Por que as curitibanas não usam saia? | Adriana Baggio | Digestivo Cultural

busca | avançada
74965 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Mais Recentes
>>> Hospital Geral do Grajaú recebe orquestra em iniciativa da Associação Paulista de Medicina
>>> Beto Marden estreia solo de teatro musical inspirado em Renato Russo
>>> Tendal da Lapa recebe show de lançamento de 'Tanto', de Laylah Arruda
>>> Pimp My Carroça realiza bazar de economia circular e mudança de Galpão
>>> Circuito Contemporâneo de Juliana Mônaco
* clique para encaminhar
Mais Recentes
>>> Do lumpemproletariado ao jet set almofadinha...
>>> A Espada da Justiça, de Kleiton Ferreira
>>> Left Lovers, de Pedro Castilho: poesia-melancolia
>>> Por que não perguntei antes ao CatPt?
>>> Marcelo Mirisola e o açougue virtual do Tinder
>>> A pulsão Oblómov
>>> O Big Brother e a legião de Trumans
>>> Garganta profunda_Dusty Springfield
>>> Susan Sontag em carne e osso
>>> Todas as artes: Jardel Dias Cavalcanti
Colunistas
Últimos Posts
>>> Lisboa, Mendes e Pessôa (2024)
>>> Michael Sandel sobre a vitória de Trump (2024)
>>> All-In sobre a vitória de Trump (2024)
>>> Henrique Meirelles conta sua história (2024)
>>> Mustafa Suleyman e Reid Hoffman sobre A.I. (2024)
>>> Masayoshi Son sobre inteligência artificial
>>> David Vélez, do Nubank (2024)
>>> Jordi Savall e a Sétima de Beethoven
>>> Alfredo Soares, do G4
>>> Horowitz na Casa Branca (1978)
Últimos Posts
>>> Escritor resgata a história da Cultura Popular
>>> Arte Urbana ganha guia prático na Amazon
>>> E-books para driblar a ansiedade e a solidão
>>> Livro mostra o poder e a beleza do Sagrado
>>> Conheça os mistérios que envolvem a arte tumular
>>> Ideias em Ação: guia impulsiona potencial criativo
>>> Arteterapia: livro inédito inspira autocuidado
>>> Conheça as principais teorias sociológicas
>>> "Fanzine: A Voz do Underground" chega na Amazon
>>> E-books trazem uso das IAs no teatro e na educação
Blogueiros
Mais Recentes
>>> De cima da goiabeira
>>> Jimi Hendrix encontra o Deep Purple
>>> Internet & Ensino, de Júlio César Araújo
>>> Laymert politizando novas tecnologias
>>> Quem sabe eu ainda sou uma garotinha
>>> Gabeira sobre os protestos
>>> A Symphonia da Metropole
>>> Bar ruim é lindo, bicho
>>> A crise dos 28
>>> Animismo
Mais Recentes
>>> Estorias dos sofrimentos, morte e ressurreição do senhor jesus cristo na pintura de emeric marcier de Affonso Romano de San'anna pela Edições Pinakotheke (1983)
>>> Coleção com 3 livros: Piadas De Boteco + Piadas de escritório + Piadas (muito) Bobas de Pepe Borrachov. Aníbal Litvin pela Vergara & Riba
>>> Kit com 2 livros: Lidere Sua Mente + Autocontrole de Augusto Cury pela Gold (2015)
>>> Laços (5ª reimpressão) de Domenico Starnone pela Todavia (2019)
>>> Apollinaire par lui meme (ecrivains De Toujours) de Pascal Pia pela Editions Du Seuil (1954)
>>> Old Man and the Sea de Ernest Hemingway pela Jonathan Cape (1955)
>>> A Essência do Talmud de Theodore M. r. Von Keler pela Ediouro
>>> O Pum E O Piriri Do Vizinho (5º reimpressão) de Blandina Franco - Jose Carlos Lollo pela Companhia Das Letrinhas (2020)
>>> South Africa 2010 Fifa World Cup - Livro Ilustrado Completo de Varios autores pela Panini (2005)
>>> No tempo dos Bandeirantes de Belmonte pela Melhoramentos (1948)
>>> Magia Do Verbo Ou O Poder Das Letras de Jorge Adoum pela Pensamento (1985)
>>> A Grande Fraternidade Branca e os Dirigentes Invisíveis de Kenneth w. Bourton pela Maya (1997)
>>> Academia Paulista de Letras - cadeira número cinco de Ignacio da Silvia Telles/ Paulo Bomfim pela Quatro (1991)
>>> A Varinha Mágica. Como Fazer de Ed Masessa pela Moderna (2007)
>>> Educação De Um Kabalista (2º edição) de Rav Berg pela Kabbalah (2015)
>>> Timequake. Tremor De Tempo de Kurt Vonnegut pela Rocco (1999)
>>> Através Do Espelho de Jostein Gaarder pela Companhia Das Letras (2000)
>>> Através Do Espelho de Jostein Gaarder pela Companhia Das Letras (2000)
>>> Através Do Espelho de Jostein Gaarder pela Companhia Das Letras (2000)
>>> Garota Das Laranjas, A de Jostein Gaarder pela Companhia das Letras (2012)
>>> Garota Das Laranjas, A de Jostein Gaarder pela Companhia das Letras (2012)
>>> O Alienista de Machado De Assis pela Penguin Books - Grupo Cia Das Letras (2014)
>>> Batman: Trilogia Do Demônio (Edição de luxo) de Jerry Bingham pela Panini (2024)
>>> Oliver Stone: Close Up: The Making Of His Movies de Chris Salewicz pela Thunder's Mouth Press (1998)
>>> O Mistério Do Cinco Estrelas de Marcos Rey pela Global (2005)
COLUNAS

