Quando se começa a ler O homem dentro de um cão (2007, Terceiro Nome, 157 págs.), de Fernando Portela, tem-se a impressão de que, até o fim, o livro apresentará contos engraçados mas com um humor que, curiosamente, parece pedir desculpas por entrar em cena, porque na verdade ele presta-se a mostrar a condição humana em seu lado mais desesperançoso. Essa impressão, passada por textos como "Duçuras", em que uma jovem de vinte e quatro anos encontra um senhor que é seu amante numa mesa de restaurante barato, é logo dissipada por contos com um humor mais escrachado, que são a maioria dos vinte e seis que compõem a obra.
Nesse campo, é difícil não constatar em "Gerência participativa - treinamento sênior", ou em "Tímidos conceitos sobre eugenia", o gênio de Fernando, que parece escrever com uma facilidade incrível. "Maldita terra estrangeira", outro conto que é pura diversão, começa assim: "Não acredito em terapia. Já fiz umas quatro vezes. E olha como estou, cada vez mais pirado. Pelo menos é isso o que os terapeutas dizem. Comecei com o tal do psicodrama, nos anos setenta, eu ainda era muito menino. Vinte e poucos anos, queria comer o mundo, e o comia, em parte." Num tempo em que nomes de peso da literatura nacional lançam livros de conto insossos (veja o caso de Ela e outras mulheres, de Rubem Fonseca), O homem dentro de um cão acaba sendo uma das melhores pedidas.
É muito importante que se façam cometários sobre bons livros, como é o caso do "O homem dentro de um cão" e que se digam que também se publicam coisas ruins, pois vejo livros na bancas apenas por serem de escritores famosos, mas que na verdade não deveriam estar nas mãos de ningúem. Tem muita gente nova com bons textos e que não conseguem editoras por não ter ainda nome na praça. Cultura é cultura, e curtura não é nada. Abraços.