Cartaz do evento, clique na imagem para ampliar (não tem o meu nome; pois confirmei só na véspera)
* Por coincidência, quando estava cobrindo o Festival de Curitiba, recebi um e-mail da Mariana Sanchez, me convidando para uma edição do "Autores & Ideias", do Sesc Paraná. Primeiro, seria em agosto; depois, no início de junho. Finalmente, foi nas duas últimas semanas de junho. E meu colega de mesa foi o "Cardoso" — André Czarnobai —, do saudoso CardosOnline. Percorremos, na penúltima semana de junho, os SESCs de Curitiba (22), Londrina (23) e Maringá (24). E percorremos, na última semana de junho, os SESCs de Cascavel (29) e Pato Branco (30).
* Antes de começar, eu gostaria de elogiar o profissionalismo do Sesc Paraná, ao cobrir absolutamente todas as despesas, desde transporte e hospedagem até refeições e translados, sem contar o pagamento de um cachê acima de média (para esse tipo de evento). E gostaria de elogiar, também, os profissionais do Sesc-PR, que foram excepcionalmente atenciosos, nos recebendo, nos transportando, até nos levando para almoçar e jantar, como amigos de longa data, irrepreensíveis em todas as cidades.
* Também gostaria de comentar que me senti muito lisonjeado em participar de um evento como "autor". Coloco entre aspas, porque, na internet, somos "de tudo um pouco". Principalmente, nós, pais de iniciativas como o Digestivo e o CardosOnline. São tantas coisas para se cuidar, desde a edição de textos até a parte técnica do site, passando pelo contato com leitores e, no meu caso, pela parte comercial — que a gente até se esquece de que é, igualmente, autor; afinal, escreve. E, no fim de contas, é por isso que começou. (Eu comecei porque não tinha onde publicar — já contei diversas vezes.) Logo, ser chamado de autor é uma honra e um reconhecimento por um objetivo que às vezes parece ter ficado para trás.
A primeira edição do Autores & Ideias (com Daniel Galera e Daniel Pellizzari)
* Por último, foi uma honra também suceder o Daniel Galera e o Daniel Pellizzari, que realizaram a primeira edição do Autores & Ideias, em maio deste ano. E foi divertido saber que, depois de mim e do Cardoso, o Autores & Ideias prossegue, neste segundo semestre, com Fabrício Carpinejar e Marcelino Freire. Todo mundo que me lê, sabe da minha admiração pelo Galera — sendo ele, junto com o Michel Laub, dois dos meus prosadores preferidos nessa geração. Conversando com o Cardoso, aliás, percebi uma afinidade maior com os autores do Sul — como inconscientemente já manifestei, a respeito da poesia inicial do próprio Carpinejar, dos contos da Cíntia Moscovich e da crítica literária do Polzonoff.
* Inclusive, perguntei, para o Cardoso, se as pessoas, do Sul, liam mais (como já me falaram). Ele disse que não, que talvez comprem mais livros — mas livros que não leem, do mesmo jeito (como no resto do Brasil). A propósito, não conhecia o Cardoso pessoalmente, só de ler e por e-mail. A lenda do CardosOnline surgiu, para mim, numa das primeiras entrevistas do Digestivo — quando me perguntaram se o site era inspirado no e-zine mais famoso do Brasil. Não fui um leitor do CardosOnline, enquanto ele durou, mas li, indiretamente, nos livros do Galera e do próprio Cardoso. Dentes Guardados, que eu considero um dos melhores livros do anos 00, saiu inteiro do CardosOnline. É uma prova — de 2001 (!) — de que a internet pode ser literatura (embora essa discussão tenha persistindo durante anos).
