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Segunda-feira,
3/3/2008
Histórias de robôs
Gian Danton
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A primeira impressão que se tem ao folhear o primeiro volume da trilogiaHistórias de robôs (L&PM, 2005, 235 págs.), da coleção L&PM Pocket, é de decepção. O nome, enorme, de Isaac Asimov na capa dá a entender que se trata de uma coletânea de histórias do autor de Eu, robô. Na verdade, Asimov foi apenas um dos organizadores e contribuiu com um conto para cada capítulo da trilogia. A decepção tem sua razão de ser. Asimov é garantia de boa leitura. Com uma narrativa simples, mas fluente, ele deliciou uma geração de fãs com seus contos construídos a partir de uma premissa lógica, como as três leis da robótica (1 ― um robô não pode fazer mal a um ser humano e nem permitir que algum mal lhe aconteça; 2 ― um robô deve obedecer às ordens dos seres humanos, exceto quando estas contrariarem a primeira lei; 3 ― um robô deve proteger a sua integridade física, desde que com isto não contrarie as duas primeiras leis). Aliás, foi ele que criou a palavra robótica.
Entretanto, aqueles que se aventurarem a ler, vão descobrir que a seleção vale a pena, mesmo com a pequena participação de Asimov. O volume 1 reúne as primeiras histórias sobre robôs, incluindo "Robbie", o conto de estréia de Asimov.
"O feitiço e o feiticeiro", de Ambrose Bierce, de 1894, abre o volume. Bierce é um famoso jornalista e contista norte-americano. É um nome célebre, mas sua história "O feitiço e o feiticeiro" parece deslocada na coletânea. O conto narra a história de uma máquina capaz de jogar xadrez que se rebela contra seu criador. A narrativa é, provavelmente, influenciada pelo jogador automático inventado por Wolfgang Von Kemplen em 1809. A máquina chegou a vencer Napoleão II num jogo e causou rebuliço. Depois, descobriu-se que existia na verdade um anão dentro do mecanismo, movimentando as peças. Bierce pretende discutir as implicações filosóficas da criação de uma máquina desse tipo, mas não avança muito. Além disso, seu robô descontrolado destoa totalmente dos robôs apresentados nos outros contos da coletânea.
"A máquina perdida", de John Wyndham, de 1932, já apresenta um robô bem intencionado, ou pelo menos não-maligno. Outra novidade é a história contada em primeira pessoa pelo próprio robô. Isso, acrescido do suicídio do personagem robótico, levou a história a contar na coletânea. A narrativa, ao mostrar um robô alienígena em suas aventuras pela Terra, tem um toque humorístico e antropológico que vale a leitura, mas é apenas aperitivo para o que vem adiante.
"Rex", de Harl Vicent, de 1934, é um exemplo muito interessante de história de robôs, embora insista no complexo de Frankstein, como Asimov chamava a mania de mostrar os robôs como malignos. O interessante aqui é que o robô, em sua lógica fria, pensa estar fazendo o melhor para a humanidade ao instalar uma ditadura mecânica. Outra característica interessante é que o robô Rex não é uma lata de sardinha ambulante. Ao contrário. Sua pele era de material plástico, usava peruca e roupas masculinas. Era como um ser humano comum, exceto por um detalhe: não tinha sentimentos. E quando finalmente consegue tê-los é que advém sua desgraça.
"Robbie", de 1940, é um marco. É a narrativa simples de uma garotinha apaixonada por seu robô. Mas já se encontram ali referências às leis da robótica e à cientista Suzan Calvin, que seria fundamental em obras posteriores. Asimov escreveu o conto em 1939, quando tinha apenas 19 anos. Ele enviou o texto para John W. Campbell, editor da revista pulp Astounding. Numa daquelas ironias do destino, Campbell devolveu o original com a desculpa de que o conto não tinha o nível de qualidade que pretendia manter. Mal sabia que estava diante de um clássico. Frederick Pohl percebeu o talento do novato e publicou a história na revista Super-science.
