Sempre me perguntei, desde o início de minha caminhada profissional, o que garante o sucesso de um espetáculo teatral. Não falo simplesmente de uma casa cheia, mas, sim, de um espetáculo que comunica, toca e transforma o espectador. Seria uma boa história para contar? A maneira de contar? A atuação, a iluminação, a cenografia, a sonoplastia? Na verdade, a soma de tudo com certeza, contribui para um bom resultado. Porém, não garante o sucesso.
Muitas vezes assistimos alguma peça e não sabemos porque não somos convencidos daquilo que nos é apresentado. Outras, saímos à busca de entretenimento e somos surpreendidos com uma grande reflexão sobre nossas vidas. Neste momento, a mágica do teatro se faz. A troca entre o ator e o espectador é o ponto de partida para a catarse.
Uma caixa preta, uma boa história para contar e uma surpreendente e tocante atuação. Isto ainda é possível! Assim aconteceu com a peça "Novas Diretrizes em Tempos de Paz". Texto de Bosco Brasil, com direção de Ariela Goldmann, traz no elenco Dan Stulbach e Jairo Mattos. Imagine uma sala com uma mesa, duas cadeiras e dois atores. Pouco? Na verdade, neste caso, muito. Um polonês, Clausewistz (Dan Stulbach) fugindo da Europa, no fim da Segunda Guerra, vem para o Brasil para tentar uma nova vida. Para sua decepção, os problemas começam logo na sala da imigração onde um Segismundo, ex-torturador (Jairo Mattos) irá decidir o seu destino. O recém chegado que se diz agricultor, é, na verdade, um ex-ator, que já não sabe mais se há espaço para o Teatro no mundo. Porém, ao convencer o agente da imigração de sua história, convence a si mesmo de sua vocação.
O espetáculo que é bem "intimista", até em função do espaço físico, coloca os atores cara a cara com o público, arrebatado por uma interpretação impecável. Sem se apegar a trejeitos ou sotaques forçados, temos um dos melhores espetáculos que estiveram em São Paulo nos últimos meses. É incrível que as pessoas ainda não tenham percebido que não é com tecnologia, efeitos especiais, um cenário grandioso e uma multidão de corpos em cena que se faz uma grande obra de arte.
"Novas Diretrizes" é a prova concreta de que para um bom espetáculo é necessário, acima de tudo, uma boa matéria-prima: o ator. Mesmo que este esteja pautado em cima da simplicidade cênica. São palavras bem ditas, emoções e pausas. Tudo que é relativo a questões ceno-técnicas de uma peça teatral, como já disse, vêm sem dúvida acrescentar muito - mas não substituem o material humano. Ainda que uma peça possa trazer belas imagens, pode não ser capaz de transformar ou questionar o espectador.
(A peça citada é de grande sucesso, ao menos artístico. Isso porque, infelizmente, nem todos espectadores buscam no teatro algo mais que o entretenimento chulo do "besteirol". Enquanto algumas casas estão cheias com quatrocentas, quinhentas pessoas para assistir a um espetáculo que não acrescenta nada, foi triste estar no teatro Ágora e assistir a esta obra-de-arte ao lado de apenas vinte espectadores. É frustrante, e mais que isso, é uma lástima que o grande público fique distante de um grande espetáculo.)
Temos, então, o problema dessa equação artística. Voltando ao início, o sucesso é muito relativo. A essência do bom espetáculo, o material humano, não garante o sucesso material, a presença do grande público. Por outro lado, o grande público não é garantia da qualidade artística de um espetáculo. Como sair deste impasse? Até quando uma coisa implicará na outra? Porque é tão difícil unir um bom conteúdo a uma boa bilheteria? Que esta fórmula secreta possa ser desvendada a tempo de garantir a sobrevivência do bom teatro.
Adorei o texto. As colocações da autora foram tão vívidas que deu vontade de assistir a peça! Quanto à "fórmula secreta", não tenho a receita, mas com certeza a situação reflete gerações ligadas na "telinha", sem ter tido a oportunidade de, como eu, presenciar grandes espetáculos teatrais outrora presentes semanalmente na TV (ah, saudosa Tupi!). Os leitores com mais de 40 anos saberão a que me refiro. Os mais novos, deculpem-me, porém, citando Chico Buarque, "quem não a conhece não pode mais ver para crer", isto é, quem viu, certamente se lembra e quem não viu, não mais terá esse prazer, infelizmente.