Ufa! Finalmente a Copa acabou. Perdemos, é verdade, mas posso dizer que tirei uma grande lição de tudo isso. Calma, calma. Antes que você vá para outro site e continue a fingir que trabalha, espere um pouco. Prometo que não falarei de falta de garra e excesso de dinheiro; da obesidade dos nativos de Bento Ribeiro; da onipresença do jogador mais feio do Brasil nos intervalos comerciais; nem de como é desagradável continuar comprando produtos que estampam jogadores ou temas da Copa. Vou falar de algo muito mais sério e que é a verdadeira causa, não só da nossa insatisfação com a derrota do Brasil, como também, de grande parte das nossas tristezas. Vou falar de democracia.
Democracia? Isso mesmo, democracia. Sabe aquele modelo de governo utópico que a gente finge que existe no Brasil e serve de pretexto pros EUA invadirem tudo que é país? É esse mesmo. Depois da derrota do Brasil, ao ver meus amigos revoltados discutindo o currículo (com trocadilho, por favor) da mãe do Parreira, percebi que a democracia aqui é furada. "Mas o que isso tem a ver com a democracia?", você se pergunta. Eu explico: a nossa ingerência sobre o futebol me fez ver que, apesar de termos eleições diretas para nossos representantes e tudo mais, não votamos naquilo que realmente nos interessa.
Quer um exemplo? Quantos de nós já não nos pegamos falando ou ouvimos pessoas próximas dizendo que de nada adianta votar pra presidente, senador, deputado, e afins? Afinal, é senso comum que tudo não passa de um jogo de cartas marcadas e quem realmente manda no Brasil são os interesses financeiros internacionais, os bancos, as oligarquias e bandas de axé baianas, e os bacharéis de economia da PUC.
Ao professar esse tipo de evangelho do pessimismo, não estamos simplesmente dizendo que o voto não serve de nada, mas, sim, que não nos interessamos em votar. E não nos interessamos em votar, pois não acreditamos que o nosso voto irá efetivamente mudar a nossa vida. Afinal, se realmente achássemos um absurdo a opressão capitalista no Brasil, poderíamos botar em risco nossas poupanças e preciosas vantagens burguesas votando numa Heloísa Helena ou em outra pessoa sem senso de humor que não sabe se vestir.
Por outro lado, acredito, muitos se interessariam em votar em questões pequenas, mas de real influência na nossa felicidade, como, por exemplo, o próximo técnico da seleção ou até a capa da Playboy do mês que vem.
Pensando nisso, sugiro a instituição e o funcionamento de algumas eleições diretas e facultativas, como todas deveriam ser, que nos tornariam menos reclamões e mais responsáveis pela nossa própria felicidade.
1) Capa de Playboy - Essa eleição ocorreria mensalmente e dela poderiam participar todos os maiores de 18 anos e adolescentes que comprovarem ter calos na mão ou displasia mamária causada por masturbação (sintomas apenas psicológicos serão aceitos). Além de decidir a mulher que aparecia no ensaio principal, essa eleição versaria sobre a parte do corpo da beldade mais exibida nas fotos e os ângulos preferidos. A segunda colocada automaticamente iria aparecer na Sexy, mas seria obrigada a aparecer em pelo menos 50% das fotos na famosa pose "Meu útero não é lindo?".
2) Técnico da Seleção Brasileira - Feita de 4 em 4 anos, essa eleição seria uma das poucas a permitir reeleição automática, no caso de levarmos o Caneco. No caso de derrota, o técnico que deixa o cargo seria linchado em praça pública enquanto a próxima vítima, quer dizer, o próximo treinador seria eleito por aclamação popular desqualificada, i.e., o nome mencionado pelo maior número de populares e jornalistas esportivos seria o escolhido. A escolha da equipe técnica seria decidida pelo recém eleito, mas o Zagallo permaneceria de qualquer forma. No caso da morte do Zagallo, seu corpo seria empalhado e levado para a próxima copa como um amuleto de boa sorte acionado pelo mantra "Zagallo morreu", frase que, por acaso, tem 13 letras.
