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Segunda-feira, 27/1/2003
Para levar a Mônica a sério
Arcano9
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Na ordem decrescente, os meus super-heróis favoritos, e porque eu gosto deles:

5) Cavaleiro da Lua (Marvel) - Hummm... nunca entendi direito seus poderes. Também, foi pouco publicado no Brasil. Mas o que eu me lembro que me fascinava e continua me fascinando nele é que trata-se de um super-herói formado por sete pessoas diferentes. Sete! Sete pessoas tinham que deixar de existir momentaneamente para que o Cavaleiro da Lua pudesse sair por aí lutando contra o crime. Difícil entender como o super-herói consegue pensar com tanta voz diferente na cabeça.

4) Surfista Prateado e Rom (Marvel) - Coloco os dois juntos na minha lista porque, filosófica e espiritualmente, para mim, são muito parecidos. Suas histórias sempre eram mergulhos na reflexão sobre a solidão das estrelas e a inevitabilidade do destino. Lírico. Belíssimo.

3) X-Men e Novos Titãs (Marvel e DC) - De novo, estão juntos na mesma gaveta da minha mente. Acho que é porque os dois grupos são tão heterogêneos, coloridos... e sempre tiveram alguma coisa de draminha adolescente... adorava ver o Mutano apaixonado pela Estelar, que não lhe dava a mínima bola (na época que o George Péres desenhava os Titãs), ou a Kitty Pride tentando mostrar aos outros X-Men que ela era "digna" de ser incluída nas missões principais (na época que o Dave Cockrun desenhava os X-Men).

2) Monstro do Pântano (DC) - Há uns dois anos, ele certamente seria meu número 1. Eu lembro de ter chorado lendo uma história da inesquecível série de argumentos escritos pelo Alan Moore. Até hoje trato a leitura do Monstro do Pântano como uma espécie de ritual - o quarto precisa estar meio escuro, velas precisam estar acesas, eu preciso fazer meia hora de meditação antes. Acho que o que mais me fascina no personagem nem é o fato dele representar a necessidade de se pensar nas forças da natureza e levá-las a sério, mas sim seu romance com a humana Abigail Cable (acredite: cheguei a pensar em tingir meu cabelo de branco e negro, como ela.)

1) Mônica - Isso mesmo: a Mônica do bairro do Limoeiro, amiga da Magali.

Antes de dar mais detalhes sobre o porquê da minha insólita escolha para medalha de ouro, é melhor explicar o motivo que me leva a escrever sobre quadrinhos. Na esteira de "A Ciência de Jornada nas Estrelas" foi lançado nos EUA e aqui na Grã-Bretanha um livro que, certamente, vai ser comprado por impulso por muitos nerds aí no Brasil: "The Science of Superheroes" (Lois H. Gresh e Bob Weinberg, Wiley Publishing, 200 páginas). Como o próprio título já deixa claro, trata-se de uma obra que visa analisar e explicar, à luz da ciência que atualmente temos acesso, o que é possível, o que é plausível e o que é balela no mundo dos superpoderes da Marvel e DC - e até da Disney. Quando eu vi o livro a venda na Queensway já era tarde demais: já havia pago as 16 libras e o estava devorando enquanto aguardava meu burrito em um tex-mex no shopping Whiteleys.

Livros de ciência para fácil digestão por pessoas não iniciadas não são uma novidade. É incrível o sucesso que fazem. Estou falando das obras do Stephen Hawkins, como "O Universo numa Casca de Noz", ou mesmo "A Ciência de Jornada Nas Estrelas", a que me referi acima. Por que fazem sucesso? Hummm... minha teoria é que, ao contrário do que acontecia com a maioria de nós nas aulas de física e química do colegial, quando tínhamos que lutar contra o sono para nos empolgar em entender um pouco mais por que vinagre e bicarbonato de sódio juntos criam bolinhas, esses livros lidam com o que realmente sempre entendemos por ciência: o ir ao limite, o desafiar do impossível. Máquinas do tempo, principalmente, mas também voar à velocidade da luz, vencer a força da gravidade, criar vida do nada. Entender porque não daria para ouvir uma explosão em pleno espaço é entediante, por que fala da limitação causada pelas leis físicas que castram nossa imaginação. Mas entender como uma nave poderia singrar as estrelas e nos levar até Alfa Centauro é excitante, porque fala de como a ciência poderia ser amassada e jogada no lixo. É tudo uma questão de chamar de idiota aquele professor de física que reside no nosso inconsciente e que sempre nos lembra do que não podemos fazer, e não do que poderíamos fazer.

