Conheço o iMasters há algum tempo. É da idade do Digestivo? É mais velho que o Digestivo? Não sei dizer. Mas fiquei contente de receber o convite para assistir ao InterCon 2009. Cheguei no horário, "sem ter feito a lição de casa", como brincou o René de Paula Jr. (que encontrei logo na entrada). A piada interna queria dizer que estávamos descobrindo "na hora" o que ia, realmente, acontecer. O Ambiente Tecnologia me pareceu muito específico, com ferramentas que eu talvez nunca vá usar, logo, não assisti a nenhuma palestra dessa área. O Ambiente Criação e Inovação me chamou a atenção, mas só na parte da tarde, portanto, passei a manhã no Ambiente Business, que era, efetivamente, o que me interessava.
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Logo na abertura, o Gil Giardelli, curador, me provocou aquela sensação: "Conheço ele de algum lugar..." Claro! Era um dos participantes do NewsCamp do ano passado: "Meu primeiro Camp". (Lembram?) Tudo bem que ele estava mais tímido, em abril de 2008, e que agora estava mais "produzido", comandando o show ― mas era o mesmo cara. No meio da plateia do Teatro do Renaissance, me bateu igualmente aquela sensação de "veterano" (olhando os "calouros"): fora o Gil, que estava no palco, eu não conhecia nenhuma outra pessoa. Se mal conheço os principais blogueiros, como vou conhecer os principais "tuiteiros"? (Nem sempre são os mesmos nomes...) Para completar ― com a febre dos smartphones ―, o grosso da audiência estava literalmente com a cara no celular: tuitando, "feicibucando", checando e-mails ― não podiam perder nada: no palco do Renaissance e no palco da internet.
Da apresentação meio corrida do Gil, pesquei a palavra "inventivos", associada ao Pedro Markun, também a palavra "genialidade", associada ao Manoel Lemos, e uma frase que me pareceu boa, mas não sei se é dele (Gil): "Não use velhos mapas para descobrir novas terras". (Alguma referência ao mainstream media?) Achei engraçado porque o Pedro era um sujeito que participou do primeiro Palavra na Tela, e que ficou berrando, lá do fundo (da plateia), suas intervenções. Pensei na época: "Quem é esse cara? Por que se intromete com tanta veemência?" E o Manoel Lemos era o sujeito que fez uma bela careta quando falei, no evento da revista Bites (em junho do ano passado), que o Buscapé usava tabelas diferentes de remuneração (para diferentes sites). Ou seja: conheço eles, sei do que são feitos, conheço o Gil também, portanto confesso que achei os "adjetivos" (acima) um pouco exagerados... (C'mon, não fomos nós que inventamos o Twitter, nem o Blogger, nem a Wikipedia...)
A primeira palestra foi do Sérgio Amadeu, da Cásper Líbero, que eu poderia ter encontrado quando estive lá, neste ano, mas infelizmente não encontrei. Seu tema, no InterCon, era "Além das Redes de Comunicação" (um título não muito promissor). Começou falando de Linux, Apache, "top-down versus bottom-up", Benkler... até aí, nenhuma grande novidade. Foi melhorando quando retomou o significado do verbo to hack: cortar madeira com precisão. Para disparar que "os hackers estão no cerne da construção da internet". Foi acelerando o ritmo, e quando eu pensava que ia me perder no raciocínio dele, o pessoal mostrava que estava acompanhando de perto. Evocou o Grateful Dead, a oposição entre "ter propriedade(s)" e "ter relacionamento(s)" ("algo que é muito bonito, mas, na prática, o Google não concorda 100%...", anotei). Depois observou que software é muito mais difícil de manter do que de fazer (lembrei das mudanças no Digestivo, que estou implementando há meses...). Para encerrar com uma boa conclusão (a meu ver): "O que vale na rede é a cultura da liberade: para fazer algo, eu não tenho de pedir autorização".
Depois da utopia, veio o outro lado do Muro de Berlim. Marcelo Coutinho, ex-executivo e atual consultor do Ibope, com "Sociedade Digital". Eu não sabia naquela altura, mas todo mundo meio que recontaria, ao longo do dia, a história da internet. A do Coutinho foi a mais bem estruturada. Ele desenterrou, por exemplo, a declaração de Bill Gates, sobre os investimentos de James Clark na Netscape (em meados da década de 90): "São uma bobagem, porque nenhuma empresa sobrevive dando coisas de graça. E ninguém vai usar essa tal de internet, que é um negócio para acadêmicos..." (Vai ver que, neste momento, alguém na Microsoft teve a feliz ideia de aposentar Bill Gates.) Coutinho sacou, também, uma boa expressão da cartola: socialcast, para se opor ao velho broadcast (da velha mídia). Revelou, ainda, que a principal preocupação de grandes executivos de comunicação, hoje, é a "perda do poder para o usuário" (leia-se: user-generated content). Questionou a fatia ínfima da internet no bolo publicitário brasileiro, de aproximadamente 4%, apesar de o Brasil ser uma das maiores audiências mundiais da Grande Rede. E opôs a sociedade industrial (controlada, hierarquizada, burocrática... alguém conhece?) à sociedade do conhecimento (a da internet). Mostrou, ainda, que o "mundo do bazar" (da 25 de Março?) não é, necessariamente, um caos. (The Cathedral and the Bazaar seria, igualmente, uma das referências mais citadas no Renaissance.)
