O escritor é uma pessoa que passa anos tentando descobrir com paciência um segundo ser dentro de si, e o mundo que o faz ser quem é: quando falo de escrever, o que primeiro me vem à mente não é um romance, um poema ou a tradição literária, mas uma pessoa que fecha a porta, senta-se diante da mesa e, sozinha, volta-se para dentro; cercada pelas suas sombras, constrói um mundo novo com as palavras. Esse homem — ou essa mulher — pode usar uma máquina de escrever, aproveitar as facilidades de um computador ou escrever com caneta no papel, como venho fazendo há trinta anos. Enquanto escreve, pode tomar chá ou café, ou fumar. De vez em quando, pode se levantar e olhar pela janela as crianças que brincam na rua e, se tiver sorte, contemplar algumas árvores e uma bela vista, ou apenas topar com uma parede escura. Pode escrever poemas, peças de teatro ou romances, como eu. Mas todas essas particularidades só vêm depois da decisão crucial de sentar-se diante da mesa e, pacientemente, voltar-se para dentro. Escrever é transformar em palavras esse olhar para dentro, estudar o mundo para o qual a pessoa se transporta quando se recolhe em si mesma — com paciência, obstinação e alegria. Enquanto passo os dias, os meses, os anos sentado à minha mesa, acrescentando pouco a pouco novas palavras à página em branco, sinto-me como se criasse um mundo novo, como se trouxesse à vida aquela outra pessoa que existe dentro de mim, da mesma forma como alguém poderia construir uma ponte ou uma ábóboda, pedra por pedra. As pedras que usamos, nós os escritores, são as palavras. Quando as colhemos com as mãos — tentando intuir a maneira como cada uma se conecta às outras, contemplando-as às vezes de longe, às vezes quase chegando a acariciá-las com os dedos e a ponta da caneta, sopesando-as, virando-as de um lado e de outro, ano após ano, sempre com paciência e esperança —, criamos novos mundos.
Concordo com sua opinião sobre os tropeços para driblar a solidão, que é companheira de quem escreve. Um cafezinho, um chá ou um cigarro para quem fuma, pode ser uma fuga passageira de suas idéias pertinentes. Um descanso, talvez. Cada ser humano é uma fonte de histórias, e o escritor tem a vantagem ou desvantagem de criar ou desvendar enigmas da vida.
Generosa citação do livro de Orhan Pamuk: taí um escritor que quero muito conhecer melhor. Um abraço da amiga que anda sempre por aqui pescando o que há de melhor ;-))