O Cardoso, na época em que nos encontramos
Curitiba, 22/6, terça-feira — Uma das minhas primeiras conversas com o Cardoso, como não poderia deixar de ser, foi sobre a Livros do Mal, a editora mais importante a surgir na internet, por iniciativa do Galera e do Pellizzari. Foi numa cantina, à qual o Sidail de Oliveira, do Sesc da Esquina, nos levou para almoçar (assim que chegamos em Curitiba). O Cardoso contou que um sujeito, em Porto Alegre, tinha montado uma editora "sob demanda", e descobriu o filão dos que publicavam na internet (republicando-os em livro). Chamou a turma do CardosOnline, mas, quando Galera e Pellizzari deram uma olhada na "operação", concluíram que era mais interessante fazer por conta própria (típica conclusão de empreendedor) — e lançaram a Livros do Mal.
* Mais adiante (anos depois), concluíram que gastavam mais tempo, e energia, na administração da editora do que escrevendo seus próprios livros (a razão pela qual eles haviam começado). O Cardoso exemplificou, dizendo que enviar os títulos da Livros do Mal, para determinadas localidades, custava às vezes mais caro do que o próprio volume. Ou seja, o frete não compensava nem disponibilizar (quanto mais vender) em alguns estados. Junta-se a isso, também, o fato de o Daniel Galera ter sido convidado para publicar na Companhia das Letras, durante a segunda Flip — deixando a Livros do Mal em stand-by desde então.
* Nossa primeira mesa, pelo Autores & Ideias, foi na mesma noite daquele primeiro dia, no referido Sesc da Esquina. E o Luís Henrique Pellanda, subeditor do Rascunho, foi nosso mediador. (Mais uma vez, surge minha admiração pela cena literária do Sul — agora pela figura do Rogério Pereira, criador do Rascunho). Eu imaginava o Pellanda mais "jovenzinho", assim como o nosso Rafael Rodrigues aqui (Editor-assistente do Digestivo). É um homem feito — não que o Rafa não o seja ;-) —, e realizou uma mediação corretíssima. Exigiu, de nós, mais do que qualquer outro mediador — pois convive com nossos trabalhos (e havia pesquisado, ainda mais, para aquele encontro).
* Confesso que me surpreendeu, por exemplo, o Pellanda nos perguntando quanto achávamos que iam durar os jornais impressos. O que, aliás, foi um tema nas outras cidades também. Enquanto aqui, em São Paulo, jornalistas e profissionais ligados à mídia impressa negam as evidências até a morte, no Sul me espantou que essa ideia já tenha sido assimilada. Ou seja: ao contrário dos profissionais do Estadão e da Folha, no Sul a "morte" já é uma questão fechada — a única discussão é sobre "quando" ela ocorrerá.
* Também confesso que estava mais nervoso na estreia e que talvez tenha soado mais formal e prolixo do que gostaria (tirem suas próprias conclusões). Geralmente, as perguntas da plateia costumam quebrar esse gelo. E, justamente, havia um senhor, muito lépido, que tomou várias iniciativas nessa direção. Depois, no final, veio nos dizer que a internet era como uma "vaca mágica": "Você tira dela o leite que quiser" (referia-se aos tempos da censura, os quais viveu — contrapondo ao presente, quando tudo está acessível... no mundo inteiro, em várias línguas etc.).
* Do Sesc da Esquina, seguimos, por sugestão da Mariana Sanchez, para o Beto Batata, com mais gente do Sesc, o Sidail e a Deborah Belotti. Praticamente invadimos a festa de aniversário de um amigo do marido da Mariana e nos fartamos com as famosas batatas que levam o conceito da rede Baked Potato ao extremo. Falamos sobre jazz, cinema, e o Cardoso dividiu um pouco da sua experiência como roteirista. Evocamos, para variar, a lembrança do Galera e do "Mojo" (Daniel Pellizzari); e Cardoso nos contou duas anedotas sobre os encontros do Galera com o Chico Buarque (que sempre o convidava para jogar futebol, sendo que ele, Daniel, não joga). A Deborah nos deu uma carona salvadora de volta.
