Digestivo nº 348 >>>
Parece que todos os ficcionistas hoje também têm de encarar o 11 de Setembro. Desde o inglês Martin Amis – que leu os primeiros esboços de Casa de Encontros na Flip – até grandes nomes da literatura norte-americana, como John Updike, passando por best-sellers como Frederick Forsyth, todo mundo se inspira no primeiro fato histórico do século XX, para escrever sobre terroristas, fundamentalistas e/ou simplesmente the american way. E se um dos melhores livros de não-ficção sobre o assunto parece ser mesmo o de Lawrence Wright, um dos melhores de ficção, justamente, parece ser o de Don DeLillo. O autor de Nova York já havia acertado na mosca em Cosmópolis, mas, infelizmente, quando o livro chegou (em 2003), o assunto já não era mais – por motivos óbvios – os novos yuppies, da chamada nova economia, tão cibernéticos quanto desumanizados, quanto superpoderosos. Homem em Queda, que chega agora, enfrenta a desvantagem de suceder uma porção de tiros n’água literários – e ainda que não seja a obra-prima sobre o 11 de Setembro é talvez a descrição ficcional que mais se aproxima do desastre, nas primeiras e nas últimas páginas. Nas primeiras, o protagonista caminha entre os escombros e vemos, nitidamente, a Nova York logo depois dos ataques (DeLillo deve ter presenciado – ou apurado em detalhes). E nas últimas, o mesmo protagonista volta à cena dos ataques, só que, desta vez, em retrospecto, e dentro das Torres Gêmeas. No meio, uma historinha boa, mas banal (sobre separação e reconciliação). Parece que o volume se justifica pelas bordas e não pelo miolo. DeLillo, obviamente, já passou da idade de captar o 11 de Setembro em sua totalidade – se é que alguém o fará (Philip Roth?) –, mas apenas algumas páginas de Homem em Queda, vale repetir, são, até agora, a melhor recompensa para quem quer mergulhar literariamente na catástrofe.
>>> Homem em Queda
O 11 de Setembro teve conseqüências fortes na sociedade em que vivemos? Esta é uma pergunta extremamente interessante na qual deveríamos pensar. Afinal, o 11 de Setembro desencadeou duas invasões (uma delas sem o aval da ONU) e um sentimento de paranóia que pode ser a fonte de várias perdas de liberdades individuais (a cidade de Londres, repleta de câmeras nas ruas, ou o fichamento de quem entra ou sai de certos países é uma prova disso), entre outras conseqüências, perceptíveis ou não. Mais do que se interrogar sobre a catastrofe, seria interessante se nos interogássemos sobre as conseqüências deste fatídico dia sobre a sociedade e seu modo de pensar, assim como escritores como Semprun ou Antelme tentaram elucidar os efeitos que tiveram os campos de concentração sobre os homens, não só fisicamente, como também psicologicamente e intelectualmente. Um livro assim seria, na minha opinião, extremamente interessante e marcante.