A política como cinema: Lula lá | Lucas Rodrigues Pires | Digestivo Cultural

busca | avançada
51777 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Show de Renato Teixeira em SCS
>>> Bora Pro Baile: Gafieira das Américas
>>> Ícone da percussão no mundo, Pascoal Meirelles homenageia Tom Jobim com show em Penedo
>>> Victor Biglione e Marcos Ariel celebram 30 anos de parceria em show no Palácio da Música
>>> Hospital Geral do Grajaú recebe orquestra em iniciativa da Associação Paulista de Medicina
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
Colunistas
Últimos Posts
>>> Lisboa, Mendes e Pessôa (2024)
>>> Michael Sandel sobre a vitória de Trump (2024)
>>> All-In sobre a vitória de Trump (2024)
>>> Henrique Meirelles conta sua história (2024)
>>> Mustafa Suleyman e Reid Hoffman sobre A.I. (2024)
>>> Masayoshi Son sobre inteligência artificial
>>> David Vélez, do Nubank (2024)
>>> Jordi Savall e a Sétima de Beethoven
>>> Alfredo Soares, do G4
>>> Horowitz na Casa Branca (1978)
Últimos Posts
>>> Escritor resgata a história da Cultura Popular
>>> Arte Urbana ganha guia prático na Amazon
>>> E-books para driblar a ansiedade e a solidão
>>> Livro mostra o poder e a beleza do Sagrado
>>> Conheça os mistérios que envolvem a arte tumular
>>> Ideias em Ação: guia impulsiona potencial criativo
>>> Arteterapia: livro inédito inspira autocuidado
>>> Conheça as principais teorias sociológicas
>>> "Fanzine: A Voz do Underground" chega na Amazon
>>> E-books trazem uso das IAs no teatro e na educação
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Vida e morte do Correio da Manhã
>>> O centenário de Contos Gauchescos
>>> Suassuna no Digestivo
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Neruda, oportunista fantasiado de santo
>>> Lauro Machado Coelho
>>> Tchekhov, o cirurgião da alma
>>> Desperte seu lado Henry Ford
>>> Teatro sem Tamires
>>> Porque crescer não é fácil
Mais Recentes
>>> Livro Presença Da Literatura Brasileira Das Origens Ao Romantismo de Antonio Candido; Outros pela Difel (1982)
>>> Dos Erros e da Verdade- Louis-Claude de Saint-Martin de Louis Claude de Saint Martin pela Diffusion Rosicrucienne
>>> História E Psicanálise - Entre Ciência E Ficção de Michel De Certeau pela Autêntica (2012)
>>> Livro A Escola Secundaria Moderna de Laura De Oliveira Lima pela Vozes (1970)
>>> Cem Anos De Solidão de Gabriel Garcia Marquez pela Distribooks Int'l inc (2024)
>>> O Erro de Descartes: Emoção, Razão e o Cérebro Humano de António R. Damásio pela Companhia das Letras (1996)
>>> Livro Para Sempre Sua Volume 3 de Sylvia Day pela Paralela (2013)
>>> Machado de Assis Obra Completa Volume 3 (três) de Machado de Assis pela José Aguilar (1962)
>>> O Filme Dramático Europeu de Guido Bilharinho pela Itcu (2010)
>>> El Oráculo De La Luna: Guía Tu Vida Según Los Ciclos Lunares de Caroline Smith; John Astrop pela Arkano Books (2022)
>>> Livro Assassin's Creed Renaissance de Oliver Bowden pela Ace (2010)
>>> Coleção Folha Fotos Antigas do Brasil 1 São Paulo de Vila a Metrópole de Folha De S. Paulo pela Folha de São Paulo (2012)
>>> A Feiticeira de Jules Michelet pela Circulo do Livro (1974)
>>> Livro Sexo & Cia. de Jairo Bouer pela Publifolha (2002)
>>> Introdução à Psicopatologia Psicanalítica de Juan Carlos Kusnetzoff pela Nova Fronteira (1982)
>>> Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século de Italo Moriconi; Diversos Autores pela Objetiva (2001)
>>> O Apanhador No Campo De Centeio de J. D. Salinger pela Do Autor (2024)
>>> Livro Crianças Aprendem O Que Vivenciam de Doroty Law Nolte; Rachel Harris pela Sextante (2003)
>>> Evangelhos Sinoticos E Atos Dos Apostolos - Volume 6 de R Monasterio ; Alfonso Ortega Carmona pela Ave Maria (2000)
>>> Os Romanov - 1613-1918 de Simon Sebag Montefiore pela Companhia das Letras (2016)
>>> Livro Boas Maneiras E Sucesso Nos Negócios de Celia Ribeiro pela L&Pm (1993)
>>> A Feiticeira de Jules Michelet pela Circulo do Livro (1990)
>>> Livro Palavras Para Depois Conversas Com Pepe Mujica de Fabián Restivo pela Coragem Editora (2024)
>>> Ultimate Beginner Keyboard Basics: Steps One & Two, Book & Cd (the Ultimate Beginner Series) de Debbie Cavalier, Larry Steelman pela Alfred Music (1996)
>>> Ismael Nery 50 Anos Depois de Aracy Amaral e Tantos Outros pela Mac Sp (1980)
COLUNAS

