Digestivo nº 484 >>>
Comer, Rezar, Amar, como best-seller, pode ter irritado a elite highbrow, mas, vendo o filme, entendemos por que Elizabeth Gilbert "falou" a tantas mulheres de hoje. A prelúdio é a escolha racional que tantas (e tantos) fazem: faculdade, trabalho, casamento. Exatamente como seus pais fizeram. Mas, talvez, nossa "adolescência tardia" não nos permita fazer "a escolha certa"... a mesma que nossos pais, como menos idade, fizeram. Elizabeth, interpretada por Julia Roberts, está com mais de 30, tem um emprego, um marido, mora em Nova York, mas ― como diz a sinopse ― sente-se "devastada", e sozinha, passando noites no chão do banheiro frio. O primeiro, e óbvio, passo é se divorciar. O marido, que não passa pela crise, não aceita, e dificulta o caminho. O segundo passo é recomeçar a vida. E, para quem não consegue encarar a realidade, no curto prazo uma viagem pode ajudar... A parte da Itália, também conhecida como "comer", é aquela em que Elizabeth redescobre os prazeres gustativos, e o calor humano, reconstituindo um clima familiar que, na vida na grande metrópole, havia perdido. O prazer, contudo, não basta, e nem os amigos: é preciso encontrar um sentido na vida. E aí entra a parte "rezar", na Índia ― menos ligada com "reza", como dizemos aqui, e mais ligada com "iluminação", no sentido budista do termo. É interessante observar como desde os anos 60, pelo menos, a peregrinação de tantos ocidentais, rumo ao Oriente, tem servido como "antídoto" à sociedade afluente. Romper com a cadeia do materialismo, vivendo com pouco, ou muito pouco, devolve um senso de humanidade perdido, e de valores humanos essenciais. A terceira parte, "amar", em Bali, é a cereja do bolo. Depois do resgate do prazer físico, do sentido da vida, só faltava o reencontro com o outro: alguém com quem dividir essa nova jornada de prazeres, e de novos propósitos, numa nova vida. Surge Javier Bardem, o brasileiro Felipe, que Elizabeth Gilbert encontrou na "vida real"... Opa! "Como alguém pode ter tanta sorte assim na vida?", protestou Lori Leibovich, a crítica da Salon.com. (Será que ela estava se referindo a encontrar Javier Bardem ou a ser Julia Roberts?) Já Maureen Callahan, do New York Post, chamou Comer, Rezar, Amar de "narcicismo new age" ― talvez porque seja escrito em primeira pessoa, talvez porque três meses na Índia não sejam suficientes para levar alguém à iluminação... Por último, Katie Roiphe, da Slate, que, provavelmente, acertou mais que as outras duas: classificou a obra com "um grande livro de praia", "transcendental". E, de fato, Gilbert talvez não seja nenhuma grande intelectual, mas transmite honestidade no seu relato ― e a beleza plástica da adaptação para o cinema talvez nos convença de que podemos até ficar quebrando a cabeça com grandes questões filosóficas, mas encontrar (ou reencontrar) o amor, num cenário paradisíaco, ainda é uma grande pedida. Comer, Rezar, Amar, enfim, não era o best-seller insosso que parecia ser. Também não era a "nova bíblia" da mulher de 30 (quem embarcou nessa, continua a ver navios). Mas o filme tem o gosto de um "amor de verão" bem vivido. Ou, quiçá, redivivo ;-)
>>> Comer, Rezar, Amar
Não posso concordar: "Comer, rezar, amar" foi dos piores filmes que vi ultimamente: fraco, esticado artificialmente, parece terminar várias vezes e segue em frente, acumulando superficialidades. Javier Bardem está em seu pior papel tentando parecer brasileiro, Julia Roberts não tem estofo pra protagonista de um filme tão longo e tudo que seu personagem parece é uma dondóca fútil que tem dinheiro e parte em busca de Deus - ou melhor, de clichês romântico/filosóficos e cartões postais - pelo mundo. Uma enorme futilidade besta.