Maricato
(Ter., 19/09, 19h00, CN)
* A TV sob controle - Laurindo Lalo Leal Filho
(Qua., 20/09, 18h30, CN)
* Jornalistas que valem mais de 50 contos - José Sérgio Rocha
(Qua., 20/09, 18h30, CN)
>>> Exposições
* Exposição de Jean-Baptiste Déchery
(De 6 a 25/09, Seg. a Sex. das 9 às 22 horas, CN)
>>> Shows
* Mozart e Haydn - Quarteto Portinari
(Seg., 18/09, 20h00, VL)
* Brass Bands - Eureka on the street
(Qui., 21/09, 19h30, MP)
* New Orleans: O blues, suas ruas e praças
Traditional Jazz Band
(Sex., 22/09, 20h00, VL)
* Mulheres nas voltas do mundo - Daniela Rezende
(Sáb., 23/09, 17h00, MP)
* Espaço Aberto - Orquestra Popular Brasileira da FAAM
(Dom., 24/09, 18h00, VL)
* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional (CN): Av. Paulista, nº 2073
*** Livraria Cultura Market Place Shopping Center (MP): Av. Chucri Zaidan, nº 902
**** a Livraria Cultura é parceira do Digestivo Cultural
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Julio Daio Borges
Editor
* esta seção é livre, não refletindo
necessariamente a opinião do site
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
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13/9/2006
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22h47min
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Ler a Veja ou não ler: eis a questão. Uma revista de muitas propagandas e jornalismo ideologicamente comprometido com uma classe social burguesa; nem sempre busca apurar a estupidez humana porque já é corriqueira, como exemplo as doenças provindas das queimadas de cana, mas às vezes não PODE DENUNCIAR, POIS O LUCRO É MAIOR e bem maior do que os salários dos miseráveis, que nem ambiente de trabalho saudáveis têm. Mas muitos destes lucros foram pra campanhas políticas, porque no Brasil elege-se negociantes; estes, por sua vez, elaboram trambiques que fazem do poder público balcão de negócios e recebem o nome de deputados. Mas deixa pra lá...
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