Terça-feira, 22/2/2011
Por que as curitibanas não usam saia?
Adriana Baggio
+ de 16700 Acessos
+ 5 Comentário(s)

Andando na rua neste verão curitibano, o marido observa: as mulheres desta cidade não usam saia.

Ele não é daqui, sempre morou em lugares quentes, de comportamento mais expansivo. Apesar de seus sete anos de Curitiba, ainda lhe escapam algumas nuances do jeitinho curitibano de ser (ou, quando querem dizer que somos uns esnobes metidos à besta, "jeitinho curitiboca de ser").

Tento encontrar uma explicação para a questão das saias: Curitiba é uma cidade de clima esquizofrênico. Já virou lugar-comum dizer que aqui as quatro estações acontecem no mesmo dia. E é verdade, pode acreditar. Sabe essa tendência de sobreposição, de cardigãs e casaquinhos? Aqui sempre foi moda. Nunca dá para vestir uma peça única. Você usa várias, das mais frescas às mais quentes, para ir tirando ou colocando conforme o humor do clima. Com a parte de cima essa flexibilidade funciona bem. E com a parte de baixo? Esse é um dos motivos pelos quais evitamos saias (eu acho).

Imagine uma moça que mora em um bairro distante, trabalha no centro durante o dia, estuda à noite e usa transporte coletivo. Ela sai de casa bem cedo, quando ainda está friozinho, e volta com a mesma temperatura. Por mais que no almoço passe um calorão, se colocar saia vai passar frio nos extremos do dia. E se chover, vai ficar com a perna melada por causa das pedras soltas da calçada.

Não fiz uma pesquisa séria sobre isso, mas acredito que é mais fácil encontrar curitibanas de saia entre as de maior poder aquisitivo. Mulheres que podem ir trabalhar de carro, que não andam pelas ruas no meio do dia, sujeitas às intempéries. Ou aquelas que saem de casa quando o tempo já se decidiu e voltam antes que ele mude de ideia, o que até permite um figurino fixo.

A culpa não é só do clima
Talvez essas explicações sejam frágeis. Independente do poder aquisitivo, o fato é que a mulher curitibana é reservada, conservadora, pudica (ou metida, como querem alguns). Mostrar as pernas é um sinal de personalidade, ousadia. Quando uma mulher vai trabalhar de saia, é um acontecimento. As colegas vão dizer que ela está linda vestida assim de mulherzinha. Os homens vão ficar babando, mesmo que a peça só mostre o tornozelo. Ela vai ter que estar pronta para ser o centro das atenções e dos comentários, o que muitas curitibanas não gostam.

Vejam que o problema com a saia não é o comprimento (apesar de os modelos longos fazerem o maior sucesso por aqui). A saia, em si, é uma roupa emblemática. Ela é fácil de ser tirada, diferente da calça. Usar saia exige maior atenção na hora de andar, de sentar, de se abaixar, de andar de ônibus. A mulher de saia, de alguma forma, está mais tolhida em seus movimentos. Uma saia, em resumo, torna o corpo mais acessível. E é aí que reside o problema de interpretação: um corpo mais acessível não é um corpo que quer ser acessado, apesar de muita gente não saber a diferença.

Por conta de toda essa carga de significados, as saias são símbolo do movimento Toutes en Jupes, que incentiva o uso desta peça no 25 de novembro, dia internacional de luta contra as violências feitas às mulheres. Na essência do movimento, a mensagem é que uma mulher tem o direito de usar saia, do comprimento que desejar, sem se sentir vulnerável, sem ser vista como prostituta e sem que as pessoas acreditem que ela "está pedindo".