Assim como "A Ciência de Jornada nas Estrelas", "The Science of Superheroes" é particularmente apelativo para pessoas que têm ou tiveram alguma relação com o tópico. Eu li muito gibi quando era jovem, e não posso negar que tinha curiosidade em saber, de fato, se seria possível um homem respirar em baixo d'água, como o Aquaman, ou ser reduzido ao tamanho de um átomo ou ganhar poderes fabulosos devido a uma mutação genética. Essas dúvidas o livro respondente, nunca perdendo de vista o bom humor. Um momento interessante é quando o livro tenta explicar a sério os principais poderes do Super-homem. A superforça de Clark Kent é atribuída a dois elementos principais: o primeiro é que Kripton, onde teria nascido o herói, circundava um sol vermelho. O efeito do sol amarelo do nosso sistema solar fortaleceria, assim, o herói - mas os autores do livro rapidamente explicam que isso não tem o mínimo fundamento científico. O segundo elemento é que Kripton tinha uma gravidade muito maior à da Terra antes de explodir. Assim como um humano que consegue levantar 100 kg na Terra pode levantar 600 kg na Lua, Super-homem se aproveita da gravidade fraquinha do nosso planeta. Mas aí entram os cálculos. Segundo os autores do livro, se o Super-homem realmente pudesse erguer com seus braços, por exemplo, um caminhão, a gravidade que deveria existir em Kripton para que ele tivesse essa habilidade indica que o planeta natal do herói seria... 1000 vezes maior que o Sol, que já é centenas de vezes maior que a Terra. É claro que os autores ignoram a hipótese de que existam planetas com uma maior densidade de matéria, e isso pode ser um detalhe importante. Mas ainda que Kripton tivesse existido com esse tamanho imenso, ou com essa densidade imensa, dá para imaginar a força que o foguetinho que trouxe o Super-homem à Terra precisaria ter para se libertar da gigantesca força gravitacional de Kripton?

É claro que o livro também fala do que é completamente possível. Adivinha que herói poderia existir sem problemas, segundo o livro? Batman, é claro. Não se trata de algo de se estranhar, visto que Bruce Wayne não tem superpoderes. No entanto, há algumas décadas, acreditava-se que os itens de seu famoso cinto de utilidades não passassem de sonhos impossíveis: mini bombas de gás e explosivos, cordas super-resistentes... Pois é, mas aí os quadrinhos, seguindo a tradição de Julio Verne ou outros escritores de fantasia, antecipou o futuro. Praticamente todos os itens do cinto de utilidades, que antes julgavam ser impraticáveis, hoje já estão disponíveis. Batman, o visionário.

Também há os heróis que o livro aponta como impossíveis não por causa das leis da física apenas - como o super-homem, mas por causa de leis ainda mais incontornáveis: as da lógica. Tomo como exemplo o Flash. De onde ele tira tanta energia para correr? De suas refeições? Se for assim, quantas refeições por dia ele faz? E quanto ele come em cada uma delas? Você poderia argumentar que ele tem um metabolismo acelerado, e que pode comer mais e processar tudo mais rápido. Ainda assim, o Flash teria que passar boa parte de seu dia comendo ou no banheiro, se desfazendo dos restos da digestão. E quanto ao calor causado por tanta corrida? Será que o Flash sua? Se ele suar, deve suar prá caramba. "All that running might steam off the sweat, but the chemical residue might make the Flash the superheroe whose body odour announces his presence before he arrives!", brincam os autores.

Além de explicar de modo leve os dilemas envolvendo alguns dos super-heróis mais famosos, o livro também tem um outro lado interessante, já que mescla a ciência com um pouco da história dos heróis. Ele explica quais foram as eras de ouro e prata dos heróis, e porque eles foram criados, muitas vezes por pura pressão mercadológica. O livro também termina com uma série de entrevistas com alguns artistas envolvidos na atual produção de quadrinhos. O interessante, nesse caso, é que quase todos falam a mesma coisa no tocante à presença da ciência nas histórias em quadrinhos: deve haver um esforço para que as regras do universo sejam respeitadas, mas esse esforço nunca deve tiranizar a imaginação necessária para criar boas histórias. É isso aí. Histórias em quadrinhos não devem ser feitas para ser lidas na sala de aula. Elas são principalmente para o horário do recreio. É claro que um pouco de ciência não faz mal a ninguém, e pode até ajudar a história a ser mais legal.

Quanto à Mônica, agora. Ler a Mônica me dá superpoderes. Eu viajo no tempo e no espaço - retorno a um período da minha infância onde as tardes eram quentes e indolentes, e o futuro vasto e desconhecido. E meu pai vinha do trabalho toda a noite e me levava pela mão para comprar paçoca Amor no bar da esquina. E eu brincava com uns moleques na rua de terra. E empinava pipa. Sim, a Mônica é certamente minha maior ligação com o arcano9 que só existe na lembrança. Quanto à sua superforça, há várias explicações - que não constam do livro, mas que são evidentes após diligente pesquisa em tomos de biologia: a menina nasceu com uma disfunção hormonal que a faz ter mais testosterona que as meninas e os meninos de sua idade. Isso certamente é aliado à predisposição genética para desenvolver músculos e a um desequilíbrio comportamental que a faz ter ataques de fúria, que por sua vez a faz bater no Cebolinha com toda a força em seu corpinho, causando no pobre menino todo tipo de concussões e hematomas. Tudo isso é extremamente plausível. Olha só. Acho que a dentucinha merece ser levada mais a sério...


Arcano9
Miami, 27/1/2003

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