Segunda-feira, 13/12/2004
A política como cinema: Lula lá
Lucas Rodrigues Pires
+ de 3700 Acessos

Dois anos depois de eleito presidente, chegam aos cinemas dois documentários sobre Lula, um diretamente inspirado no candidato, outro indiretamente, voltado ao tempo das greves em que Lula surgiu no cenário nacional. O primeiro é Entreatos, de João Moreira Salles, o outro Peões, de Eduardo Coutinho. Ambos distintos em suas propostas, em sua linguagem, em seu intuito, ambos com a presença ou sombra do mesmo personagem.

Assisti aos filmes um seguido do outro. Saí da segunda sessão exausto, overdose de Lula (Entreatos) que cansou minha visão. Lula é uma figura emblemática, carismática e capaz de gerar os mais diversos sentimentos. Quem simpatiza com ele vai ver em Entreatos mais uma razão para admirá-lo, quem não vai com sua cara barbuda encontrará resquícios para criticá-lo a exaustão - os "s" comidos quando fala, o fato de gostar de beber etc. Mas antes de ser um filme sobre os bastidores do último mês de campanha de Lula à presidência - a proposta do filme nasceu da idéia de registrar sem censuras o candidato do PT em todos seus momentos durante o último mês de campanha (Lula anuiu e João Salles, como relata em narração off no início do filme, teve total liberdade para filmar, editar, não tendo inclusive o presidente visto o filme antes de chegar aos cinemas) - Entreatos se parece mais com um tratado sobre a política no Brasil.

O grande lance do filme - e também de seu protagonista - reside em mostrar o que é a política hoje. Salles mostra o que todos nós sabemos - que política é no fundo um jogo de encenação - pela prática. Vemos Lula lendo discursos pelo teleprompter, vemos Duda Mendonça e Aluisio Mercadante discutindo quais os temas que o candidato deveria enfatizar em tal discurso, qual palavra não deveria ser dita, vemos comentários e a repercussão de entrevistas de grandes empresários e de adversários políticos no centro nervoso da campanha Lula e, o que me surpreendeu, o acompanhamento em tempo real do debate entre Lula e Serra por pessoas que comentam o que estão achando e a equipe de Lula passa quase que instantaneamente as instruções do que vai bem e do que não está funcionando para a cúpula transmitir ao próprio candidato no estúdio em que se gravava. A política, tal qual a ficção, é um palco em que figurantes fazem a cena. Mudam-se apenas os nomes. Num são atores, noutro, políticos.

Ironia da situação, João Moreira Salles faz um cinema-verdade (o documentário, intenção de obter a realidade), busca uma realidade máxima que é, ao fim das contas, uma grande ficção. Filma com formato de realidade o que é encenação. Lula é um grande ator, cumpre seu papel com maestria e saímos da exibição com a sensação de que só ele seria capaz de governar este país. De fato, em termos de expressão nacional, como o próprio então candidato afirmou num dos vôos entre comícios, ele é a única liderança nacional. Não há alguém com o carisma e reconhecimento que Lula tem junto ao povo. Mas parece fato também que o homem privado há tempos não existe mais. Cedeu espaço ao homem-show, ao homem-mídia, ao homem público, ao homem-político, adaptado conforme seu tempo e eleitorado exigem. Luis Inácio da Silva morreu. Persiste apenas Lula. Mas um Lula transformado pelo tempo, pela experiência, pelos cabelos brancos e barba rala, pelos ternos de linho e gravatas de seda.

Um tanto longo e cansativo, Entreatos tem momentos de grande interesse histórico e de descontração, como aquele em que Lula, quando se preparavam para gravar um discurso para a TV de Belém, pega o telefone e finge falar com o presidente argentino como se este quisesse Luis Favre (marido de Marta Suplicy) de volta. Ou então quando Salles entrevista o rapaz porto-alegrense que perdera o vôo de Florianópolis-Porto Alegre, mas, depois de cumprimentar Lula no aeroporto, acabou "encaixado" por Lula em sua comitiva que se dirigia à capital gaúcha. É interessante ver também toda a patota de Lula que hoje governa o país: o sempre desconfiado Zé Dirceu, que não gostou da câmera de Salles, o tímido Palocci, hoje o homem forte de Lula, Graziano, José Alencar (responsável pela cena mais interessante do filme junto a Lula e Palocci, quando discutem futebol durante um dos vôos), Gushiken, Duda Mendonça, com seu brinquinho horroroso, Mercadante, o cérebro da turma, e em menor aparição os Suplicys.

