DIGESTIVOS
Sexta-feira,
6/10/2006
Digestivo
nº 299
Julio
Daio Borges
+ de 4400 Acessos
+ 2 Comentário(s)
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Cinema
>>> Tempos de glamour
Quem lê Ruy Castro agora em Carmen, vencedor do Jabuti de não-ficção, deve ficar se perguntando como ele pode escrever tão bem e entender tanto de cultura popular. Acontece que Ruy Castro não surgiu do nada; nem começou com Carmen. Um filme é para sempre, seu livro que acaba de sair do forno, pode ser um ponto de partida para alguns dos segredos mais bem guardados do autor da biografia da Pequena Notável. O volume, com organização de Heloisa Seixas (que passou dez anos convencendo Ruy), reúne 60 artigos sobre cinema, publicados na imprensa de 1975 pra cá. De Bob Fosse a John Wayne, passando por Jerry Lewis, Kubrick, Bete Davis e até pela Geração Paissandu – todos são objeto de escrutínio do autor de Chega de Saudade. Também James Dean, Groucho Marx, Woody Allen, Jacques Tati, Pauline Kael e mesmo Max Factor. Se considerarmos os 30 anos que o livro abarca e se considerarmos, ainda, que o biógrafo “aconteceu” de 1990 pra cá, ou seja, há coisa de 15 anos, Um filme é para sempre encerra alguns dos últimos anos de formação de Ruy Castro. Afinal, como já dizia Oscar Wilde, a crítica é a mais civilizada forma de autobiografia. O volume de pouco mais de 400 páginas, além de tratar de cinema, e além de revelar algo sobre seu autor, fica, ainda, como registro do século em que a sétima arte reinou absoluta. O cinema foi, no século XX, a “obra de arte total”. Se não foi ocupação full-time de artistas, foi paixão eterna de diletantes – e se não foi nem um nem outro, serviu de “imaginário” para gerações e gerações. O século passado que, dizem, acabou em 2001 com o atentado à Torres Gêmeas, acabou, justamente, com um ataque cinematográfico. Por razões que não cabem aqui, contudo, o cinema, como a música, como indústria, está acabando. Se você duvida, leia agora o Ruy – apure, em matéria de tela grande, como estávamos e como estamos.
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>>> Um filme é para sempre
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Literatura
>>> Diversos instantes del reino
A Alfaguara tem um projeto reconhecível à distância. Uma iconografia de cinema nas capas; os tipos que lembram, no computador, a fonte Times New Roman; o formato mais comprido dos volumes; o papel um pouco mais grosso; e até o cheiro diferenciado. Os brasileiros tiveram um gostinho disso com a chegada da editora Planeta no Brasil – mas parece que o mercado editorial espanhol desembarcou mesmo, de verdade, com a Alfaguara. A partir da venda da editora Objetiva, para o grupo Prisa-Santillana, da Espanha, se materializaram, no País de Machado, os primeiros títulos. O carro-chefe é o novo romance de Mario Vargas Llosa: Travessuras da menina má, do alto dos 70 anos do escritor peruano. Na seqüência, chama a atenção um romance inédito de Truman Capote, Travessia de verão, na esteira do filme. Ainda, uma belíssima edição de Um retrato do artista quando jovem, de Joyce, aos cuidados da mesma tradutora festejada pelo seu trabalho em Ulisses, Bernardina da Silveira Pinheiro. E, dialogando mais amplamente com o português e com o Brasil, uma coletânea introdutória a Fernando Pessoa, com organização de Luiz Ruffato, Quando fui outro. Fora Grandes Símios, de Will Self, evocando A metamorfose, de Kafka; e Onde os velhos não têm vez, de Cormac McCarthy, o escritor norte-americano mais elogiado por Harold Bloom. Isso tudo foi só em setembro. Agora em outubro (se você for capaz de guardar): Amitav Ghosh, Roberto Pazzi, Santiago Rocangliolo, Pearl S. Buck e o primeiro autor brasileiro contratado, Carlos Heitor Cony. Com tantos ensaios, nos últimos anos, de abalar as estruturas, a Alfaguara parece a iniciativa mais consistente de todas. Qual será o impacto desse despejar de títulos de qualidade, impecavelmente bem-acabados? Nem só do mercado financeiro, no Brasil, vivem agora os espanhóis...
