Pequeno roteiro de aquisição (ou não) de CDs de Nova Bossa Nova:
Bossa Cuca Nova Revisited Classics
Alexandre Moreira, Marcelinho Dalua e Mário Menescal editaram, mixaram e masterizaram este disco absurdamente delicioso - desde a escolha de repertório, músicos, músicas e intérpretes, foi tudo de bom - para quem chapa em discos com tratamentos musicais diferenciados, no encarte a recomendação: "OUÇA NA PRESSÃO!!!" e ainda a observação: "Escute com fone de ouvidos, isto vai expandir sua mente". Realmente. Repertório abarrotado de clássicos da Bossa Nova com tratamento de mixagem digital-acústica. Na sessão cantores, Carlos Lyra comparece em duas faixas, "Maria Moita" e "Influência do Jazz", arranjos deliciosamente sofisticados, Sylvio Cesar comparece brilhantemente em "Consolação" (sim, é aquele mesmo Silvio Cesar que cantava a mela cueca "pra voce eu guardei, o amor mais bonito...", só que em "Consolação" ele bota pra quebrar, zero de lamúria). Na sessão grupos, dominio total d'Os Cariocas que também comparecem em duas: "Berimbau" e "Só Danço Samba". O quesito cantoras é mais variado, começa com a mãe do Bena Lobo, Wanda Sá, arrasando meu coração em "Meditação", depois é a vez de Astrid com a incisiva "Vai de Vez", Chris Dellano em "Se Todos Fossem Iguais A Voce" retirou toda a babação de ovo que sugeriam as versões anteriores desta música. Claudia Telles está trip hop em "Samba de Uma Nota Só". O disco ainda tem uma versão instrumental para "O Barquinho" com o pai Mário, ninguém menos que, putz, Roberto Menescal, aquele mesmo que resolveu tocar tudo igualzinho a "O Barquinho".
Bossa Cuca Nova & Roberto Menescal: Brasilidade
Acabou-se o que era doce, Roberto Menescal vislumbra o Bossa Cuca Nova como mais um empreendimento musical para ele agenciar no Japão, Estados Unidos e Europa. Sua participação neste último disco dos meninos do BCN tranformou-os em mais um pastiche da indústria de intenções mercadológicas internacionais de Roberto Menescal, que em tempos idos era um bom músico mas alucinou geral pela fissura e carência de outros povos por produtos musicais da era Bossa Nova, que de genêro passou à condição de repertório - então, o que era para ser mais um disco do Bossa Cuca Nova resultou em mais um disco do Roberto Menescal com edição, mixagem e masterização da moçada do BCN. Eu não tenho mais paciência para ouvir Roberto Menescal arranjando e tocando invariável e infinitamente do mesmo jeito, sempre compro meus discos (este ganhei, se fosse para comprar não comprava de jeito nenhum e só recomendo a compra para quem gosta de muzak). As músicas são todas instrumentais, exceto "Rio" com Chris Dellano e "Garota de Ipanema" por Ed Motta, que é outro que já estou bem enjoado de seus malabarismos vocais. "Rio" com Chris Dellano é a única super bacana, no disco ainda tem "Nana", "Surfboard" e "Bye Bye Brasil", que são músicas super legais em suas gravações originais, mas que não escaparam à pasteurização do tipo exportação por Roberto Menescal (afê é pouco). Tome muito cuidado na hora de comprar, disco bacanérrimo do Bossa Cuca Nova é o "Revisited Classics", o que tem um fusca conversivel na foto de capa, a arapuca "Brasilidade" é muito mais fácil em ser encontrada por que é o mais recente. Fuja de "Brasilidade" e abrace afetuosamente "Revisited Classics". (Aviso por que a critica especializada em música foi só elogio; para o primeiro disco foram corretos os elogios, para o segundo foram hiper dimensionados.)