Já o documentário de Coutinho, de nome Peões, tem outra proposta. Se em Entreatos a câmera se punha a espiar, a invadir, a registrar momentos como se ali não estivesse (como um Big Brother), Peões faz dela sua razão: Coutinho tira dos personagens depoimentos, eles sabem que estão ali para serem registrados. Em sua simplicidade de filmagens e trabalho - basicamente essas entrevistas filmadas - Coutinho produz história e não apenas cinema. Alias, cinema é o que menos se tem em seus filmes. Desde Cabra Marcado para Morrer, o documentarista reconta em imagens faladas histórias e, assim, vai reconstruindo a História recente do país. Falar das greves de 79 a 81 no ABC paulista é, sem dúvida, entrar no tema da ditadura militar, da migração nordestina, do conflito de classes e ideológico que marcou os anos 70. Peões, indiretamente, trata de tudo isso e mais um pouco. É um filme, antes de tudo, sobre o ser humano, sobre seres humanos que sofreram e lutaram, em determinada época de suas vidas, contra algo que acreditavam injusto e amoral. Lula foi o epicentro desse movimento, o pavio aceso que levou ao engajamento. Metalúrgicos que fizeram parte das greves - anônimos, como está escrito na apresentação do filme - são entrevistados por Coutinho. O diretor vai ao Ceará conversar com alguns que, depois do movimento, por motivos diversos e distintos, voltaram à terra natal. A maioria dos operários do ABC era nordestinos, atraídos pelo pujante crescimento econômico que se dera nos anos 70 com a indústria automobilística e a expansão da rede rodoviária. Trechos de vidas são remontadas num mosaico tão plural mas ao mesmo tempo tão homogêneo. Cada vida é diferente da outra, retalhos de tecidos guardados que no final darão uma bela colcha.

Há entrevistas tocantes pela simplicidade dos personagens, como a da servente do sindicato (foto abaixo) que se orgulha e chega a chorar quando recorda que salvou o filme Linha de Montagem de ser preso pela polícia. Ela chega a dizer que aquilo era importante porque "era a única história que nós tínhamos". De fato, Coutinho utiliza diversas imagens deste filme e de ABC da Greve, de Leon Hirszman.

Na entrevista final, com Geraldo, soldador desempregado que participou do movimento, este explica o que vinha a ser peão. "Peão é aquele que bate cartão, que veste uniforme". Depois de um longo silêncio, em que a câmera permanece firme no rosto de Geraldo, ele pergunta ao diretor se ele já tinha sido peão. A resposta é rápida e simples: "Não". Escurece a tela e fim do filme. Talvez Geraldo não tenha dado a idéia exata de peão. Peão talvez seja o empregado, aquele que é subordinado, que trabalha horas e horas e ainda consegue chegar em casa e sorrir. Também aquele desempregado, que luta, luta e nada no final do dia. São todos peões, fora do âmbito de poder. E, diante disso, talvez Coutinho também esteja errado. Ele é, assim com Geraldo, um peão. Peão do Brasil, de sua história, de suas imagens.


Lucas Rodrigues Pires
São Paulo, 13/12/2004

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Lourival, Dorival, assim como você e eu de Elisa Andrade Buzzo
02. Quem é Daniel Lopes de Daniel Lopes
03. João Paulo Cuenca e seu Corpo Presente de Renata de Albuquerque
04. Para assistir no Dia dos Namorados de Clarissa Kuschnir


Mais Lucas Rodrigues Pires
Mais Acessadas de Lucas Rodrigues Pires em 2004
01. Olga e a história que não deve ser esquecida - 30/8/2004
02. Os narradores de Eliane Caffé - 5/2/2004
03. Quem tem medo de Glauber Rocha? - 19/7/2004
04. As garotas do Carlão - 13/9/2004
05. Cazuza e o retrato do artista quando jovem - 5/7/2004


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site



Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




O Estado Que Nós Queremos
Diversos
Espaço e Tempo
(1993)



Alimentação Natural ao seu Alcance - Parte 1
Não Consta
N/c



Punctuation Takes a Vocation
Robin Pulver; Lynn Rowe Reed
Scholastic
(2003)



Movimentos populares no Brasil 456
José Luiz Del Roio
Global
(1986)



Envelhecimento Cutâneo - (dermatologia)
Barbara A. Gilchrest / Jean Krutmann
Guanabara Koogan / Lab
(2007)



O Que É Religião? Uma Questão Para a Teologia Católica
John Cobb e outros
Vozes
(1980)



A Madona de Cedro
Antonio Callado
Nova Fronteira
(1997)



Hashtag English 3 Pre-intermediate
Leonor Corradi
Pearson
(2023)



O Caminho de Santiago - Uma Peregrinação ao Campo das Estrelas
Sergio Reis
Artes E Oficios
(1999)



A Menina e o Elefante
Frei Betto
Ftd
(1993)





busca | avançada
51777 visitas/dia
1,9 milhão/mês