Digestivo nº 426 >>>
Ariano Suassuna tem como uma de suas principais influências Miguel de Cervantes e encontra no Nordeste brasileiro um lado medieval, que persiste, apesar da vinda da Corte (século XIX), da proclamação da República (século XX) e da chamada globalização (século XXI). Quem duvida, deveria escutar O Alumioso, do músico Di Freitas, lançado pelo Selo Sesc, um dos mais dedicados à pesquisa de música realmente brasileira. Além do Nordeste, de compositores como Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira (em "Juazeiro", que abre o disco), encontramos, nas composições de Di Freitas, surpreendentes traços de música indiana e árabe (em "Cantigas de Mouro"), africana e caribenha (em "Salsa com Baião"), música caipira (em "Lavras da Mangabeira") e, inclusive, a poética dos romances de cavalaria (em "Flor de Algodão", com participação de Juliana Amaral). Di Freitas, que também atende por Francisco, como se não bastasse, fabrica instrumentos e alterna criações suas, enriquecendo as faixas em sonoridade, com violoncelo de cabaça, marimbau e rabeca igualmente de cabaça, fora lira nordestina, "viola de 13", violão e alaúde. Sem contar os sopros, como clarinete e flauta doce, que também toca. Com passagens dedicadas a outros mestres, como Nonato Luiz, O Alumioso é tão vasto em influências do cancioneiro de diferentes tradições que mal conseguimos defini-lo — o que está OK, já que nem Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc, nem Antonio Madureira, mais próximo ao músico, conseguem. Realizações como essa, de Francisco "Di Freitas", indicam que sempre há, no Brasil, culturas a serem descobertas.
>>> O Alumioso
Não é à toa que Di Freitas recebeu esse belo comentário. Ele é desbravador e autêntico, ao mesmo tempo que um mestre e lutador pela preservação da nossa cultura. Recomendo e assino embaixo.