Digestivo nº 410 >>>
Enquanto as empresas jornalísticas do Brasil passaram os últimos anos baixando o nível de suas publicações, num esforço inútil para combater a expansão da internet e numa tentativa desesperada de atingir a audiência da televisão (leia-se, classes C e D), novas publicações, de altíssimo nível, cresceram e frutificaram, como a revista Piauí, mais lida que muitos cadernos de jornal, que cada vez menos gente assina, e que muitas revistas antigas, que cada vez menos gente folheia. Na era do presidente que não fala nem a própria língua direito, a elite — envergonhada, se é que sobrou alguma — andava órfã de um texto que não fosse puro press-release, que não fosse a crônica preguiçosa de dinossauros ou trainees e que justificasse, simples e apenasmente, a sua impressão em papel (a derrubada de árvores sem nenhuma culpa). E não é que, dois anos depois de ter literalmente humilhado a "intelligentsia" jornalística tupiniquim, com a Piauí (e seu texto incomparável), a família Moreira Salles volta à carga, em plena fusão do Unibanco com o Itaú, com a nova revista Serrote, de ensaios? Em pleno País do Fantástico, das telenovelas e do Big Brother, Flávio Pinheiro, Matinas Suzuki Jr., Rodrigo Lacerda e Samuel Titan Jr., corajosamente, despejam mais de 200 páginas de E.B. White, Edmund Wilson, H.L. Mencken, com capa de Saul Steinberg; e, para salvar a honra dos homens de letras daqui, Mário de Andrade, Modesto Carone e Alberto Dines. A periodicidade, quadrimestral, foi criticada, mas imagina-se que a Serrote não queira viver só de traduções, como a Granta, e nem tenha de apelar para "luminares" da nossa cultura, como Arnaldo Jabor, Carlos Diegues e os sobreviventes da Geração 90. Que a Serrote continue assim, "fazendo tremer", como no verso de Murilo Mendes — e não se curvando, como as demais, ao populismo reinante.
>>> Revista Serrote
É nisso que dá ficar alimentando os peixes de cada divisão do Grande Aquário, do qual o Brasil é uma, com duas rações: Informação Cultural e Veneno Social; sem a Pipeta Laboratórial com que os europeus nos tratavam antes da grande troca do JK. Vieram os de Manhattan, com Canecas Viciadas, que teimavam em colocar muito mais da segunda ração do que da primeira, feito homem fazendo café: sempre pondo um pouco mais de pó por segurança. O Veneno Social se voltou contra o próprio Envenenador, que foi perdendo sensatez e ganhando parte da Idiotização Dirigida a que se propusera com o Patrão Nacional, fantoche das Agências Internacionais; nas águas do sudeste em que o peixe gostava de nadar. A qualidade foi diminuindo em todas as profissões e os editores, de tanto analisarem o comportamento do peixe, hoje acham que soltar bolhinhas iguais às dele é uma Grande Linguagem. Pelo menos, o insucesso dos movimentos separatistas serviram para aproveitarmos a algo válido e vindo do norte do país.