DIGESTIVOS
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Segunda-feira,
4/3/2002
A man in full
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 71 >>>
Tom Wolfe é um homem de seu tempo. É o que atesta a coletânea de ensaios “Ficar ou não ficar”, lançada pela editora Rocco em 2001. Mas o que significa essa sintonia com a própria época, no caso de um jornalista e escritor? Significa mergulhar no que o próprio Wolfe chama de “carnaval da vida americana hoje”, sentindo “a realidade, o pulso da fera humana”. É uma lição que, na verdade, deveria se alastrar por todos os meios “intelectuais” (Wolfe detesta o termo e a classe que ele designa), como uma chama libertadora. O autor de “A fogueira das vaidades” percebeu, antes de muita gente, que foi instalada uma muralha da China entre as classes “letradas” e as “iletradas” de seu país. Isso gera um impasse: os habitantes do “mundo literário” repudiam quem está de fora, sob o argumento de que essas pessoas “não lêem” (ou não mais o fazem como faziam antes); já os considerados (ou assumidos) “illettrés” ignoram solenemente os escrevinhadores de seu tempo (o agora), pois esses afastaram-se demais da realidade vivida no século XXI. Os primeiros praguejam contra os últimos, fechando-se cada vez mais em seus gabinetes, e em masturbatórias homenagens aos seus cânones; os últimos, como era de se esperar, voltam-se para o dito “entretenimento”, que atualmente se traduz por cinema, televisão e seus derivados. A tese de Tom Wolfe (pré-11 de setembro, deve-se assinalar) é a de que: ou os escribas entram de cabeça no universo de 270 milhões de americanos, ou estarão condenados a fossilizar-se ainda em vida. Por isso, aborda – ao contrário de seus pares – assuntos como internet, semicondutores e neurociência com uma intimidade e um entusiasmo absolutamente surpreendentes para um sujeito de quase 70 anos. Usando, como sempre, sua deliciante e irresistível prosa. “Ficar ou não ficar” é simplesmente imperdível para qualquer bípede implume, no presente estágio da chamada “evolução”. O primeiro ensaio, sobre o ano 2000, é antológico e merecia circular como aquelas mensagens apócrifas pela Web. (Pagar-se-ia um tributo extremamente pertinente à sua causa, que futuramente se provará vitoriosa.)
>>> Ficar ou não ficar - Tom Wolfe - 260 págs. - Ed. Rocco
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Julio Daio Borges
Editor
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