O Museu de Artes e Ofícios de Belo Horizonte deveria ser visitado por qualquer pessoa que viesse a esta capital. Fantástico. Mais uma "aprontação" da empresária Ângela Gutierrez, que vive dando presentes fabulosos para o estado e para o Brasil. E foi lá dentro que aconteceu mais uma edição do Ofício da Palavra, evento que, como é de se esperar, traz um escritor contemporâneo conhecido (se não consagrado, ao menos à beira da consagração) para falar com o público e com um mediador.
Ontem foi a vez de Milton Hatoum, mediado pela escritora Maria Esther Maciel. Duas horas ou pouco mais de exposição sobre temas como processo de criação, publicação, prêmios e outros assuntos de pauta imaginável. O clima era de seriedade. O público lotou um salão de tamanho razoável e o som competia com o barulho da água das fontes plantadas bem no meio da cidade. Ando meio preguiçosa dos eventos com escritores por alguns motivos, mas um deles é mencionável: o formato sempre igual. Isso tem sido muito previsível, mas admito que seja complicado inventar algo inovador. Fazer o quê? Afinal as pessoas comparecem para ouvir o escritor contar de onde vem o "dom" que lhe acomete.
Lá pelas tantas, depois que o debate foi aberto às questões do público, um rapaz perguntou ao Hatoum por que razões ele não menciona autores novos em suas colunas nos jornais. Hatoum tinha bons argumentos. O primeiro era plenamente imaginável. Caso ele comentasse um livro de um cara novo, seria uma avalanche de outros novatos querendo resenhas, menções, orelhas, contracapas e toda sorte de "toque de Midas". Não dá. O outro motivo era simples: Milton não quer entrar no que ele chamou de "guerrilha" por espaço. Nas palavras dele: "pessoas se auto-afirmando o tempo todo", "grupos que se formam, representantes de gerações, pessoas que querem se derrubar", "blogueiros terroristas". Nisso ele não entra. Com razão. É nojento. Qualquer festinha de escritores fica com esse clima de "competição beletrista". Dureza, né não? Ele é que está certo. Publicou "apenas" 3 livros e acertou na mosca. Pontaria, é isso. Tudo bem que ganhar prêmios não garante nada, mas, segundo ele, garante o pagamento das contas no final do mês. Certeiro. Muita gente que ganhou prêmio sumiu na areia. Muita gente que não ganhou (que sequer concorreu) foi ao estrelato. Vai saber. Mas Milton parece ter alcançado um equilíbrio. Ele mesmo disse: "tem escritor com 25 anos e 10 livros, o cara começou a publicar aos 12?". Hatoum, mui acertadamente, acha que é preciso maturar a obra. É isso aí. Ele se refere aos serial writers, nhaco.
E mais no final da noite, Hatoum saiu para jantar. Antes que ele se fosse, passei lá para cumprimentar o escritor amazonense. Ele me deu um livro que vamos doar para a biblioteca de uma excelente escola pública belo-horizontina. Yes. Quando eu falei meu nome, ele me disse assim: "ah, eu sei quem você é, da coluna do Digestivo Cultural". Yes.
Ana, Milton Hatoum pode ter lá suas razões para não citar novos escritores nas colunas dele, mas, diante da desculpa que deu ao Leandro Oliveira sobre não "promover" esses novos, fiquei a pensar, e em um instante me veio à mente o nome do escritor francês, Guy de Maupassant, que, em 10 anos, publicou 27 livros, e é um dos maiores escritores de literatura mundial. É... a fama tem dessas coisas! Infelizmente. Mas, ninguém é obrigado a nada, a fazer nada. Hoje, se te pedirem uma "orelha", é possível que a escrevas. Amanhã, para não a escreveres, poderás alegar uma série de desculpas, algumas muito esfarrapadas. Ana, um grande abraço. Continuo admirando teus textos.