O inventário da dor de Lya Luft | Marcelo Spalding | Digestivo Cultural

busca | avançada
52329 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Pimp My Carroça realiza bazar de economia circular e mudança de Galpão
>>> Circuito Contemporâneo de Juliana Mônaco
>>> Tamanini | São Paulo, meu amor | Galeria Jacques Ardies
>>> Primeiro Palco-Revelando Talentos das Ruas, projeto levará artistas de rua a palco consagrado
>>> É gratuito: “Palco Futuro R&B” celebra os 44 anos do “Dia do Charme” em Madureira
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
Colunistas
Últimos Posts
>>> Lisboa, Mendes e Pessôa (2024)
>>> Michael Sandel sobre a vitória de Trump (2024)
>>> All-In sobre a vitória de Trump (2024)
>>> Henrique Meirelles conta sua história (2024)
>>> Mustafa Suleyman e Reid Hoffman sobre A.I. (2024)
>>> Masayoshi Son sobre inteligência artificial
>>> David Vélez, do Nubank (2024)
>>> Jordi Savall e a Sétima de Beethoven
>>> Alfredo Soares, do G4
>>> Horowitz na Casa Branca (1978)
Últimos Posts
>>> E-books para driblar a ansiedade e a solidão
>>> Livro mostra o poder e a beleza do Sagrado
>>> Conheça os mistérios que envolvem a arte tumular
>>> Ideias em Ação: guia impulsiona potencial criativo
>>> Arteterapia: livro inédito inspira autocuidado
>>> Conheça as principais teorias sociológicas
>>> "Fanzine: A Voz do Underground" chega na Amazon
>>> E-books trazem uso das IAs no teatro e na educação
>>> E-book: Inteligência Artificial nas Artes Cênicas
>>> Publicação aborda como driblar a ansiedade
Blogueiros
Mais Recentes
>>> Entrevista com Cardoso
>>> Ensino Inferior
>>> Daniel Mazini, country manager da Amazon no Brasil
>>> Samba da benção
>>> O novo GPT-4o
>>> Um olhar sobre Múcio Teixeira
>>> Entrevista com Guilherme Fiuza
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> A Associated Press contra a internet
>>> The Newspaper of the Future
Mais Recentes
>>> Sao Bernardo de Graciliano Ramos pela Record (2014)
>>> Livro Contos Maravilhosos de Andersen / Irmãos Grimm pela Coopcult (2012)
>>> Avaliação Da Aprendizagem Escolar 433 de Cipriano Carlos Luckesi pela Cortez (2006)
>>> Contos de Terráque@s de Cristiano Hoppe Navarro pela Dacasa (2006)
>>> Moderna Gramática Brasileira 433 de Celso Pedro Luft pela Globo (1978)
>>> História do Brasil de Boris Fausto pela Fde (1996)
>>> Guia prático de análise sintática 433 de Tassilo Orpheu Spalding pela Cultrix
>>> Livro Abc do Mundo Árabe de Paulo Daniel Farah; Alê Abreu pela Sm (2006)
>>> Livro Estrutura E Funcionamento Do Ensino De 1º E 2º Graus Leituras de Moysés Brejon pela Pioneira (1976)
>>> Redes E Sistemas De Comunicação De Dados de William Stallings pela Campus (2005)
>>> Livro Avós de Chema Heras pela Callis (2012)
>>> O Jardim De Badalpur de Kenizé Mourad pela Globo (2024)
>>> Reflexões Da Alma de Paiva Netto pela Elevação (2003)
>>> Livro De Olho Nas Penas de Ana Maria Machado pela Salamandra (1985)
>>> Dona Flor e Seus Dois Maridos de Jorge Amado pela Record
>>> Livro Clara Rosa Não E Nome De Flor de Paula Danziger pela Rocco (1998)
>>> Os Grandes Acontecimentos do Século XX de Nathaniel O. Abelson pela Reader's Digest (1979)
>>> Livro Essa Vida Sem Fantasmas Não Tem Graça Coleção Girassol de Lais Carr Ribeiro pela Moderna (1992)
>>> Livro Garotas Em Ação Aqui Está A Galera Da Lista Vip De Volta Em Ação de Zoey Dean pela Nova Fronteira (2006)
>>> Livro Poderosa 3 de Sergio Klein pela Fundamento (2007)
>>> Manual Prático Das Contestações Judiciais de Valdemar P. Da Luz pela Sagra Luzzatto (1998)
>>> Livro Ghosts! Mystery Theatre Level 1 de Isa Mara Lando pela Ática (1997)
>>> Ramses - A Batalha De Kadesh de Christian Jacq pela Bertrand (2024)
>>> Novo Minidicionário Escolar Espanhol - Português/Espanhol Espanhol/Português de Oscar Rojas pela Dcl (2005)
>>> Casa Das Estrelas - O Universo Contado Pelas Crianças de Javier Naranjo pela Foz (2013)
COLUNAS