Evidentemente, na maior parte das vezes usamos saias não por motivos políticos ou ideológicos. Usamos porque é feminino, porque é bonito, para mostrar nossas pernas tão raramente bronzeadas, porque é mais confortável, porque é muito mais indulgente do que as calças com os diversos tipos de silhuetas. Porém, as mulheres curitibanas talvez se beneficiem menos da versatilidade das saias por conta de um conservadorismo social arraigado, que pode até não ser mais realidade, mas que ainda pauta nosso comportamento.

Revista Nova apresenta: a mulher curitibana na década de 1980
Certo dia, durante uma aula no curso de Comunicação, alunas minhas (nenhuma delas de saia) apareceram com um exemplar da revista Nova de 1982 (ainda nem tinham nascido...). Surpreendentemente, encontro uma reportagem preciosa: "A mulher em Curitiba: a cidade é conservadora, elas não" (veja aqui em PDF), assinada pela jornalista Télia Negrão, que hoje (descubro pelo Google) é secretária-executiva da Rede Feminista de Saúde.

Télia começa apresentando à leitora o cenário de uma Curitiba cheia de contrastes: moderna, já com um milhão de habitantes, modelo de urbanismo e transporte coletivo, atraindo migrantes de todo país, mas ainda conservadora e opressora em relação às mulheres, talvez por conta da forte influência cultural dos imigrantes europeus que ajudaram a formá-la na segunda metade do século XIX.

A jornalista, com conhecimento de causa (morou no Paraná até 1991, depois foi para Porto Alegre), revela: "o comportamento do curitibano, geralmente fechado, retraído, de poucos e íntimos amigos, também é encontrado nas mulheres". Seria culpa do frio, da imigração polonesa e alemã, de algum determinismo histórico, geográfico ou cultural? Não importa. Seja qual for o status quo deste início da década de 1980, as curitibanas parecem estar tentando mudá-lo.

Uma luta! Vejo que há 30 anos, a Boca Maldita onde hoje circulo livremente e tomo cafezinho (de saia ou de calça) era um reduto exclusivamente masculino, cuja confraria (formada por ilustres figuras casadas da cidade) promovia desfile de prostitutas no carnaval.

Neste contexto, Télia apresenta diversas personagens: uma adolescente de 15 anos que abandona os estudos e vai trabalhar para ganhar seu dinheiro e ter mais voz dentro de casa; a psicóloga que procurou várias imobiliárias mas nenhuma queria alugar apartamento porque iam morar nele três mulheres sozinhas; a jornalista de um programa de televisão feminino que recebe denúncias de mulheres espancadas pelos maridos; uma secretária de 24 anos que decide morar com o namorado e, por isso, é hostilizada pelas vizinhas.

A matéria traz ainda o depoimento de figuras públicas, como a administradora de empresas Fani Lerner, então primeira-dama do município, falecida em 2009, e da diretora-executiva da Fundação Cultural de Curitiba na época, Lúcia Camargo, cuja fala encerra a reportagem: "Mas quando lhe perguntam 'como chegar lá' [já que ocupa um cargo importante], ela responde: 'Estou aqui porque não encontraram nenhum homem'".

Voltando às saias
Difícil encontrar um retrato tão vívido sobre as mulheres curitibanas de três décadas atrás, quando eu ainda estava na escola (e não usava saia nos dias de calor, preferia shorts). Evidente que a situação mudou, pelo menos em alguns aspectos. O que me parece é que o conservadorismo social citado por Télia no início da reportagem ainda tem seus ecos nos dias de hoje. Não são regras, não é nada muito específico. Mesmo que a população curitibana já esteja bastante miscigenada, é um jeito de ser e de se comportar que ainda permeia o modo de vida em nossa cidade.

O folclore diz que curitibano, por exemplo, não conversa com estranhos e não dá bom dia no elevador. O que muitos interpretam como antipatia ou frieza é, na verdade, um profundo respeito pelo outro, pela sua privacidade. É um receio de incomodar, de ser inconveniente, uma preocupação que vem lá dos nossos antepassados europeus, camponeses pés-rapados fechados em suas colônias, com medo desta terra desconhecida. Claro que não faz mais sentido, não tem mais razão nos dias de hoje. Mesmo assim, o hábito está arraigado, permanece.

O mesmo acontece com as mulheres. Não há mais motivo para tanto conservadorismo e pudicícia. Mas aprendemos assim, e acho que assim permaneceremos por um bom tempo: sem usar saias, andando sérias pelas ruas, com pouco senso de humor, fazendo com que pensem que somos frias, antipáticas e curitibocas. Se observar com atenção, vai ver que isso, no fundo, é apenas simples timidez.

Nota da autora
Quer saber como fazer amigos ou arranjar namorado ou namorada em Curitiba? Leia com atenção este manual.