Londrina, 23/6, quarta-feira — No dia seguinte, embarcamos para nossa segunda cidade. E, no aeroporto, nos esperavam as simpatissíssimas Rita Ribas e Yuka Toyama Borges. Montaram, simples e apenasmente, a agenda mais completa que encontramos na nossa turnê pelo Paraná. Mal chegamos e já descobrimos que havíamos saído, ao mesmo tempo, na Folha de Londrina e no Jornal de Londrina. Na Folha foi interessante porque estampamos a capa do caderno de cultura (tudo bem que com as legendas, das nossas fotos, trocadas). E eu disse "interessante" também porque, que eu me lembre, isso nunca aconteceu em nenhum outro lugar — e, muito menos, nas nossas próprias cidades (o que fez um de nós evocar aquele ditado: "Santo de casa não faz milagre").
A piscina do Harbor Self de Londrina
* Almoçamos no Villa Fontana, que me lembrou a rede Ráscal (ainda que eu e o Cardoso tenhamos trocado o bufê por comida japonesa). Londrina — que eu não conhecia — me lembrou Ribeirão Preto, uma cidade aparentemente próspera, crescendo e com uma porção de empreendimentos. Nosso hotel, aliás, era num local privilegiado, próximo ao lago Igapó (que prometemos percorrer a pé, mas que no dia seguinte... não tivemos forças). Como o Wi-Fi pegava melhor fora do quarto (do que dentro), tentei aproveitar, no tempo livre, as áreas externas do Harbor Self enquanto trabalhava on-line.
* Do almoço e de uma conversa animada sobre família com a Rita e a Yuka, seguimos non-stop para a UEL (Universidade Estadual de Londrina), que, por sua vez, me lembrou, bastante, a USP: com um campus amplo, muito verde, muitos espaços e um certa tranquilidade que nunca mais encontramos no mundo profissional. Demos uma volta de carro, enquanto o Cardoso revelava que seus melhores amigos são do tempo da faculdade (o que não sei se é o meu caso). E a Yuka me mostrou, destacadamente, o CECA (Centro de Educação, Comunicação e Artes), onde leciona um dos mais longevos Colunistas do Digestivo, o Jardel ;-)
* Na rádio UEL, nos esperavam para a gravação de três (!) entrevistas. A primeira foi, praticamente, uma breve participação no Boletim Cultural, do igualmente simpático Rogério Cavalcante. Como não tenho prática de falar em rádio, ainda mais quando o tempo é curto, fiquei com a sensação de que o Cardoso, que produz boletins para a Oi FM, me deu um banho. De certa forma, compensei na gravação do Trem das Onze, do Jersey Gogel — na realidade, uma longa entrevista sobre o Digestivo Cultural. O que mais me chamou a atenção, depois que terminamos, foi o comentário do mesmo Jersey: "Pensei que você fosse filho de algum 'grande nome' da imprensa". Concedemos, finalmente, nossa última entrevista para uma apresentadora da TV UEL. Deve ter sido pensando nela que o Daniel Galera respondeu quando lhe perguntaram se preferia "ler ou escrever": "Mulher gostosa!".
* O Sesc de Londrina me lembrou o da Vila Mariana. Numa espécie de camarim, nos esperava o mediador, Cláudio Osti. Fomos fotografados enquanto conversávamos sobre política (um dos muitos interesses de Osti). Quando nos dirigimos ao local do debate, me senti um superstar, com a nossa maior plateia, cheia de estudantes, de educadores e com um poderoso microfone. Osti, como mediador, foi o mais solene de todos, embora soubesse buscar a intimidade da audiência, sempre que necessário. Notei ainda que, em Londrina, voltavam as questões sobre internet e educação — e descobri que talvez estivéssemos falando, em excesso, sobre cultura e mídia. Era, também, a época do Cala Boca Galvão e fomos aprendendo a usar esse "gancho" nas outras cidades, principalmente quando a plateia era de entusiastas do Twitter.
