Acompanhei mais ou menos de longe o Pan que acaba de passar pelo Rio de Janeiro. Acompanhei parte da abertura, a cobertura por diversos canais de TV e pela mídia escrita, as fofocas e denúncias enviadas pela internet e o deslumbre de jornalistas que se comportaram mais como torcedores do que como profissionais da notícia.
A conclusão que pude tirar de toda essa observação não foi nem um pouco original: o Brasil não é mesmo um país sério.
Antes que receba críticas e seja chamada de antipatriota, advirto que tive oportunidades sedutoras de viver fora do país, mas nem pestanejei em voltar para cá. É o lugar em que nasci e, apesar de ter vontade de dar uns tapas no traseiro de muita gente daqui, gosto dele. Gosto tanto que reconheço nossas falhas e me disponho a contribuir para a melhora da nossa sociedade.
É claro que morro de vergonha quando vejo uma torcida inteira vaiar os jogadores de Cuba e fazer pressão psicológica em atletas de outras delegações, levando as disputas de quadra para o lado pessoal. Mas o que me incomodou mesmo foi que em vários momentos do Pan, isso virou estratégia para a conquista da medalha. Ou seja, um nivelamento por baixo.
Não interessa o fato de a Jade ter se dado mal nas barras assimétricas, interessa que a concorrente seja pior, assim a brasileira ainda poderá garantir uma medalha. E, nesse ponto, a narração esportiva foi impiedosa e dramática. No momento em que a concorrente titubeou na saída, só se ouvia um empolgante "ela vai cair, ela vai cair! A Jade tem chances!"
Vergonhoso. Tão vergonhoso quanto essa disputa pelo segundo lugar no quadro de medalhas contra Cuba. Segundo lugar! Que nação é essa que se contenta com segundo lugar, meu Zeus?
Enquanto assistia aos jogos do Pan, não me saía da cabeça a imagem do Fradim, do Henfil, e o seu famoso "top top". É isso, somos uma nação top top, que se contenta com o segundo lugar, nem que para obtê-lo seja necessário recorrer a vudus e mandingas que tirem Cuba do nosso caminho.
O pior de tudo é achar que um segundo lugar está bom. Não está. Pergunte aos atletas que ficaram com bronze e prata. Só quem acha bom um segundo e terceiro lugar é quem não esperava sequer um quarto.
E depois de pagar caro para entrar nos ginásios e estádios, vaiar os atletas adversários e espalhar "top top's", a brilhante torcida brasileira ainda acredita que estamos credenciados para sediar as olimpíadas. A torcida e alguns ex-voluntários do Pan, os desertores que se indignaram com a alimentação oferecida e, como retaliação, puxavam o coro de vaias nos jogos. Quanta ilusão!
Antes mesmo do encerramento do Pan, a mídia empoleirou-se nos ombros do presidente do COI a fim de ouvir um elogio, algo como "foi maravilhoso, o melhor Pan de todos os tempos!" Não foi. E graças a Zeus, alguém nesse mundo é realista e corajoso o suficiente para dizer isso para uma nação de deslumbrados.
É impressionante como nos contentamos com pouco. Serviços bancários que nos fazem esperar uma eternidade, ensino público e privado de baixa qualidade, corrupção solta em todas as esferas políticas e sociais, e não reclamamos de nada. Quando temos que nos mexer o mínimo, já achamos que fizemos muito.
Não fizemos. É pouco e ainda falta muito. Além de instalações e obras para sediar qualquer evento, é preciso educar a população e isso leva tempo, investimento e mobilização social numa escala que nunca se viu no Brasil. Ou seja, no andar da carruagem, é bem provável que o sol se apague antes de sediarmos qualquer olimpíada aqui.
Pilar, compartilho com vc minha indignacao com relacao ao pior do Brasil: o brasileiro hehe... Vaias, desrespeito, máscaras, tomei ojeriza desse pan-americano. Nao me importo de ser chamada de anti-patriota, pq ser anti-patriota é expor ao mundo (mesmo com o descaso da imprensa americana aos jogos) um brasileiro q se orgulha de atrapalhar o adversario para beneficio proprio. Entao, quem quer vir competir em nosso pais? Onde venezuelanos, americanos e qualquer adversario é tratado desrespeitosamente??? Ai', depois vem "neguim" reclamar q é maltrado no exterior...
Isso fora outros questionamentos... ate postei agora um artigo (mal-feito by mylself) para um processo seletivo no Rio..seu texto me inspirou a posta-lo blog.
Pilar, voce nao é antipatriota. Voce só teve coragem de dizer a realidade. Nossas mazelas terceiro-mundistas nunca ficaram tão expostas. A decana e ultrapassada “Lei de Gérson” ganhou nova roupagem e se revigorou. Na novíssima “Lei de Oscar Schmidt”, o que vale é ganhar a todo custo. Viva o “jeitinho brasileiro”! Nosso ufanismo jeca só não foi maior porque aconteceu o desastre do Airbus da TAM, mas a falta de respeito e educação com os atletas estrangeiros beirou a obscenidade. Pelo menos o crime organizado no Rio deu uma trégua. Diante de toda aquela calmaria, havia espaço para os policiais militares darem a sua mordiscada e nossos gloriosos PMs foram formalmente acusados de extorquir dinheiro de dois turistas norte-americanos.
Isso sem falar do manual que foi entregue a todos os atletas da delegação americana, e advertia para os perigos das favelas, seqüestros-relâmpago e frisa que "a violência na cidade não tem hora e nem local para acontecer". A única falha do manual talvez tenha sido não alertá-los para os perigos que os policiais brasileiros representam. Como podemos reclamar? São realidades que insistimos em esconder, que fingimos ignorar, mas que não temos como negar. Se lançam um filme em que turistas vêm ao Brasil e são dopados, roubados e mutilados; se lançam manuais de sobrevivência às delegações; se policiais brasileiros representam tanto perigo quanto os bandidos, o que nos restou? Welcome to the Congo!