Celso Fonseca & Ronaldo Bastos: Juventude/Slow Motion Bossa Nova
Talento, bom gosto e musicalidade é o que sobra para esta dupla de compositores/arranjadores. Este não é um disco para se ouvir na pressão: introduza em your CD-player e vá escrever ou responder alguns e-mails, a sonoridade vai te pegar aos poucos; se não rolar empatia total na primeira audição, repita a operação escrever/responder e-mails que, desta segunda audição, tú não escaparás. Trata-se de um disco arrebatador de cabo a rabo, o que de melhor ouví em criação de Bossa Nova pós-Bossa Nova. Se espera ouvir temas já gravados do repertório pode ir tirando o cavalinho da chuva, porque aqui quase tudo é inédito; só não é um trecho incidental de "A Voz do Morro" (Zé Keti), incluido na música "La Piu Bella Del Mondo" e "O Que Restou de Nosso Amor" ("Que rest-t-il de nous amours", gravada por João Gilberto em "João"), belissima versão de Ronaldo Bastos. Todas as outras são criações inéditas da dupla e não vou perder tempo em reproduzir nomes, vou aproveitar o espaço para relatar o timaço de músicos participantes: Armando Marçal, Arthur Maia, Daniel Jobim, Eduardo Souto Neto, Jacques Morelenbaum, João Donato, Jorjão Barreto, Jota Moraes, Luiz Alves, Márcio Montarroyos, Nivaldo Ornelas, Marcos Suzano, Robertinho Silva, Vittor Santos e Walter Costa. Me responde com sinceridade: faz quanto tempo que voce não vê um disco com participações tão estreladas? De quebra ainda tem a envolvente voz da deliciosa Jussara Silveira dividindo os vocais com Celso Fonseca em "Feito Pra Voce". "Juventude/Slow Motion Bossa Nova" é um disco que você - além de conservar com carinho seu exemplar - deve estocar e sacar um volume sempre que precisar dar um presente bacana para uma pessoa idem. Este disco, somado aos CDs ainda disponíveis da dupla, ambos imperdíveis, "Sorte" e "Paradiso" encerra um projeto de trilogia para a dupla de compositores. Em "Juventude/Slow Motion Bossa Nova", Gabriel Zellmaister, Javier Llusa e Washington Olivetto, todos da agência W/Brasil, foram os parceiros financeiros que proporcionaram a viabilização deste trabalho. Já ia me esquecendo de dois importantes detalhes: o timbre de voz de Celso Fonseca, presente em todas as faixas, inicialmente se assemelha pra caramba com o timbre de Caetano, um pouco mais suave e menos rascante que a do baiano, mas esta impressão só bate nas primeiras audições, depois que você se acostumar esta semelhança desaparece totalmente.
Mart'nália - Pé do Meu Samba
Se você me contasse que esta reunião iria acontecer na música brasileira eu não acreditaria: Mart'nália em disco arranjado por Celso Fonseca e dirigido por Caetano Veloso? Inacreditável! O melhor de tudo isso é o disco em sí, tudo é surpreendentemente bom neste trabalho. Você já deve ter se tocado que Mart'nália é filha de Martinho da Vila, mas não desfruta de nenhum privilégio por isso, a moça compõe e trabalha intensamente em discos alheios, ora em backing vocal ora como percussionista, e diga-se de passagem: eximia percussionista. "Pé Do Meu Samba" é o segundo disco que adquiri de Mart'nália, o primeiro foi o CD "Minha Cara" que é bem legalzinho mas que ficou bem ofuscadinho perante a delicadeza infinita que é "Pé do Meu Samba" que começa com um arranjo impensável para "Filosofia" de Noel Rosa, só esta interpretação e este arranjo valeriam todo o CD, mas todas as outras interpretações, arranjos e canções são de arrepiar, entre as conhecidas estão "Tempo Feliz" (Baden Powell e Vinicius de Moraes) e "Molambo" (Jayme Florence/ Augusto Mesquita).
