Tava demorando...
Rodinha de samba no botequim, ambiente democrático porém respeitador: quem não sabe a letra não canta, quem não tem instrumento não batuca na mesa. Em meio a apreciadores da música simples, gente da noite e boêmios, amadores ou profissionais, aquela menina. Jeito de recém chegada de Arembepe há 30 anos. A estampa pop art na camiseta e o discreto piercing no nariz fazem o contraponto estético moderno-tradicional, cujas leis são recitadas milimetriamente por cada peça que compõe seu vestuário. Os cabelos são escorridos, não tem maquiagem e é bonito ver como ela se assanha quando toca uma música que conhece. O papo com a amiga, alter ego, roda por Santa Teresa e bares da Lapa.... Apesar dos olhares cúmplices e 2 beijinhos no rosto aqui e ali, fica a impressão de que ela tem, ou não tem alguma coisa que a impede de se misturar à fauna local, não se sabe bem o que. Até que ela saca o celular da bolsa.
Como aquele livro do Veríssimo: As mentiras que os homens contam
Diálogo entreouvido no mesmo bar, na mesma noite, entre,
Coroa, com idade para ser o senhor seu pai, mas apesar disso dando em cima:
- Qual é a sua religião? Moça bonita, o mesmo jeito de recém saída de Arembepe, a voz duas oitavas acima do normal porque a parte de seu superego que cuidava disso já foi completamente dissolvida em álcool:
- Eu sou atéia. Coroa: Mas atéia, não acredita em nada? Moça: Em nada. Quer dizer. Eu acredito em energia. As pessoas têm energia.
Coroa, de bate pronto: E eu mais ainda!
9 rainhas, 2 valetes e 1 curinga
O filme 9 rainhas é argentino, mas seu roteiro poderia perfeitamente ter sido ambientado no Rio de Janeiro da década de 80. Não bastasse ter que aturar a seleção deles na cabeça do grupo, e ver o dólar levantar vôo por conta dos coices do ministro Cavallo, a gente ainda tem que engolir o fato de não ter conseguido produzir uma leitura tão correta do momento em que vivem, vivemos, no cinema, o meio perfeito para esse tipo de retrato. Juan e Marcos são 2 pilantras, tambiqueiros, safados, punguistas que ganham a vida escorregando entre as brechas no sistema e enganando velhinhas indefesas. A maneira solidária com que ambos são tratados no roteiro remonta à eterna tradição literária, particularmente de esquerda, de glorificar os marginais, os excluídos do sistema, porque vítimas de um status quo injusto. Incapazes de realizar produtivamente seu potencial, acabam voltando-se para o crime, como bem exemplifica Carlinhos Oliveira na novela Terror e Êxtase. Ainda que preceba-se certo esquematismo na constução dos personagens - Valeria é a ética do trabalho, que "rala a bunda 12 horas por dia" na baixa gerência de um hotel de luxo, contraste ao imoral Marcos, que elogia a bunda da própria irmã e não vacila em se valer de uma situação de inferioridade para arrancar uma porcentagem maior do botim; já Juan é o canalha com culpa, o que aplica golpes, mas com o "nobre objetivo" de arrumar dinheiro para a operação de seu pai - ela foge do maniqueísmo fácil: apesar da falta de escrúpulos, é possível nutrir certa simpatia pelo jeito cínico de Marcos, pronto a negar com a cara mais limpa do mundo as acusações mais óbvias contra ele; também é possível implicar definitivamente com Juan, a despeito de suas "boas intenções", porque ele não vacila em mentir descaradamente para conquistar a confiança de velhinhas. Quando a situação limite do grande golpe pinta, o filme decola, colocando o espectador para desconfiar de cada coadjuvante novo que entra na história: qual é o papel daquele assaltante gordo na trama? quem está armando para cima de quem?, sem saber que sutilmente já foi envolvido no rolo, passando a fazer parte do jogo. A memória lembra de imediato Golpe de Mestre (o filme que reabilitou o ragtime de Scott Joplin) e aquele filme antigo do Mamet, mas se agora não temos Paul Newman e Robert Redford, contamos com malandros à vera, e se o final não é tão inventivo quanto o roteiro pedia - devia ter acabado 2 takes antes, na cena do banco - pelo menos guarda o mérito de manter a expectativa do público ao deixar o desenlace para literalmente a última cena.
Porque nasci, nasci para bailar
O lançamento da primeira biografia de Nara Leão pelo Sérgio Cabral, que parece realmente disposto a contar a história da MPB, refrescou uma dúvida que nunca consegui responder: como é que Nara Leão foi alçada à musa da bossa nova? Qualquer livro sobre o período se refre a ela assim. Mas eu sempre me recusei a acreditar que ela o merecesse. Aquele cabelo chanel, aquele olhar de mormaço, aquele sorriso dentuço, sem graaaaaça... Definitivamente, ela não era bonita - muito pelo contrário, aliás, para quem nasceu irmã de Danuza Leão. Basta dizer que ela foi a única musa até hoje cuja parte mais badalada do corpo eram... os joelhos. Musa não tem que ser bonita? Fazia um certo charme diferente, afeito a intelectuais (gente que nunca foi muito boa para escolher musa); Jeanne Moreau não precisa de mais do que um certo olhar perdido em Paris chuvosa à noite, em Ascensor ao Cadafalso, para arregimentar uma legião de fãs. Mas Nara Leão também era sem graça; tímida e sua presença de palco ou cênica é o sem jeito em pessoa. Sua atuação em Quando o Carnaval Chegar é uma aula de anti-interpretação, e olha que ela concorria com os caramujos Maria Bethânia e Chico Buarque. No livro que escreveu, Nelson Mota se vale do jargão anos 90 para explicar o magnetismo que ela exercia: "Nara tinha atitude". Nesse dias em que Attitude é o nome de uma revista mensal inglesa (o que eu mais queria era trabalhar na agência de propaganda detentora da conta dela para fazer um anúncio com o slogan: "Compre a sua Attitude, todo mês, nas bancas"), eu desconfio desse tipo de justificativa, mesmo reconhecendo que seu jeito despojado, rosto sem maquiagem, fizesse uma diferença naqueles tempos ainda bicudos - Lenny Bruce ainda ia em cana por contar piada com palavrão. Feia, sem graça, xôxa... mas por que musa, gente? Qual o motivo? Um amigo de família ligada à bossa nova foi mais pragmático: "Ela era musa porque dava, pô! As outras não davam!" Faz sentido. A Danuza sempre foi conhecida como mulher liberal e liberada, comportamento herdado da criação descontraída de seus pais. Mesmo assim, é de se perguntar: bastava isso, um comportamento anti-usual, para naquela época sempre risível que é o passado recente ("Olha como nós éramos magros, Valdir!") transformar uma moça de família em musa, mesmo que musa de praia e botequim? Que o Cabral me ajude a descobrir essa.
Aspas novamente para meu chapinha João Marcelo, o (de)formador de opinião
"No inverno do Rio a temperatura cai de 38 para 28 graus e tem gente que sai na rua de touca. E de crochê. Voz de prisão para todo mundo!"
VOCÊ NÃO SABE NADA DE TC, FALANDO QUE A FERNANDA YOUNG NÃO TEM TALENTO...VC QUE NÃO TEM.....RECEBE SALÁRIO SÓ PRA FALAR MAL DOS OUTROS...TEM FACULDADE PRA ISSO?