Adriana Baggio
Curitiba, 22/2/2011

Quem leu este, também leu esse(s):
01. Um conto-resenha anacrônico de Cassionei Niches Petry
02. Meu malvado favorito de Renato Alessandro dos Santos
03. Sabemos pensar o diferente? de Guilherme Carvalhal
04. O To be or not to be do escritor de Fernando Lago
05. Espírito Olímpico ou de porco? de Verônica Mambrini


Mais Adriana Baggio
Mais Acessadas de Adriana Baggio em 2011
01. E você, já disse 'não' hoje? - 19/10/2011
02. Bombril: a marca que não evoluiu com as mulheres - 10/5/2011
03. Por que as curitibanas não usam saia? - 22/2/2011
04. The Good Wife visita Private Practice - 31/8/2011
05. Moda em 20 textos - 1/8/2011


* esta seção é livre, não refletindo necessariamente a opinião do site

ENVIAR POR E-MAIL
E-mail:
Observações:
COMENTÁRIO(S) DOS LEITORES
23/2/2011
16h33min
Moro em Curitiba e amo saias/vestidos, mas só uso nos fins de semana! E é bem isso, durante a semana: saio de casa às 7h e só volto para casa lá pelas 22h. Ando de ônibus, cruzo a cidade umas 3 vezes... você acaba perdendo até o charme! Mas, no fim de semana, para pegar um cinema com o namorado (de carro!), aí, sim, de saia e vestidinho (e salto alto)!
[Leia outros Comentários de Gisele ]
23/2/2011
22h49min
Eu sou curitibana e adoro saias, mas evito usá-las por um simples motivo: velhos tarados na rua. Por mais que a sua saia vá até o pé, eles continuam te comendo com os olhos e te chamando de princesa... Então, evito. Uso mais quando estou com meu namorado, aí é ele quem se incomoda com olhares indiscretos, e não eu! XD
[Leia outros Comentários de Tassi]
3/3/2011
17h54min
Não querendo defender os velhos tarados, mas para eles tanto faz se as mulheres estão de saias ou calças, importa que são mulheres, e eles, homens. O resto é a atávica necessidade de demonstrar que estão vivos!
[Leia outros Comentários de José Frid]
26/10/2011
17h24min
Como boa nordestina que sou, cheguei em Curitiba de posse dos meus shortinhos, saias, vestidinhos e logo senti a hostilidade do povo quando usava. Era incrível, os rapazes obviamente não reclamavam, mas as caras que as meninas faziam! Nossa, era constrangedor. Usar essas roupas aqui é um reflexo de personalidade forte! Como tenho, uso, com moderação, mas uso! Excelente texto!
[Leia outros Comentários de Savina Martins]
26/10/2011
18h40min
Olá Savina, bom saber da sua experiência. Que bom que você continua usando, mesmo com o frio do clima e dos olhares. A saia é nossa!
[Leia outros Comentários de Adriana]
COMENTE ESTE TEXTO
Nome:
E-mail:
Blog/Twitter:
* o Digestivo Cultural se reserva o direito de ignorar Comentários que se utilizem de linguagem chula, difamatória ou ilegal;

** mensagens com tamanho superior a 1000 toques, sem identificação ou postadas por e-mails inválidos serão igualmente descartadas;

*** tampouco serão admitidos os 10 tipos de Comentador de Forum.




Digestivo Cultural
Histórico
Quem faz

Conteúdo
Quer publicar no site?
Quer sugerir uma pauta?

Comercial
Quer anunciar no site?
Quer vender pelo site?

Newsletter | Disparo
* Twitter e Facebook
LIVROS




A Casa Flutuante
Dale Peck
Planeta
(2005)



Biologia Molecular do Gene - 5ª Edição
Watson; Baker; Bell; Gann; Levine; Losick
Artmed



Teoria Econômica A. W. Stonier & D. C. Hague
A. W. Stonier & D. C. Hague
Zahar Editores
(1959)



Livro Docência, Memória E Gênero
Denice Barbara Catani; Outros
Escrituras
(1997)



As Seis Pontas da Estrela
Zevi Ghivelder
Arx
(2003)



No Chão do Peito
Wanduci Ilário da Costa
N/d



Você a alma do negócio
Roberto Shinyashiki
Gente
(2001)



Gestão Ambiental - Instrumentos, Esferas de Ação e Educação Ambiental
Mari Elizabete Bernardini Seifert
Gen Atlas
(2018)



Olívio E Pingo
Freedman
Duna Dueto
(2015)



Arte é infância Mari Miró e o príncipe negro 376
Vivian Caroline Lopes
Ciranda Cultural
(2014)





busca | avançada
74965 visitas/dia
1,9 milhão/mês