Minha experiência inicial com a rede mundial de computadores se deu, por mais estranho que possa parecer, por acaso. No hoje longínquo ano de 1996, eu já sabia que gostaria de ser jornalista (sim, sim, é um vício, não um ofício). Naquele momento, no entanto, era fundamental que eu estivesse em alguma das "profissões do mercado". As opções que eu tinha não incluíam nada relacionado ao jornalismo. Havia lá um colegial técnico de publicidade, mas não queria aquilo. Sem querer, então, aceitei o desafio de estudar Processamento de Dados no Colegial - que hoje se chama Ensino Médio.
Por que desafio? Ora, pelo simples fato de meus conhecimentos em relação à programação serem à época - assim como hoje - pífios (a diferença é que hoje eu sei identificar, pelo menos, para que servem as plataformas). Desse modo, ao longo dos três anos do colegial, tive de me esmerar em aprender algo que não tinha o menor vínculo; enquanto isso, via meus colegas aproveitando todas as oportunidades que o curso proporcionava. Essa condição continuaria a mesma, caso não fosse meu gosto por escrita e literatura. Acompanhe a narrativa, leitor, que há de ficar mais interessante.
Não, naquela época eu não era um literato, tampouco um talento juvenil. Nada disso. Ocorre que eu já tinha, sim, um certo apreço pelos livros, pela música e gostava, sim, de escrever. Aqui e ali, produzia meus textos e sempre pedia para os colegas que me deixassem a parte escrita dos trabalhos comigo (aí, sim, já era um redator-chefe). Bom, foi então que um grande amigo na época, o Alfredo, tinha um grave problema com os trabalhos de Língua Portuguesa e Literatura. Recorreu, então, a mim para que o ajudasse em um trabalho sobre Machado de Assis (sempre ele) na véspera da entrega. Estávamos em 1997 e pouquíssimas pessoas, pelo menos no Colégio onde eu estudava, tinham acesso a internet em casa (conexão discada, viu, leitor, nada de banda larga). O fato é que o Alfredo ficou tão agradecido com o resultado do trabalho (lembro-me de que ele tirou nota 7) que ele me forneceu a sua senha de acesso pessoal por tempo indeterminado. E foi numa sexta-feira de setembro de 1997 que eu passei a ter acesso a internet. Via Mandic. A partir dali, com o perdão do chavão, nada seria como antes.
E os motivos para tanto são simples. Logo no início de 1998, foi pela internet que eu soube que o Oasis, uma de minhas bandas prediletas no momento, viria tocar em São Paulo (como de fato ocorreu, em 21 de março daquele ano). Ainda relacionado ao Oasis, pode-se dizer que minha primeira resenha musical saiu logo após aquele show, para um site que um colega havia criado especialmente para tanto. O relato desapareceu na poeira desta galáxia, perdido numa das páginas gratuitas do extinto Geocities.
Olhando em retrospecto, a relação com a internet foi mais marcante do que eu podia imaginar. Pois foi a partir da rede que eu fiz minha inscrição para o vestibular em junho de 1998, sendo que pela mesma via descobri que havia sido aprovado. Jornalismo, pois sim, e com a rede pulsando mais do que podia contabilizar. Na esteira dos primeiros textos, publicava uma série de artigos enfurecidos, agora inspirados pela minha leitura de imprensa, numa página anarquista (!). Não durou muito porque não era tão militante político. Ainda não sou, mas hoje tenho plena ciência disso. E não sou mais anarquista.
Minha história com a internet permanece mais forte, mesmo depois que me formei. Pois meu primeiro emprego como jornalista foi o de redator num site de conteúdos educacionais à distancia. A despeito da pesquisa que era realizada em livros e em outras publicações, a maior parte das consultas era feita pela web. Como trabalhava em média de 8 a 10 horas conectado, tornei-me um rato na leitura de inúmeras páginas, inclusive deste Digestivo (a história completa está aqui).
Hoje, o resultado não poderia ser mais favorável. Em quase oito anos, e apesar de ter ficado mais tempo conectado do que deveria, é graças à internet que não só meu trabalho como jornalista mas também minhas atividades culturais e de lazer são potencializados. Posso, agora, fazer consultas em jornais franceses ao mesmo tempo em que consigo consultar livros que jamais conseguiria se dependesse da boa vontade das livrarias brasileiras, sem mencionar a busca por autores desconhecidos e das dicas de viagens, recentemente minha atividade predileta.
Embora meu relato seja um tanto otimista, não acredito tanto nas profecias, ora apocalípticas, ora salvadoras, de que a internet vai destruir ou salvar o mundo. Do primeiro grupo, há quem diga que a internet veio para solapar nossa atividade cultural, posto que os jovens, agora, substituem a leitura e as brincadeiras mais sadias da infância de nossos pais. Acredito que isso seja tão anacrônico como levar a sério a "promessa" de que basta instalar internet nas escolas públicas ou nos bolsões de pobreza, como pregam os seguidores de Pierre Levy, para que a miséria e a desigualdade social sejam erradicadas dos países em desenvolvimento (leia-se, aqui, Brasil). Nenhuma das duas hipóteses aconteceu porque nada é tão simples como parece. É muito mais do que isso. Nesse sentido, cabe a todos, a exploração do melhor deste novo universo, que é a Galáxia da Internet.
Fabio, gostei bastante do seu texto. A relação internet-trabalho-diversão é parecida com minha experiência... Quanto à internet salvar o mundo, acho que já salvou. Primeiro, nas bilhões de páginas HTML que ficam armazenadas por aí, recordando a história. Segundo, porque abriu as portas para China, Índia e um monte de outros países entrarem em peso na indústria de serviços... Quem tem a temer é só quem estava sentado na sombra. De resto, vejo que a internet é sem dúvida uma das maiores revoluções desde a impressão do livro.