* Encerramos a noite, eu e o Cardoso, no restaurante do hotel, conversando longamente a respeito das similaridades entre o Digestivo e o CardosOnline. Descobrimos novas coincidências — como o inesgotável tema dos colaboradores. Também a solidão, ocasional, do editor. E as infinitas razões para continuar ou descontinuar uma publicação. O CardosOnline parou de circular — para usar uma expressão da moda — em 2001, mas não foram poucas vezes, durante a viagem, que perguntaram, ao Cardoso, como colaborar no e-zine. A internet não é tão efêmera quanto parece; e esse seu aspecto de "eternidade" pode soar, inclusive, assustador.
Maringá, 24/6, quinta-feira — Como a distância, para a terceira cidade, era mais reduzida, trocamos o avião pelo ônibus. O Cardoso me ajudou com a mala, porque eu — como Pascal naquela carta — não havia tido tempo de fazer uma menor (quando saí de São Paulo). Já em Maringá, pegamos, nós mesmos, um táxi, porque havia outro evento concorrido no mesmo dia, e desembarcamos no hotel Elo. De lá, telefonamos para a Laíde Cecilia de Sousa, nossa anfitriã em Maringá, notificando que desembarcáramos sãos e salvos e que iríamos tomar nosso desjejum nas proximidades.
* Mais uma cidade arborizada e alegre. E a padaria, perto do hotel, nos fez cair o queixo — muito sofisticada. Não imaginávamos. Os sanduíches, quando chegaram, estavam maravilhosos. Na caminhada de volta, prometemos, mais uma vez, fazer um turismozinho. Em Maringá, isso significava subir a famosa escadaria de sua catedral. Na família do Cardoso — de Porto Alegre —, ninguém havia logrado tal feito. E como já estávamos meio cansados (encerrado a primeira etapa da nossa turnê), não seria ele o primeiro ;-)
* Quem nos falou desse e de outros marcos da cidade, quando já esperávamos na antessala do Sesc Maringá, foi o Joel Cardoso (coincidência de sobrenomes não planejada) — jornalista que nos presenteou com um exemplar de seu Epítome. Marcelo Bulgarelli, nosso mediador, foi quem nos avistou logo na entrada. Com a Laíde, então, a empatia foi mútua, a ponto de ela nos querer, em Maringá, durante outros eventos que não apenas o Autores & Ideias.
* A mesa, em si, foi uma das mais descontraídas e, na minha opinião, uma das mais fluídas. Tivemos a apresentação grandiloquente do Joel, que nos elevou às alturas, com direito à doação de novos exemplares de Epítome, e até entrada, triunfal, com ele anunciando nossos nomes por extenso (escandindo cada sílaba). A descontração, claro, ficou por nossa conta, a fim de quebrar, necessariamente, o gelo (depois de tantas glórias...). Meio sem planejamento, tentei não vir com um discurso pronto — procurando extrair, da plateia, o que ela realmente gostaria de saber. Às vezes o papo sobre internet, sobre tecnologia, tende a ficar meio esotérico — e eu fico pensando o que as pessoas, que foram nos ouvir, levarão de proveitoso. (A Laíde — que solicitou avaliações dos participantes — me revelou, no encerramento, que a estratégia havia funcionado.)
Eu, desprevenido, em click do Cardoso
* Eu e Cardoso jantamos pizza, nas cercanias do hotel, e conversamos, mais uma vez longamente, sobre empreendimentos colaborativos. Naquela noite, Cardoso me contou da sua participação no Overmundo. Falamos, ainda, sobre relacionamentos — e descobrimos que havíamos nos tornado, efetivamente, amigos. Como, talvez, já éramos, por afinidade (via internet). Anotei que, quando nos encontrávamos, o assunto parecia inesgotável — como, na adolescência, ao discutir por horas a fio, com amigos... sobre música, meninas, sonhos, enfim ;-)
Observamos que há muita coisa acontecendo fora do eixo X ou Y, isto mostra que estamos num país plural, as coisas acontecem, temos que respeitar as regionalidades afinal elas são universais.