Grande Waldemar, que surpresa encontrar seu nome e seu texto por aqui...e me ganhou também, vou encomendar rapidinho esse Slow Motion Bossa Nova e o da Martinália. Abraços. ROmulo
ROmulo, também estou surpreso. Entre o tempo de escrever os comentários e enviá-los surgiu um fato novo e penso que vai ajudá-lo a ficar mais motivado a descolar seu exemplar de "Pé do Meu Samba" de Mart'nália, seguinte: um dos grandes momentos do disco é o Samba 'Novos Tempos'- uma das mais belas canções que fala da esperança do novo amor - de autoria de Cláudio Jorge, que foi, neste intervalo de tempo escrever/enviar texto, anunciado concorrente ao Grammy Latino na categoria melhor álbum Samba / Pagode por seu disco "Coisa de Chefe". O Grammy é um prêmio até meio combalidinho e 'Coisa de Chefe" do compositor/intérprete/violonista/arranjador Cláudio Jorge mereceria prêmios de maior credibilidade se houvessem, não existindo fico pra lá de contente que o trabalho de Cláudio Jorge tenha sido lembrado como um dos melhores discos de Samba. Ainda na categoria Samba / Pagode outra indicação me lotou de alegria: Humanenochum de Riachão, ensandecido compositor/intérprete, baiano e octagenário, que só recentemente teve seu talento divulgado para o mundo do disco por Caetano Veloso/Gilberto Gil em "Cada Macaco no Seu Galho" e Cássia Eller em 'Vá Morar Com O Diabo', finalmente toda a refrescante loucura de Riachão em um disco só seu,nem dá para acreditar, bem, quase todo seu se descontarmos as participações estreladas de Caetano Veloso, Tom Zé, Dona Ivone Lara, Clarindo Silva, Carlinhos Brown, Armandinho e mais uma pá. Para terminar duas noticias, as duas boas, vou começar pela boa: a belissima composição 'Novos Tempos' que Mart'nália interpreta no cd "Pé do Meu Samba" também consta do cd 'Coisa de Chefe' de Cláudio Jorge, a segundo boa noticia é que tanto o cd de Riachão (Sony) quanto o de Cláudio Jorge (Sony) não são aqueles cd's que custam 30 paus cada, ando, nestes tempos de grana miada, detestando cd's caros, estes de Claudio Jorge e Riachão voce encontra custando entre R$16 e R$18, tarefa um tanto quanto ingrata é encontrá-los, estou me referindo à dificuldade em encontrar seus discos no próprio torrão natal dos artistas - Brasil - não nos EUA palco do prêmio Grammy, pôxa, esta é uma péssima noticia. Impressionante, Riachão/Cláudio Jorge acabam de serem indicados para concorrer a um prêmio internacional pelo reconhecimento da qualidade musical de seus trabalhos fonográficos e menos de um ano depois de terem sido lançados voce dificilmente encontra os cd's em bancas, em 2019 serão objeto de veneração e suprema cobiça, anote por que é com discos deste quilate que exibiremos orgulhosamente às gerações futuras que os artistas de nosso tempo foram maravilhosamente criativos a despeito da corrente que inadequadamente prega o marasmo de nossos compositores e intérpretes.
Caro Waldemar, parabéns pela estréia no Digestivo, o mesmo texto redondinho de sempre e as indicações, vindo de quem tem o seu bom gosto, são de se considerar seriamente, o que farei sem dúvida. Grande abraço e espero ler muitos outros textos seus por aqui.
Caro Waldemar,
Suas indicações tornaram minhas aquisições de cds mais seletivas e seus comentários abriram novas fronteiras musicais. Celso Fonseca & Ronaldo Bastos compositores/arranjadores constituem um exemplo da nova musicalidade na cenário musical brasileiro. Devo essa descoberta a comentários/indicações suas. Espero novos comentários seus com a precisão que o identifica. Abraços do amigo Gil
Eu tenho esses dois cds Waldemar...na verdade o do Riachão um amigo me mandou de presente a cópia, já que nunca vi para vender aqui em Ribeirão (Waldemar, você é ou não é humanenochum??;-))...o do Cláudio é um excelente cd de sambas, tem parcerias inesperadamente boas com o, pasme, Ivan Lins, com o admirável Wilson das Neves, que canta no cd, com o João Nogueira e também com o, não muito estimado por você, Nei Lopes...gostaria que você ouvisse com carinho a parceria dos dois, para mim é um grande momento do cd e da carreira de ambos...me conte depois. Você não acha que a voz do Cláudio lembra em alguns momentos a voz do Francis Hime??? Ou delirei??
Abs
ROmulo
Ps: só acho o nome desse cd, Coisa de Chefe, absolutamente sem graça;-))como eles dizem no Grammy?? Things from the boss???;-))
humanenochum: é a organização dos homens
que não falam mal de mulher: tento me controlar, acredito que falta pouco para eu conseguir o intento. Gosto da criação de Nei Lopes nas parcerias com Wilson Moreira, fora isto dificilmente me sensibiliza, no cd de Cláudio Jorge são duas as parcerias com Nei Lopes em "Estrela Cadente" e "Coco Sacudido", que são músicas legais, as temáticas de Nei Lopes que não me tocam são as que relatam o modus operandis ou exaltam a espertezas da malandragem em seus sambas de breque.
Eu não conhecia Waldemar Pavam. Adorei seu texto. Nós temos exatamente o mesmo interesse por música popular brasileira. Espero encontrá-lo mais vezes neste espaço.
Eu adoro bossa nova mas confesso que ultimente ando sem muita vontade de ir comprar novos cds. Li o seu texto e fiquei curioso em conhecer esses lancamentos, acabou me motivando a voltar a comprar os meus cds, pois o seu texto me mostrou que sempre tem uma novidade boa de bossa nova por ai. Encomendei ja os meus. Abracos. Fernando