Digestivo nº 459 >>>
Enquanto os jornais estão contando com o iPad para "reinventar" a Web (tentando "cobrar" pelo mesmo conteúdo que hoje todo mundo tem de graça), Hal Varian, economista-chefe do Google, trouxe notícias não muito auspiciosas para a mídia impressa... A circulação dos jornais dos EUA, que vinha caindo desde 1990, desabou nos últimos 5 anos. Se o número de exemplares por domicílio era "maior que 1,2" nos anos 50, na última década foi "menor que 0,6". Embora a circulação em números absolutos não tenha caído, a população norte-americana cresceu e as receitas com anúncios estão, atualmente, no nível de... 1982. O número de jornais comprados por pessoa, nos EUA, é metade do que era na década de... 60. Hal Varian considera que a circulação seja um problema de médio/longo prazo, enquanto que a queda nas receitas é um problema de curtíssimo prazo. Muitos jornais praticamente não chegaram na era da internet, pois menos de 10% de suas receitas vêm do chamado "on-line". Já pelo lado das despesas, Varian acredita que "se os jornais abdicassem da impressão e da distribuição, cortariam seus custos, no mínimo, pela metade". Dentro do "bolo publicitário", a participação dos jornais, nos EUA, caiu de "mais de 36%" (em 1949) para "menos de 15%" (em 2009). Ainda que o PIB suba, e também a renda per capita, as receitas dos jornais, ultimamente, só decrescem... Para completar, a internet (42%) ultrapassou os jornais (33%) como "fonte de informação", nos EUA, desde 2008. E um dos problemas econômicos, daqui para frente, é que o modelo de "subsídios cruzados" (cross subsidization) não funciona mais... Os jornais, na realidade, nunca ganharam dinheiro com "notícias brutas" (hardnews), mas através de editorias especializadas. Ocorre que, na internet, as pessoas preferem acessar os sites especializados nessas áreas, e Varian dá o exemplo do Yahoo! Finance, da Amazon, do Orbitz (para Viagens) e do Zillow (para Imóveis). Mesmo o Google, o pai do AdSense, acha difícil "monetizar" notícias brutas (as únicas que sobraram para os jornais) — porque elas são, por princípio, uma commodity (sem valor agregado). O desespero da mídia impressa, portanto, é justificado: o que lhes dava dinheiro antes... não poderá mais ser monetizado... E no Brasil não é diferente (embora os jornalistas disfarcem)... No mês passado, o IVC divulgava as seguintes quedas, nos nossos periódicos (só no ano de 2009): O Dia (-31,7%), Diário de S. Paulo (-18,6%), Jornal da Tarde (-17,6%), Extra (-13,7%), O Estado de S. Paulo (-13,5%), Diário Gaúcho (-12%), O Globo (-8,6%), Folha de S. Paulo (-5%), Super Notícia (-4,5) e Estado de Minas (-2%)... Sobrou até para o Google fazer a "lição de casa" dos jornais (e para Hal Varian, a dos jornalistas)...
>>> Newspaper economics: online and offline (áudio | slides)
Por que estes períódicos não abandonam as suas ideologias dominantes e começam a ser um pouco mais ousados e investigativos? Somente assim vão despertar no leitor o interesse. Pois até hoje procuro na internet o olhar investigativo. Um exemplo em São Paulo foi a homenagem feita a Manuel Marulando, que não foi noticiada por nenhum órgão da imprensa brasileira. Evidente que descobri, mas num imprensa fora do País. E pela internet.
Se os periódicos se afastassem do modelo de notícias da internet teriam maiores chances de sobreviver. A internet, por seu próprio formato, traz as notícias mastigadas, resumidas, com pouco trabalho investigativo. Os jornais impressos poderiam se afastar disso: matérias mais longas, mais aprofundadas. É verdade que, cada vez mais, podemos procurar veículos especializados, mas não vamos procurar aquilo que não sabemos que existe, aí pode estar a sobrevivência do jornalismo impresso.
Essa semana houve uma greve de professores em São Paulo. Folha e Estadão primeiro disseram se tratar de meia dúzia de gatos pingados. Outra manifestação, com centenas de professores indignados com a situação da educação no país e com sua própria situação. Folha e Estadão tentaram vincular a greve a grupos políticos adversários do governador Serra, e não ao salário de fome e às precárias condições dos mestres. Ok, ok, os professores são maus, o governador é um herói puro e bondoso e a Folha e o Estadão recebem vultosas quantias em publicidade estatal (como os professores poderiam pagar propaganda na mídia impressa?!). Com uma imprensa de tal modo vendida e corrompida por verbas publicitárias, como seria possível o povo brasileiro ler tanto jornal? Mesmo porque, lembremos, as políticas do PSDB, PT, PMDB etc, de empobrecimento e exploração do povo são cada vez maiores. Não sobra tempo nem dinheiro para ler jornal, como fazem os britânicos, franceses, alemães e norte-americanos...