Quinta-feira, 10/7/2008
O inventário da dor de Lya Luft
Marcelo Spalding
+ de 8700 Acessos
+ 5 Comentário(s)

Luft é nome extremamente conhecido e respeitado aqui no Sul. Antigamente por causa do grande gramático e professor Celso Pedro Luft; hoje muito mais por causa da carreira literária daquela que foi sua esposa e herdou seu sobrenome: Lya Luft. Lya iniciou na literatura como tradutora de inglês e alemão de grandes clássicos como Virginia Woolf e Rainer Maria Rilke e, aos 41 anos, em 1980, publicou seu primeiro romance, As parceiras. Até os anos 2000 manteve uma carreira regular, como a de tantos outros bons nomes da nossa literatura contemporânea: algum espaço na mídia, algum estudo acadêmico, grande admiração dos seus pares. Mas com Perdas e Ganhos, publicado em 2003, Lya alcançou o raríssimo posto de autora de best-sellers e tornou-se uma das mais festejadas escritoras da literatura brasileira. Para ilustrar, naquele ano passou a vender mais que Paulo Coelho.

O sucesso repentino, apesar da carreira sólida, trouxe tudo o que se sabe que trará um sucesso repentino: superexposição na mídia, mudança de rumo da sua obra, narizes torcidos. Seus pares já não achavam tão cult citar Lya, e os críticos acusavam-na de ter feito um livro de auto-ajuda, ainda que insistisse em chamá-lo de ficção. Com o tempo, Lya trocou de telefone, de e-mail, tornou-se mais reservada, virou capa de revista semanal, trocou o jornal local, Zero Hora, pela revista que a brindara com capa, procurou evitar holofotes, lançou novos títulos pela Record, livros de crônicas, poesia e até um infantil. Mas precisaria de cinco anos para que voltasse à ficção.

Esse retorno, aguardado e festejado, chega em 2008 com o volume de contos O silêncio dos amantes (Record, 2008, 160 págs.). Amplamente propagandeado aqui em Porto Alegre, tornou-se presente preferido (para quem ainda compra livros de presente) no Dia das Mães e no Dia dos Namorados, mas deve ter deixado muitos filhos, mães, maridos, esposas e namorados surpresos: não parece a mesma autora, decididamente não é o mesmo texto.

Por todo o sucesso dos livros anteriores, naturalmente abre-se o volume de contos à espera da Lya otimista de Perdas e Ganhos, de Pensar é transgredir, de suas colunas, da Lya conselheira, da Lya avó, da senhora de cabelos entre loiros e grisalhos a cantar o prazer da idade, da sabedoria, da leitura. E o que temos é exatamente o oposto: uma Lya soturna, pessimista, criando e matando personagens num ritmo trevisânico.

Amantes, em O silêncio dos amantes, há poucos, e os que existem não vivem bem, odeiam-se calados, cometem violências, vingam-se. Há muitos pais e filhos, há muitos filhos que morrem, alguns que se suicidam. Há velhos, muitos velhos, em geral dependentes, descritos para que deles tenhamos asco, e para tanto não são poupados detalhes escatológicos de uma avó numa clínica. E há, sobretudo, seres imaginários como aqueles amigos de infância que algumas crianças cultivam, seres que acompanham as personagens na vida adulta, na velhice, doces fantasmas a compartilhar segredos.

O resultado é um livro pesado, difícil de se chegar ao final, um livro que como tantos outros desde Rubem Fonseca coloca a violência nua e crua diante do leitor mas não tem nem o ritmo estético próprio desse gênero nem a ousadia existencial da Clarice de A hora da estrela. Resta a dor, apenas a dor, a dor do tempo que passa e envelhece os amantes, embrutece os justos, maltrata as gentes.

Exemplo do tom do livro é o próprio conto que dá título ao volume, "O silêncio dos amantes". Nele, a narradora, entre ressentida e resignada ― como em geral o são as mulheres dos contos ― lembra como conheceu Valentim, aquele que agora dorme ao seu lado, o acaso do primeiro encontro e narra com uma ênfase assustadora a tragédia pela qual havia passado seu agora marido:

"(...) Um assaltante arrancou [a grávida] de dentro do carro e a derrubou no chão. Pegou rapidamente bolsa, relógio e celular da moça caída na calçada, e entrou no carro. As sacolas de compra ficaram no chão, ao lado dela. Quando já estava arrancando, sem explicação, sem motivo a não ser a alucinação da droga ou a maldade mais primitiva, inclinou-se um pouco para fora, e disparou. Duas vezes, na barriga volumosa. O bebê explodiu junto com as entranhas da mãe. Naquela hora, mataram também a Valentim. (...)"

Note que a grávida não é apenas morta, ela tem suas "entranhas explodidas", e ficam o leitor, a narradora e Valentim sem explicação alguma para a brutalidade da cena, a brutalidade da narrativa. Mais do que isso, na seqüência do conto a narradora conquista o homem mas passa a conviver com o fantasma da grávida que rondaria pela casa "com olhos melancólicos e desesperados", num sinal evidente que não há espaço sequer para uma transcendentalidade; a tragédia urbana e humana marcariam em definitivo a existência daquela mulher, daquele bebê, daquela narradora. Que conclui, não por acaso, com a singela frase: "a dor faz parte".

