Digestivo nº 367 >>>
Foi Alexandre Inagaki, no Twitter, que bem definiu: "Contardo Calligaris é o novo Chico Buarque". Segundo o empreendedor por trás do conteúdo do Interney Blogs, Calligaris é mencionado, entre suspiros, por nove a cada dez leitoras da Folha. Foi estratégico, portanto, o lançamento de seu primeiro romance, pela Companhia das Letras, com o sugestivo título: "O Conto do Amor". Tudo pareceria uma grande sacada de marketing — para fisgar corações de leitoras solitárias —, se o livro não fosse bom... Pois O Conto do Amor é um belo policial, misturando pitadas de romance, com uma escrita que prende, e um desfecho assaz interessante. Mesmo as leitoras mais fervorosas de Calligaris na "Ilustrada" provavelmente não imaginavam que, em sua estréia, ele pudesse ir tão longe. Na onda dos livros autobiográficos ma non troppo (ou não-assumidos, ao menos), O Conto do Amor tem um protagonista igualmente psicanalista, com origens italianas também, que se vê diante de um mistério familiar — quando, antes de morrer, seu pai pronuncia as últimas palavras. Ajudado por uma especialista na arte da Renascença, fica entre Florença e Nova York, lendo o diário secreto da vida inteira do pai e seguindo seus passos a fim de esclarecer um passado escondido... Calligaris não vai ganhar nenhum prêmio literário, claro, mas pode vir a ser um expoente de um gênero sempre tão desprezado no Brasil, o da leitura de entretenimento.
>>> O Conto do Amor | Duas perguntas para Contardo Calligaris
Que bom ver, aqui, um assunto que adoro: livros. Estou precisando ser seduzida por um livro. Com este título, melhor ainda. E, pra finalizar, com a editora que amo. Pronto. Um pacote completo.
As entrevistas com o Calligaris são sempre muito interessantes. Confesso que não conheço muito ele, só sei que suas aparições na mídia têm aumentado bastante ultimamente, mas fiquei bem curioso para ler o romance, apesar de não ser seu leitor e não ter o hábito de ler a Folha.
Os textos desse sujeito na Folha têm uma empolação errada. Não sou crítico literário e não vou aqui tentar parecer ter razões objetivas, mas ele sempre me parece estar fazendo uma análise com uma mulher desinformada: com uma mulher --- porque fala de sentimentos, durante tres folhas, num canal em que homens geralmente não toleram mais que tres palavras... Falo de homens da literatura: escritores e leitores. Mulher desinformada, porque ele explica demais: bons escritores têm elipses confortáveis e prazenteiras aos bons leitores. Acho ele o novo ghost writer da Sabrina, Julia, essas coisas... respeitadas as devidas proporções. O fato de o sujeito estar semanalmente num jornal talvez também me incomode. Grandes escritores, um Campos de Carvalho, são econômicos e sabem que todos temos poucas idéias boas para publicar na vida. Não suportam o ralo semanal e uma publicação livresca ao mesmo tempo... Raríssimas exceções. Baseado nas crônicas semanais: não li e não gostei.
Pedro Gamba não gosta de Contardo porque ele escreve semanalmente... Ponto. Ah, esses leitores de mente fechada que endeusam um ou dois autores e acreditam que são tão cultos quanto seus ídolos. Ler e entender Camões não faz de você um Camões! Portanto, desça do pedestal do "não li e não gostei". Em tempo: grandes autores brasileiros foram colunistas e articulistas de jornais impressos.
Olha, a ser verdadeira a afirmação de Pedro Gamba, teremos que jogar no lixo todas as peças do Nelson Rodrigues (que escrevia louca e desenfreadamente), os livros da Clarice Lispector, os do Ruy Castro, os do Luis Fernado Verissimo, Caio Fernando de Abreu, Graciliano Ramos, Carlos Drummond de Andrade.
Quanto ao "Temos todos poucas idéias para publicar na vida", desculpe, mas ainda bem que Shakespeare não sabia disso, ou não teria escrito tantas obras primas em tão pouco tempo (se não me engano, "Otelo", "Rei Lear" e "Macbeth" em pouco menos de 2 anos). Existem bons escritores e maus escritores. O que ambos fazem com as suas habilidades (ou inabilidades) é totalmente irrelevante para se aferir a qualidade de uma obra. E quem já leu Proust sabe muito bem que bons escritores podem falar mais do que 3 páginas (até mais do que 3 volumes) sobre sentimentos. Enfim: é mais fácil ser econômico e falar apenas: não estou a fim de gostar. É um direito garantido certo?