3) Final de Novela das Oito - Uma eleição às avessas. Realizada nos salões de cabeleireiro e nas praças públicas, iria, através do volume das fofocas, determinar como ganhador o final menos esperado. O resultado da eleição seria um tanto ambíguo. Poderia tanto surpreender os eleitores positivamente, como lhes fazer declarar pela enésima vez: "Faz tanto tempo que não vejo uma novela boa...". Seja como for, isso, além de manter donas de casa e noveleiros enrustidos, que afirmam odiar novela, grudados na TV, permitiria a Nelson Rubens e Sônia Abrão descerem um degrau na escala do jornalismo passando de fofoqueiros profissionais a analistas políticos.
4) Maior vagabunda do Brasil - Reservada apenas às mulheres de meia idade que assistem a programas vespertinos, essa eleição determinaria a mulher mais odiada pela população feminina. Através dela poderíamos, além de determinar as possíveis candidatas à capa de Playboy, evitar os custos da eleição de mulher mais gostosa do Brasil. Afinal de contas, o resultado seria o mesmo.
5) Grande vilão da Política Nacional - Ao invés de decidirmos os nossos governantes, muito mais útil seria decidir o grande vilão do Brasil. Ao agraciado nessa eleição seria dado um cargo público federal através de sorteio dentre as opções: presidente da República, senador ou deputado federal. Imediatamente, o eleito seria alçado a líder de seu partido e ganharia imunidade contra todos os crimes, sejam eles eleitorais ou não. Essa eleição não inviabilizaria as eleições tradicionais, mas daria um colorido maior a elas e nos permitiria perceber quantas vezes cavamos, com o voto, a nossa própria cova. No caso do eleito não corresponder às expectativas, seja por apresentar virtudes políticas ou mostrar preocupação com o bem-estar do povo, ele seria imediatamente deposto. Afinal, político desonesto a gente até aceita, mas votos inúteis já bastam os de sempre.
É a oportunidade que tenho de contar duas historinhas: logo quando entrei na faculdade, alguns anos atrás, eu quis me engajar no movimento estudantil. E aí de vez em quando eu participava de assembléias. Em uma delas, seriam escolhidos os delegados e os suplentes que representariam as turmas de Letras em um congresso estudantil. Até aí, tudo bem? Certo. Prepare-se pro que está por vir. Começaram a assembléia dizendo o seguinte: quem quisesse ser delegado, levantasse a mão. Ficou faltando gente, se não me falha a memória. Daí alguém gritou de lá: "vai ser assim é? Basta se candidatar e pronto? Proponho uma votação pra saber se todo mundo concorda que, quem levantar o braço, vai ser delegado no congresso". Bom, tava FALTANDO delegado. Daí outra pessoa retrucou: "Pois eu proponho fazer uma votação pra saber se é necessária essa votação". Não, eu não estou inventando nem fazendo chacota, não. Isso realmente aconteceu e eu estava lá! (continua)
(Continuando.) Tempos depois, a biblioteca inventou de mudar a maneira de guardar mochilas e pastas. Agora é necessário entrar em uma fila para pegar uma chave de armário, e depois outra fila para devolver a chave do armário utilizado. Até aí tudo bem. Mas o caso é que não havia uma fila pra cada coisa. Era uma fila para os dois objetivos. Lembro que ao me deparar com uma fila sem tamanho, eu disse a um amigo, em tom de brincadeira "democracia demais é uma desgra...". E, no fundo, no fundo, é o que eu penso. Acho que o conceito de democraria se perdeu em algum momento de nossa História. O que vivemos não é uma democracia, e sim, outra coisa, sem nome. E mais: os políticos se aproveitam da democracia para fazer suas mutretas. Eles deveriam ser vigiados, uma espécie de Big Brother no Planalto. Para sabermos até o que pensam os parlamentares. Mas aí já é uma outra conversa.
Ja' temos no Brasil votacao para a capa da Playboy (veja la' no site deles), para tecnico de futebol tambem, mas o voto do Ricardo Texeira vale duzentos milhoes... e, inclusive, uma votocao para a maior vagabunda do pais: Big Brother Brasil. O final da novela das oito e' escolhido pelos diretores da "Grobo", que costumam fazer "consulta ao publico"... Mas voce esqueceu de incluir uma votacao: a da melhor cerveja de fim de semana no pais...!
Ao contrário do que você escreve, não porque está errado, penso que temos Democracia, que temos Governo, mas não temos República, não temos o mesmo senso de fortacelimento nacional que existe em países muitos mais pobres do que o nosso. Talvez, esse seja um dos problemas....