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Se a manhã começou mais "sonhadora", com o Amadeu, e foi pousando na realidade, com o Coutinho, a palestra do Carlos Nepomuceno, por sua vez, caiu como uma bomba sobre as pretensões dos irternautas brasileiros de "mudar o mundo". Ele abriu endossando o Coutinho: com 7 bilhões de pessoas no planeta, seria impossível manter o mesmo ambiente "comunicacional" (anterior à sociedade do conhecimento). Ou seja: hierarquia, controle, burocracia não funcionavam mais com bilhões de pessoas, que explodiriam ― como numa panela de pressão comunicacional ― quando surgisse a internet... Mas Nepomuceno tirou sarro do Twitter, dizendo que quem, efetivamente, inventou o microblog foi Jesus, com seus 12 seguidores, depois outros seguidores desses 12, e assim por diante... (A plateia caiu na gargalhada.) Apontou, sabiamente, que a nossa sociedade, hoje, se divide entre "tecno-otimistas" e "tecnofóbicos". E foi filosófico ao citar um francês desses aí: "Quanto mais conectados estamos, menos nos comunicamos". E para cunhar uma máxima própria: "Não tem como entender a internet sem uma visão histórica". Anotei outras boas: "Nossa sociedade foi toda ela estruturada no orkut de papel"; "Agora, só vale a turma que eu tenho no meu bolso? (No meu celular)?". Resumindo: para Carlos Nepomuceno ― como para tantos outros ―, a natureza humana não muda (apesar de toda a tecnologia).
Depois da saída de Amadeu, Coutinho e Nepomuceno, o nível, durante a manhã, não se manteria mais o mesmo. Suzana Apelbaum (a "palestrante a confirmar") entrou pilhadíssima, falando sobre "mundo trans" e evocando termos interessantes, mas que não devem ser de sua autoria, como "mr. nobody" e "über repercussão". Também outras sacadas (que talvez sejam suas, mas nada de mais): "Cliente não passa briefing, cliente desabafa". (Enfim, eu não tenho muita paciência para publicitários falando sobre internet.) Mesmo o Michel Lent, que em geral é bastante inspirado, repetiu alguns clichês como: "poucos veículos para muita gente", "múltiplas plataformas e múltiplos formatos". E trocou a oposição "muita informação versus pouca atenção" pela oposição "muito conteúdo versus pouco tempo". Melhorou quando falou de idle time (o tempo ocioso que os nossos celulares, atualmente, preenchem), resumindo tudo com: "O valor, hoje, está em oferecer algo que justifique um pedaço de tempo do consumidor/cliente". A Márcia Matos, embora do Sebrae, provocou sono e evasão da sala, com seus slides do começo do século. E o Hernani Dimantas já foi mais inovador ― até me xingou um dia no Marketing Hacker (!) ―, mas acabou se tornando ".gov", e me pareceu meio acomodado (sem a mesma esperança de antes)... Perdi o Gil (na verdade, nem sei se ele falou o que estava programado) e perdi o Cazé (porque já o havia visto, sobre o Gengibre, na Campus Party...).
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Dessa manhã, concluí que já fui tão sonhador quanto o Amadeu, e que, portanto, não o condeno. Apenas acho que estamos construindo empresas agora sobre a plataforma do Google, assim como construimos antes sobre a plataforma da Microsoft. Ou seja: são grandes empresas, que querem dominar o mundo ― então qual é, no fim das contas, a grande novidade e a grande "revolução"? Dependemos ainda delas, ou não? Concordei mais com o Coutinho, porque ― pelo que entendi da mensagem dele ― alguém tem de fazer a "ponte" entre a internet e o mundo off-line. No Brasil, esse foi o fator de sucesso de empresas como Buscapé, que cadastrava pequenos comerciantes, MercadoLivre, que cadastrou pequenos vendedores (e compradores), e, mais recentemente, a Estante Virtual, que conecta livreiros e leitores (e que começou com velhos sebos cheios de mofo). O Nepomuceno funcionou como um balde de água fria sobre a Web brasileira, mas não concordo 100% com ele. A internet não muda o mundo tanto quanto o Amadeu gostaria, mas, ainda assim, muda o mundo, se juntarmos o pragmatismo do Coutinho (otimista na ação) com ceticismo do Nepomuceno (pessimista na avaliação).
Gostei do post, principalmente das considerações finais, quando se refere aos fatores de modificação da sociedade através da internet... Talvez, nos próximos dez anos, a internet mude uma parcela mais abandonada da sociedade: é nisto que prefiro crer. (Não sei se pra melhor ou pra pior...)