Não é casual que este conto seja o último do livro, que esta frase seja a última do conto, conto e livro que surpreenderão a muitas leitoras, de certo afastarão outras tantas, e talvez seja exatamente essa a intenção de Lya Luft. Ou a de resgatar uma identidade como escritora, ficcionista e contista "respeitada", ainda que para isso tenha que apavorar leitores acostumados a frases como "Porque o amor, do jeito que pode ser, é o caminho da liberdade e da grandeza ― é a nossa única possibilidade de salvação" ("Um tema tão delicado", em Pensar é transgredir).

Se melhor ou pior, não cabe a um reles resenhista afirmar. O que talvez mereça reparo é que um escritor precisa ser honesto com seu público mesmo sendo ele formado por leitoras da Veja. Nesse sentido, não precisava a edição trazer o atraente e romântico título "O silêncio dos amantes" e muito menos a comercial chamada "da autora de Perdas e Ganhos". É outro livro, é quase outra autora. Uma que deve ser guardada bem longe de Paulo Coelho e bem perto de Dalton Trevisan.

Para ir além






Marcelo Spalding
Porto Alegre, 10/7/2008

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Como você aprende? de Débora Carvalho
02. George Sand faz 200 anos de Helena Vasconcelos
03. Mônica e Cebolinha na Pinacoteca do Estado de Marina Marcondes Machado


Mais Marcelo Spalding
Mais Acessadas de Marcelo Spalding em 2008
01. Burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha - 6/3/2008
02. O melhor de Dalton Trevisan - 27/3/2008
03. Nossa classe média é culturalmente pobre - 21/8/2008
04. Cartas a um jovem escritor - 31/1/2008
05. Literatura é coisa para jovem? - 11/9/2008


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
13/7/2008
19h55min
Nesse caso, acho que vou dar uma espiada no livro. Não tinha a menor intenção de o ler pelas razões que você expôs. Eu, como leitora de Dalton Trevisan, me sinto tentada a fazê-lo, embora com muita resistência. Também acho que o escritor tem direito de mudar, sim, mesmo que afaste os seus fiéis leitores, desde que seja para melhor. Parabéns pelo texto, ótima resenha.
[Leia outros Comentários de Adriana Godoy]
15/7/2008
15h41min
Muito boa a resenha, principalmente a exortação final, para que o escritor seja honesto com seu leitor, que serve também para editor e distribuidor (que sejam honestos em suas práticas comerciais...).
[Leia outros Comentários de Roberta Resende]
27/7/2008
02h20min
Esta resenha lembra os primeiros livros de ficção de Lya Luft, com densidade psicológica dos personagens, um peso que tornava difícil ler tais livros.
[Leia outros Comentários de Jose Alfredo ]
28/7/2008
11h53min
Não bastasse ser um ser humano ímpar, Lya Luft é uma escritora genial, como poucas o são no Brasil.
[Leia outros Comentários de Antonio P. Andrade]
29/7/2008
20h01min
Mais uma bela tacada da autora. Como você bem disse, Marcelo, não é por acaso que Lya mudou. Mudaram não somente a narrativa, mas as motivações e sentimentos da autora. Ao escrever "O silêncio dos amantes", da forma como fez (o leitor desavisado não entenderá a contradição entre capa e conteúdo), Lya também tenta exorcizar alguns dos fantasmas internos. Dá um "grito mudo", mas nem tão mudo, de desabafo e escancara, como que dizendo: "não sou o que pareço, me deixem em paz!".
[Leia outros Comentários de Fabiana Silvestre]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




Como Se Escreve? Morfologia
Mega Letronix
Abril



Guia Completo de Cuidados com Bebês Crianças: Capa Dura
Dra. Miriam Stoppard
Globo
(1995)



Honey The Candy Fairy
Daisymeadows
Scholasticpaperbacks
(2010)



Lula Cardoso Ayres - Revisão Crítica e Atualidade
Clarival do Prado Valladares
Rio de Janeiro
(1978)



Avareza 525
Phyllis A. Tickle
Arx
(2005)



Cozinha de Estar receitas praticas para receber - Culinaria
Rita Lobo
Paralela
(2012)



Por Tras dos Muros - Horizontes Sociais do Graffiti
Graziela Bedoian e Katia Menezes
Peirópolis
(2008)



Onze Minutos
Paulo Coelho
Rocco
(2003)
+ frete grátis



Livro Pedagogia Transgressão e Mudança na Educação Os Projetos De Trabalho
Fernando Hernandez
Artmed
(1998)



Reinventar A Escola
Vera Maria Candau
Vozes
(2024)





busca | avançada
52329 visitas/dia
1,9 milhão/mês