Fui assistir com alguns amigos o filme “Surf Adventures". Antes de iniciar qualquer crítica ou comentário sobre o mesmo, coloco aqui uma questão: porque o título em inglês? Tudo bem que o filme é a versão para as telinhas do programa homônimo da SporTV, e segue basicamente o modus operandi do tal. Subliminarmente, porém, fica incutida a teoria, defendida por colonizados de diversas áreas, de que “tudo que vem de fora é mais bonito” – o que realmente, e infelizmente nesse caso, acaba por transbordar (com perdão da palavra) na telona.
As melhores ondas do filme são protagonizadas pelos astros do surfe estranhos ao sul do oceano pacífico, como Bruce Irons, Shane Dorian, Kelly Slater... deixando mais tristemente evidentes as deficiências dos filhos da pátria dentro d’água: desde as capengadas de Andrea Lopez em Noronha até os brazilian-barrels, onde o surfista nordestino Aldemar Calunga não passa da portinha de backdoor no Havaí. Mas esse é um aspecto do Brasil, e de seu desenvolvimento no cenário do surfe mundial, nada tem a ver com o filme de Arthur Fontes em si.
Vamos à obra.
Em relação à produção, não ficamos devendo nada aos lendários (e não legendários) Endless Summer I e II, de Bruce Brown. Pelo contrário. Sendo “Surf Adventures" um documentário de surfe, a abordagem de Arthur Fontes para as locações, o estilo de vida e a personalidade do surfista são bem mais sóbrias e dignas da tela grande do que as trapalhadas tipo pastelão de Pat O`Conell e Wingnut ao redor do mundo em Endless Summer.
Se bem que é possível usar esse mesmo argumento numa interessante virada de mesa: se a idéia fosse mostrar o “surfista brasileiro”, como é feito no pretensamente sério Surf Adventures, o melhor seria que colocar os protagonistas para encenar esquetes engraçadinhos. Afinal, seus parcos conhecimentos e suas precarias noções da vida denigrem bastante a imagem do suposto “surfista tupiniquim”.
Optando por não usar uma narração única (em off), como nos filmes de surfe tradicional (onde o objetivo é frisar a ação), Arthur Fontes deixou em maus lençóis os escolhidos para apresentar as localidades paradisíacas (não exploradas devidamente e, sim, apenas “surfisticamente”). Os conflitos políticos, a degradação dos paraísos ecológicos, os cenários deslumbrantes transformados em base para testes de mísseis nucleares, etc. – são propositalmente deixados de fora. O que contribui, e muito, para o velho preconceito de que “todo surfista é alienado, burro e vagabundo” (ainda que publicações jornalísticas, como a Trip, vivam de tentar provar o contrário).
Excetuando-se as narrações humorísticas de Danilo Grilo, sobre as desventuras da equipe na Indonésia (deixando de lado sublevações contra a dinastia Suharto, que ocorreram nesse mesmo tempo), a ação e narração se concentram no que se passa dentro d`água.
O filme tem, claro, muitas qualidades. As imagens são fantásticas. O que é um mérito. Pois, apesar da extensão da costa brasileira, é muito rara a oportunidade de se ver o surfe na telona, e em película. Entre os aficcionados, no entanto, Surf Adventures não atinge ainda o status de cult (daqueles que se assiste até gastar).
Por outro lado, Surf Adventures fica num impasse – já que, como documentário, não atinge o público leigo (o que, imagina-se, seria o outro objetivo de uma produção como essa).
Sendo assim, o filme termina em cima do muro. Quem surfa, sai do cinema achando que o filme é bom, mas que o surfe mesmo é meio fraco (não dá pra assistir uma segunda vez). Já quem não surfa, sai do cinema achando que o documentário é interessante, mas que como todo filme de surfe só interessa aos surfistas.