Há muita coisa em jogo na hora de escolher o que a gente vai ler, qual o próximo livro. Com rotina de estudos, trabalho, família e atividades físicas, nas quais incluo as necessárias (as da cama e as da mesa), sobra pouco tempo para leitura. E mesmo que houvesse todo o tempo do mundo disponível, ainda não seria suficiente. É o grande problema de todos nós, bibliófilos.
Nunca há tempo suficiente, por mais que a gente administre o relógio do cotidiano. Por isso que na hora de puxar um volume da estante a apreensão de leitor ataca e a gente fica em dúvida entre um livro e outro, ou entre vários. Quem gosta de contos talvez não sofra desse mal, porque, ao primeiro sinal de apreensão, o leitor puxará um Borges da estante e em dois minutos seu organismo receberá uma dose apaziguadora da mais alta literatura. Mas quem se interessa por relacionamentos de longa duração encara dúvidas. "A quem dedicarei atenção, no meu escasso tempo de leitura entre afazeres, Julian Sorel ou Anna Karenina?" Dúvida cruel.
Um componente que adiciona mais ansiedade ao processo, e aqui falo pessoalmente, é a preocupação em ter um repertório sólido de leituras, livros formadores e importantes para literatura ocidental. Veja. Eu tenho orgulho de ter lido Robert Ludlum, mas, neste exato minuto, entre Ludlum e Below, a gente escolhe quem?
Por outro lado, é inválido, e feio, querer engessar a leitura pelos moldes do cânone. Não dá. Há vários canônicos chatos. Não tenho receio de dizer que deixei de lado os Cantos do Pound lá pela longínqua vigésima página. Prazer em ler é fundamental. Quando o prazer pela leitura entra em guerra contra a preocupação formadora do parágrafo anterior, dane-se a formação. (Isso não ocorre no território acadêmico, bem sabemos. A gente precisa ler cada coisa...) Sorte que, curiosamente, não é tão comum esse conflito.
A insatisfação com a quantidade de leitura é perene, é bom não se preocupar demais e aceitar esta fatalidade. A gente quer ler Balzac completo, Dickens completo, Mann completo. A gente tem a vida toda pela frente e a gente vai lendo, selecionando o que parece apetitoso, sendo ou não um Hugo da vida. No fim, o que importa é a qualidade.
A "fatalidade" alivia o fardo de não consumir um livro até a última folha. Há que se ter prazer! Os infortúnios... vamos deixar para outros livros. Sim, é difícil puxar um livro da prateleira... Irmãos Grimm ou Maurice Druon? Acho que vou vendar os olhos e escolher pelo tato. Bacana o texto, Guilherme.