2007 e os meus CDs ― Versão Internacional 2 | Rafael Fernandes | Digestivo Cultural

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COLUNAS

Quarta-feira, 21/5/2008
2007 e os meus CDs ― Versão Internacional 2
Rafael Fernandes
+ de 6500 Acessos

Já estão no ar a primeira, a segunda, e a terceira partes dos meus discos preferidos em 2007. Agora a quarta, com a parte 2 de lançamentos de artistas internacionais.

***

Queens Of The Stone Age ― Era Vulgaris


Ouça um trecho de "Sick, sick, sick"

Queens Of The Stone Age é uma banda que achei que nunca fosse gostar; faz músicas com estrutura baseada na repetição, sem grandes variações, com um groove meio "preso" demais. Mas acabou sendo uma das minhas preferidas dos anos 2000. Tem instrumental vigoroso; ainda que não haja nenhum virtuoso, as músicas são executadas com a pegada necessária. Tem um ótimo e carismático vocalista (Josh Homme, o dono da banda, na verdade), peso, grandes riffs, melodias pegajosas e boa dose de humor. O novo disco, Era Vulgaris é talvez seu melhor, e até agora o meu preferido; achei o disco inteiro bom ― em tempos de MP3 avulsas, é uma grande coisa. "Sick, sick, sick" é um rock empolgante; "Misfit Love" é repetitiva e enjoativa ― dá a impressão que vai morrer assim, mas surpreende na parte final; "Into the hollow" é macia (na falta de um adjetivo mais preciso); "Make it wit chu", de boas guitarras, que já havia aparecido num projeto paralelo de Homme, o Desert Sessions (no disco Volumes 9 & 10) como "I wanna make it with chu", volta quase igual, talvez um pouco mais polida. "I'm a designer", além de grande rock com belo refrão, tem letra ácida: "Minha geração não confia em ninguém, é difícil culpá-la, nem em nós mesmos/ A coisa que é real para nós: fortuna e fama/ Todo o resto parece trabalho (...) É realmente uma mentira/ eu falsifico a mim mesmo". Era Vulgaris traz um rock curto e grosso. Sem pretensões de "arte". É o que basta.

Minhas músicas preferidas: "Sick, sick, sick", "Make it wit chu", "Into the hollow" e "I'm a designer".

***

Radiohead ― In Rainbows


Ouça um trecho de "Videotape"

Mais comentado por ter uma divulgação inicial com um "quer pagar quanto" (influenciado pela falta de um contrato de distribuição), In Rainbows traz o melhor punhado de canções do Radiohead desde OK Computer. E desde Kid A, o Radiohead não "assusta" mais com seus timbres inventivos; este In Rainbows é, provavelmente, sua melhor combinação de grandes canções com texturas sonoras diferenciadas. A voz de Thom Yorke às vezes irrita, mas sua angústia esganiçada cai bem nas músicas. O disco começa incisivo com "15 Step", em que as guitarras marcam presença, mas com espaço para as viagens sonoras. Em "Bodysnatchers" as guitarras tomam conta da música, num dos raros momentos quase que "puramente" rock; "Nude" e "Weird Fishes/Arpeggi" tem a marca do Radiohead: melancolia e bons arranjos. "All i need" tem um clima diferenciado, começando seca e sendo desenvolvida com pequenas adições musicais até explodir no clímax final. "Jigsaw falling into place" é outro momento de pegada mais roqueira e novamente uma música que acontece de forma crescente. "Videotape" é uma das mais belas músicas dos últimos tempos, com a combinação exata de estranhamento e beleza. Finaliza o disco de forma tão linda quanto melancólica: "Esta é minha maneira de dizer adeus/ Porque não posso fazer isso cara a cara/ Não importa o que aconteça agora/ Eu não ficarei com medo/ Porque eu sei que hoje foi o dia mais perfeito que eu jamais vi".

Minhas músicas preferidas: "Videotape", "All i need", "Bodysnatchers", "Nude" e "Weird Fishes/Arpeggi".

***

Richie Kotzen ― Go Faster/Return of the Mother Heads Family Reunion


Ouça um trecho de "Feed my head"

Richie Kotzen ficou mais conhecido pelas participações no Poison e na (boa) fase final da subestimada Mr. Big (marcada só por baladas melosas, mas era mais), substituindo Paul Gilbert. É um grande guitarrista, com muito boa voz. Sua carreira-solo, da qual Go Faster é uma peça distinta, não traz nenhuma novidade musical: é calcada em muito do que o rock'n'roll clássico já mostrou (Rolling Stones, Led Zeppelin e Deep Purple, por exemplo), com pitadas de funk e R&B. Mas traz canções bem feitas e têm discos muito bons de ouvir ― particularmente este Go Faster (que tem dois nomes porque The Return... é nome no Japão e Europa e Go Faster para o resto do mundo). É o melhor disco de Kotzen dos últimos anos: coeso, de suingue monstruoso, belas melodias, instrumental consistente e músicas certeiras. E, claro, um show de guitarra bem tocada. Se for para reprisar o passado, que seja com os ingredientes básicos: uma cozinha (baixo+bateria) envolvente e competente, um guitarrista diferenciado e um vocalista de destaque ― Kotzen acabou ficando com esses dois últimos postos. Em algumas rodas musicais não é de bom tom ser um grande instrumentista ― a palavra "virtuose", então, causa calafrios. Mas Kotzen não está nem aí e despeja toneladas de notas, com fraseados fluídos. E sem pisar no freio. Há ainda espaço para a ótima instrumental "Satellite", com belos acordes e gosto fusion. Para quem gosta de um rock mais tradicional, Go Faster vale ao menos uma ouvida.