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>>> Alfaguara
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Música
>>> Assai agitato
Com a venda do BankBoston para o Itaú, no Brasil, a temporada de Concertos BankBoston passou, imediatamente, a receber a denominação de Concertos Itaú Personnalité. A mudança de nome não alterou a natureza da iniciativa, felizmente, e, entre um Schubert e um Brahms, pudemos apreciar, no final de setembro agora, um Reich, com o Quarteto de Leipzig. Não o Reich da psicologia, Wilhelm, mas o Reich da música, Steve, nascido em 1936. Different Trains, para quarteto de cordas e fita magnética, é uma daquelas intrigantes peças da produção contemporânea. O autor, um traumatizado na infância pela separação dos pais, resolveu exorcizar os fantasmas dos trens que tinha de tomar, da casa do pai para a da mãe (e vice-versa), numa obra que alterna o aflitivo soar dos trilhos (através das cordas) com os anúncios do maquinista. “De Chicago a Nova York”, por exemplo, é um bordão que foi repetido à exaustão – indicando que o artista não tinha, pelo visto, particular apreço por esse trecho. Ou percorreu-o tantas vezes quanto dá a entender pelo tédio e pela exasperação, e não quer percorrê-lo nunca mais. “No meu aniversário” é outro bordão; e “naqueles vagões de gado” é um terceiro. A imprensa falou, inevitavelmente, em anti-semitismo, Holocausto e Segunda Guerra, visto que esses “acontecimentos” são centrais na composição. O primeiro movimento, aliás, é “antes da guerra”; o segundo, “durante a guerra”; e o terceiro, previsivelmente, “após a guerra”. Com tantas implicações, e subtextos, por um momento, Reich parece mais complexo que o primeiro Schubert e que o último Brahms. Talvez, contudo, não faça sentido a comparação. Schubert apareceu em bloco, com seu Quartettsatz (Quarteto de cordas nº 12 em dó menor D 703), e Brahms, com seu Quarteto nº 2 (para cordas em lá menor op. 51). O sanduíche (música, não-música, música) ilustra nossa fome de sentido. A tragédia ou a utopia é uma questão de gosto. Que o Itaú Personnalité conserve a instigante série nos próximos anos.
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>>> Concertos Itaú Personnalité
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>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA
>>> Palestras
* O processo criativo na arquitetura - Apresentação do livro 'Samuel Kruchin'
Samuel Kruchin
(Seg., 09/10, 19h00, VL)
>>> Autógrafos
* Educação e Cooperação Internacional na Proteção do Meio Ambiente - Liliana Allodi Rossit
(Sex., 06/10, 190, VL)
* Marcelino por Claudia - Claudia Matarazzo
(Ter., 10/10, 19h00, CN)
* Redução da Inadimplência no Setor da Educação - Dorival dos Santos Machado
(Ter., 10/10, 18h30, MP)
* A Arte da Fraude - Maurício Ricardo Tinello
(Ter., 10/10, 19h30, VL)
>>> Shows
* Marcas de ayer - Adriana Mezzadri
(Sab., 07/10, 17h00, MP)
* Andarilho - Projeto B
(Dom., 08/10, 18h00, VL)
* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
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Julio Daio Borges
Editor
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COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
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7/10/2006
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14h07min
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Parece que os espanhóis não estão mesmo pra brincadeira. E quem ganha são os leitores. Seja bem-vinda, Alfaguara!
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8/10/2006
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20h06min
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Olá, ainda não li o livro do Ruy, mas sou de uma geração que passou bons momentos diante da tela da tv assistindo clássicos no Corujão, da Globo. Alguns diriam que foram tempos alienantes e uma perda preciosa de tempo. De certa forma, é isso mesmo. O cinema tem estas possibilidades: perder ou ganhar um tempo precioso; alienar ou conscientizar. E mesmo, apenas gozar... Seja como for, não há mesmo como entender esse fascinante século XX sem o cinema. Apenas para exemplificar: quer algo mais representativo desta sociedade neoliberal do que "O corte", de Costa-Gravas?
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