Um dos pontos altos do livro é o conto seguinte, "Adeus ao mestre", de Harry Bates, de 1940. Foi esse conto que deu origem ao clássico do cinema O dia em que Terra parou, de 1951. Todos os fãs de ficção conhecem a história do embaixador espacial Klaatu, que vem à Terra para nos alertar sobre o perigo nuclear. O filme de Robert Wise criou imagens que entraram no imaginário popular, e chegou a se tornar música de Raul Seixas. Mas Hollywood aproveitou do conto apenas os elementos básicos, mudando muito da trama. Em "Adeus ao mestre", o personagem principal é o robô. Depois que Klaatu morre, um monumento é erigido em sua homenagem ao redor da nave, que não pode ser aberta, e do robô, que não se mexe e aparentemente está inativo. Mas algo de estranho parece estar acontecendo e um fotógrafo decide passar a noite no local para tentar desvendar esse mistério. É nesse ponto que começa a trama. Todo o restante (o que seria, aproximadamente, o filme de Wise) é contado em flashback. Embora extenso, o conto tem aquele aspecto de fascínio e mistério que caracteriza uma boa ficção-científica. Some-se a isso um final surpreendente e, ao mesmo tempo, irônico, e tem-se um dos melhores momentos dessa coletânea.
Se "Adeus ao mestre" é um trunfo em termos de trama e final surpresa, "A volta do robô", de Robert Moore Williams, de 1938, se destaca pela narrativa elegante. Quem já leu Ray Bradbury certamente vai se lembrar de seu texto poético ao ler este conto. A trama é simples, mas ecoa um conteúdo mítico, como bem destaca o texto de abertura. Trata-se do mito do eterno regresso, mas aqui os heróis aventureiros que voltam para casa não são humanos, mas robôs. Eles voltam para a terra em busca de sua origem, dos seres que os haviam criado (nesse sentido, a trama lembra Jornada nas estrelas, o filme, de 1979, também de Robert Wise). Encontrando uma terra devastada por um vírus, os robôs a imaginam povoada, mas sua imaginação não vai além de seus próprios paradigmas: "Tentou imaginar milhões de habitantes perambulando por aquela cidade. Viu corpos de metal cintilante caminhando pelas ruas, flutuando no ar, junto à parede do edifício". Assim, a história dialoga com a filosofia e com a ciência cognitiva, como costumam fazer as boas obras de ficção científica.
Esse conto curto ficou tão bom que o editor Lester Del Rey insistiu para que Williams continuasse a história, contando como os robôs haviam chegado ao planeta distante. Williams sabiamente declinou da oferta, mas deu autorização para que o amigo o fizesse. O resultado foi "Mesmo que os sonhadores morram", de 1944. A presença do conto no volume vale para lembrar que às vezes é melhor deixar as coisas como estão. O interessante de "A volta do robô" é justamente os pontos não explicados, que deixam espaço para a imaginação e o raciocínio do leitor. Lester Del Rey sintetizou todo o significado filosófico em uma única frase, a mesma do título, banalizando os aspectos discutidos por Williams.
Finalmente, "Satisfação", de 1951, de A.E. van Vogt, fecha o volume. É uma história interessante, mas que parece com uma piada que se estende demais e perde a graça. De interessante aqui, a narrativa do ponto de vista de um computador (chamado cérebro, na história) e seus pontos de vista sobre os seres humanos. Não chega a fazer feio, mas também não é o melhor do volume.
Histórias de robôs é, apesar da inconstância, um bom livro. De negativo mesmo, só a capa. A coleção L&PM Pockets atualmente tem se destacado por algumas belas capas, que se destacam nas prateleiras, apesar do tamanho reduzido. Aqui, o responsável apenas colocou um fundo rosa com o título e o nome dos autores. Talvez a necessidade de destacar o nome de Isaac Asimov, como medida editorial, tenha imposto limitações, mas mesmo assim seria possível colocar ao menos uma figura.
Para ir além
Gian Danton
Macapá,
3/3/2008
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