Minhas músicas preferidas: "Go Faster", "Feed my head", "Fooled Again", "Can you fell it" e "Satellite".

***

Sebastian Bach ― Angel Down


Ouça um trecho de "Back in the saddle"

Sebastian Bach geralmente ganha referência como ex-Skid Row. Ultimamente como um porta voz informal sobre a situação de Chinese Democracy, do Guns N' Roses. Ou, ainda, é lembrado por sua participação no seriado Gilmore Girls. Às vezes dizem que é um gritador, pois estamos numa época em que cantores de rock ou parecem pedir licença para soltar a voz ou mantém um ar blasé para disfarçar sua falta de capacidade. Também não é levado muito a sério por seu som se aproximar do metal ― afinal, o que se pensa do estilo é um bando de cabeludos acéfalos que só grita e ouve música "pesada" e sem nexo. Obviamente não é isso, apesar de algumas pessoas abraçarem o rótulo com orgulho. O fato é que Bach é um grande vocalista e frontman, tem voz privilegiada e técnica ― sabe controlá-la ― e, como fica claro em Angel Down, sabe variar sua voz, ora gritando e sendo comedido (faixa-título, "You don't understand", "Negative Light"), ora privilegiando a leveza (a balada excessivamente adocicada, para não escrever brega, "By your side"). Angel Down não é brilhante, mas é um bom disco. Os destaques, como não podiam deixar de ser, são as músicas com participação de Axl Rose ― em um gravação oficial desde "Oh my God", do GN'R, de 1999. Na arrasa-quarteirão "(Love Is) A bitchslap" Axl fica em segundo plano, deixa Bach brilhar e dá contornos ao refrão; em "Back in the saddle", do Aerosmith, num bom "duelo" com Bach, mostra como se canta um rock. Já em "Stuck Inside" Axl compôs e canta a parte final, num outro bom duo com Bach. Quando este está só também vai muito bem, obrigado. De certa forma este disco se assemelha a Era Vulgaris do Queens Of The Stone Age, numa versão metal: sem grandes pretensões, simples e direto. E bom.

Minhas músicas preferidas: "Negative Light", "Angel Down", "Back in the saddle" e "(Love is) A bitchslap".

***

Steve Vai ― Sound Theories Vol. I & II


Ouça um trecho de "Gentle Ways"

Steve Vai foi um dos "heróis" da minha adolescência. Com o tempo, vamos apurando o senso crítico e nos aproximando da iconoclastia (ou pelo menos deveríamos). Hoje não o vejo como aquele gênio de outrora, mas não deixo de admirar boa parte de suas músicas e de seu tocar particular, com momentos brilhantes. Tem um estilo muito expressivo ― ele fala, chora, grita com a guitarra. Há quem seja mais rápido, mais técnico, mais criativo, mais arrojado, de melhor fraseado. Mas é difícil no rock quem fale por meio dela como Vai. Ele é um músico de excessos. Em certos momentos passa do bom gosto para o brega tanto em suas roupas e atuações quanto nas músicas. Talvez por ter surgido nos anos 80 e tocado com ícones de um rock mais pomposo ― como David Lee Roth e Whitesnake ― tem um lado "farofa" que às vezes extrapola. Mas faz parte de sua personalidade ― é um showman. Em Sound Theories, Vai se une a uma orquestra. No vol. 1, sua guitarra se faz presente; no 2, se ausenta. Todos os arranjos, de ambos os discos, são do guitarrista, auxiliado por Tom Trapp (eventualmente por Chris Opperman ou Bonie Janofsky). Quando está no palco, os destaques vão para "Kill the guy with the ball", esmagadora com a percussão e a formação de metais; "The God Eaters", com o destaque que merece como faixa independente (não apenas apêndice de "Kill the guy..."); "Gentle Ways", balada simples, mas bonita; "Salamanders in the sun", com contornos acentuados, mais colorida nessa versão; "I'm becoming", na qual a guitarra brilha sozinha, expressiva e, claro, a clássica "For the love of God", ainda mais grandiosa. No vol. 2, sem a guitarra de Vai, o destaque são as duas partes de "Frangelica".

Minhas músicas preferidas: "Kill the guy with the ball", "The God Eaters", "Gentle Ways", "Answers" e "Salamanders in the sun".


Rafael Fernandes
São Paulo, 21/5/2008

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