Moscou é exótica e distante - mas não impressiona apenas por causa disso. Bangkok, por exemplo, é ainda mais longe e diferente, mas - o que acontece? - não tem o mesmo magnetismo. A sensação que tenho é de que o mundo é fascinado por Moscou. É que a capital russa concentra características inimitáveis, culturais e geográficas: está isolada no meio do mundo e foi - é - o centro político de um império curioso. Moscou é uma cidade misteriosa.
Quem construiu tudo aquilo? Ande hoje pela cidade: e - por mais que você conheça, de cabo a rabo, a história daquele povo - fica difícil acreditar. Todas as construções são monstruosas: as bibliotecas, as pontes, as igrejas, a universidade, o Kremlin. Ninguém, agora, parece estar trabalhando - e quando trabalha é com uma ineficiência irritante. Moscou está triste e cansada. A cidade um dia - há poucas décadas - foi o centro do mundo: mesmo que não tenha sido sozinha. Quantas cenas de filmes de sucesso e livros de suspense se passaram, digamos, no Gorky Park?
Os melhores detetives se encontraram, discretamente, sob suas árvores, e trocaram informações que podiam destruir ou salvar o mundo. Muita gente, de Seattle a Curitiba, assistiu, numa noite de inverno, James Bond subindo numa das mais altas rodas gigantes do mundo, no Gorky Park. Aquele foi um lugar importante e inatingível. O que aconteceu? O parque hoje está infestado de policiais desconfiados de terroristas. A roda gigante está caindo aos pedaços - apesar de a vista, lá de cima, ainda ser especial, com o Rio Moscou e a Universidade no fundo.
Moscou é, para os estrangeiros, uma cidade elegante e cosmopolita. Esse espírito permanece, mas é pontual - como em São Paulo. Poucos estrangeiros visitam a cidade, e seus habitantes, em geral, ainda vivem nas margens do Ocidente. Em Moscou, porém, há algo de inexplicável - de silencioso - no ar: e isso cria um clima, em certo sentido, encantador. A impressão, de fora do Kremlin, é que estão bolando, dentro de muros tão altos, novas estratégias para dominar o mundo, enquanto esquecemos deles. Se conseguirão? Deveriam antes lubrificar as engrenagens de sua roda gigante.
Música de criança
Saiu - há um, dois anos - um dos CDs mais agradáveis que conheço: a gravação, de Caio Pagano, das adaptações para o piano de Vila Lobos fez de cantigas brasileiras. Estão lá tesouros que, em uma geração, sumiram do repertório popular brasileiro, para nunca mais voltar - a não ser em iniciativas como esta: "Ciranda, cirandinha", "O Cravo", etc. Pagano precisou gravar o CD na Alemanha e, até onde sei, ainda não conseguiu distribuidora no Brasil. (Onde estão nossos - como dizem? - "mecenas"?) Comprei minha cópia por telefone, na revista Concerto, depois de me encantar, por 30 segundos, na Rádio Cultura, com a abertura de "Samba Lelê", que há pelo menos quinze anos não ouvia. É a minha música preferida. Entrei em outra dimensão.
Conversação
Outro livro fantástico de Theodore Zeldin - autor de Uma História Íntima da Humanidade - é Conversação, que tem o dispensável subtítulo: Como um bom papo pode mudar a sua vida. O volume, pequeno e curto, tem o formato e, por dentro, o tom de auto-ajuda. Algumas passagens podem até confundir o leitor: "O fundamental é coragem", "A especialização precisa ser contrabalançada por seu oposto", "Mas vale a pena tentar falar com pessoas que, aparentemente, nada têm em comum conosco", etc. É preciso um pouco de compreensão: o livro é resultado de uma seqüência de palestras de Zeldin para a rádio BBC. Nem todas as frases, portanto, podem ser diferentes, inesperadas.
O que importa é que, no balanço, Zeldin oferece ao leitor, mais uma vez, uma perspectiva otimista do mundo - sem esbarrar na burrice, o que parece uma tarefa impossível. Conversação funciona, de um lado, como um manual para conversas educadas e estimulantes; mas o livro funciona também, e acima de tudo, como um vermífugo para cacoetes e vícios que, sem perceber, cultivamos durante encontros. Zeldin nos ajuda a rever esses nossos defeitos e, de quebra, compreender ou, pelo menos, saber onde estão os dos outros. A comunicação, escrita ou falada, vale muito pelo que contém mas, de vez em quando, seus buracos podem distorcer idéias e provocar desentendimentos. Como tapar esses buracos?
Zeldin já começa bem, lembrando, na primeira frase do livro, um anúncio da British Telecom, que - para estimular bate-papos no telefone - dizia o seguinte: "Conversar é bom"; Zeldin corrige: "Mas é claro que isso é apenas uma meia verdade".
Salve Eduardo, conte-nos mais sobre Moscou. Parece-me fascinante todo aquele gelo e a paisagem cinzenta. E a vodca de lá, faz frente à vodca polonesa? Espero poder ler esse "manual" de conversação do Theodore Zeldin. Em tempos tão hostis, nada como um bom papo para nos livrar de algumas modorras e também de alguns preconceitos. Sucesso!
Caro Eduardo, assim que li sua reportagem corri direto para minha CDteca pois possuo um CD com as cirandas de Villa-Lobos. Pensei ser o mesmo que você citou neste seu artigo. Contudo, comprovei que é um gravado pelo pianista Homero de Magalhães, em gravação original de fevereiro de 1960, reeditado em 2000, pela Dubas Música/Universal Music. O disco apresenta duas capas: a original, de Michel Scharter e Aloísio magalhães, e a da edição de 2000, de Carlos Scliar. Entre as mais conhecidas temos “Terezinha de Jesus”, “A Senhora Dona Sancha”, “O Cravo brigou com a Rosa”, “Passa, passa, gavião”, “Fui no Tororó”, “Nesta rua, nesta rua”, “A canoa virou”. Bem, pelo menos são as que eu ouvia quando garoto. O resto, de um total de 16 cirandas, mostram o belo trabalho de Villa-Lobos em recriar para o piano estes exemplares do cancioneiro popular brasileiro. Eu o adquiri, pasmem, num tabuleiro de CDs a R$ 6,90. Abraços