Personagens secundários em séries | Rafael Fernandes | Digestivo Cultural

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Segunda-feira, 5/9/2011
Personagens secundários em séries
Rafael Fernandes
+ de 4400 Acessos

As séries americanas têm sido meu passatempo preferido quando quero esvaziar a cabeça. Por serem exibidas uma vez por semana, não precisamos "fechar" a agenda da semana toda com TV. A não ser que você seja um maníaco por série ― o que já não é mais o meu caso. As sitcoms de meia hora ainda têm mais duas vantagens: pouco tempo em frente à tela e a possibilidade de deixar de ver alguns episódios sem grandes perdas de contexto.

É difícil definir o que faz uma série alcançar sucesso. Mas uma coisa é certa: nenhuma sobrevive apenas de seus personagens principais. Eles precisam de suportes de apelo para se manterem. Podem ser mais ou menos importantes, mas precisam estar lá. Alguns deles até roubam as cenas, muitas vezes. Se uma lista de séries favoritas já leva a muitas discussões, imagine personagens ― e secundários, ainda! Mesmo assim, segue a lista de alguns dos meus preferidos.

Frank Costanza (Jerry Stiller) ― Seinfeld
Os personagens secundários de Seinfeld são um show à parte. Dos mais constantes, como o Soup Nazi, aos que aparecem em apenas um episódio são todos impagáveis. Mas meu preferido é Frank Costanza, pai de George. Com suas conversas aos berros com sua esposa, seu ar eternamente ranzinza e suas tiradas secas, o pai de Ben Stiler rouba as cenas. Fez tanto sucesso que foi fixo da série The King Of Queens, com um personagem parecido, mas um pouco menos ranzinza e histérico. Mas continuou hilário.

Wayne (Jason Hervey) ― Anos Incríveis
Anos Incríveis foi uma das melhores séries de TV já feitas. Ninguém conseguiu transmitir tão bem os dramas da adolescência com tanta elegância. Nem com tanto afeto. Na família dos Arnold, Wayne era quase um desprezado: Kevin era o caçula bonzinho; Karen, embora rebelde, era a xodó. Ele ficava meio no limbo. Em quase toda a série tendíamos a achá-lo irritante. Mas nos momentos em que baixava a guarda, era sempre comovente. Por outro lado, era um bom contraponto ao bom-mocismo meio mala de Kevin Arnold. No final da série, Wayne acabou premiado com uma justa redenção.

Berta (Conchata Ferrell) ― Two And A Half Men
Mais falada recentemente pela cansativa polêmica em torno da demisssão de Charlie Sheen, Two And A Half Men é uma série de texto ágil e politicamente incorreto. E sem compromisso com a elegância. Se vale muito das tais "piadas de banheiro", como diria Woody Allen, sem nenhum pudor. A (antiga) trinca de Charlie, Alan e Jake conseguiu uma sintonia rara. E para apimentar ainda mais a relação, tem a Berta. Supostamente ela deveria cuidar da casa, mas com sua mistura de insolência, sarcasmo e mau humor acabou se tornando uma peça importante. Ela dá uma aliviada na exposição dos personagens principais, mas sem perder o ritmo e a pegada da série.

Chang (Ken Jeong) ― Community
Community é uma das boas comédias no ar. Tem um formato e uma trama não muito usuais: seis pessoas de diferentes formações e necessidades se encontram numa faculdade comunitária. Chevy Chase está ótimo e há outros personagens muito bons. Mas Chang rouba as cenas. Ken Jeong, o ator, ficou mais conhecido com o filme Se beber, não case. Em Community, começou como um professor de espanhol (!) irritadiço e sem noção. Foi tão bem que sua participação foi aumentando e já é frequente nos episódios. É um daqueles personagens quase insuportáveis, sem qualidades, mas exatamente por isso tão engraçados.

Buddy Garrity (Brad Leland) ― Friday Night Lights
Friday Night Lights foi uma das melhores séries de temática adolescente dos últimos anos. Apesar da câmera sempre em movimento irritar às vezes, não havia aquela babaquice típica das séries blockbusters do gênero. Os temas eram mais sérios e não sobre festas e fofocas. O texto e atuações, exceções à parte, prezavam pela sobriedade. E durante todas as temporadas, Kyle Chandler, no personagem central, teve atuação impecável. Personificou o treinador como um cara ético, de fibra, justo, mas nem por isso sem falhas. Ainda assim, ele precisava de um contraponto, que ficou a cargo do ótimo Buddy Garrity. Diferente do Coach Taylor, Garrity estava sempre pronto para a politicagem, para manobras de convencimento, para algum pequeno esquema que o beneficiaria ― sempre no limite da ética. Enquanto o treinador era sério, Buddy pendia para o lado fanfarrão. No fim das contas, um precisava do outro.

Hurley (Jorge Garcia) ― Lost
Jack e Sawyer, embora falhos, eram os galãs; antagonistas que disputavam a liderança do grupo. E, claro, a mulherada. Hurley foi construindo seu lugar na série e, principalmente, entre os fãs, até se tornar uma peça importante. Muitas vezes foi um alívio em relação ao excesso de rancor dos outros personagens. Não chegou ao nível de atuação retumbante de um Ben Linus (Michael Emerson) ou de um John Locke (Terry O'Quinn). Mas conseguiu se firmar e, no fim, foi um dos pilares da série.

Pacey (Joshua Jackson) ― Dawnson's Creek
Confesso que hoje é risível assistir Dawson's Creek. Mas um dia fez algum sentido. Vamos ser sinceros: Dawson foi sempre um mauricinho babaca e Joey, irritante. Pacey Whiter era o alívio ideal: mais espirituoso, esperto, sempre disposto a ajudar e, principalmente, não precisava ficar analisando suas neuras até a última gota de auto-indulgência. Hoje, Joshua Jackson faz parte do cast da ótima Fringe, com outro bom personagem, Peter Bishop. O único problema é que parece uma versão mais velha Pacey ― ou teria sido uma "proposital coincidência"?

Phil Stubbs (Michael Ian Black) ― Ed
Ed foi uma boa comédia, com diálogos rápidos e boas sacadas. Contava a história de um advogado de sucesso em Nova Iorque, que depois de ser demitido e traído por sua mulher (com um carteiro), volta à sua cidade natal e compra um boliche. Começa a defender pequenos casos da cidadezinha e, claro, tentar conquistar a paixão da adolescência. No meio de muitos bons personagens (Shirley, Warren Cheswick e Dr. Jerome), destacava-se Phil Stubbs. Era um personagem oito ou oitenta: ou se adorava, ou se odiava. Responsável por boa parte do nonsense da série, estava sempre à beira da alopração, mas raramente chegando lá.

Dr. Harold Abott (Tom Amandes) ― Everwood
Everwood nunca foi uma grande série. Não à toa, num quadro do Saturday Night Live, um personagem foi convencido a fazer algo que não queria sob pena de tortura de ter que passar um dia inteiro vendo a série. Mas tinha seus bons momentos e muitos deles com Dr. Harold Abott. A série girava em torno do ególatra Dr. Andy Brown e sua famíla. Mas o equilíbrio quem dava era Dr. Abott. Um homem sem grande destaques profissionais, diferente do geniozinho que era o protagonista Dr. Brown. Mas compensava com caráter e generosidade. Era um personagem de incoerências mais realistas. Dr. Abott trazia boas doses de bom e mau humor, ternura e antipatia sem exagerar para nenhum dos lados.


Rafael Fernandes
Araçoiaba da Serra, 5/9/2011

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