"A originalidade consiste em voltar à origem."
(Antoni Gaudi)
A cidade é uma aglomeração permanente, densa, onde acontecem
diversos tipos de relações, e é criada sob o sentido da
organização. É um organismo vivo que reflete, através das
relações sociais, as expectativas e anseios da comunidade. Se
pensarmos a cidade como a casa de todos, o direito à
cidadania será resgatado.
Apesar de que as metrópoles modernas seguem esquemas de
segurança de urbanistas inseguros, que projetam condomínios
fechados, e outros sistemas que afastam o cidadão de sua
cidade. O habitante é o espelho da cidade, e somente por
entre o seu olhar a cidade é desvendada.
Se fizermos uma leitura do espaço urbano, verificaremos que a
cidade foi engolida pelo gigantismo da megalópole, onde o
espaço público, como praças e estações, ao invés de abrigar o
indivíduo, deixa-o constrangido e o transforma num ser
anônimo e perdido. A função do urbanista é criar uma forma de
vida contemporânea, sendo o seu maior desafio o de encontrar
soluções criativas.
O traçado urbano deve ser planejado com o objetivo de mudar o
comportamento dos cidadãos, e ainda guiá-los rumo à
felicidade.
Quem nunca se aventurou a desdobrar a cidade ensolarada? A
cidade deveria ser o mapa dos reflexos do sol. Ela teria mais
sentido se fosse pensada como uma casa, onde o habitante, ao
acordar, ficasse esperando o sol subir pela janela. Ao
deitar, não existisse nada mais do que as claridades cadentes
e a lua espalhada no céu. Achar palavras para aquilo que se
sonha é quase impossível. É melhor caminhar pela rua deserta
e silenciosa. Nós sempre caminhamos ao encontro de alguém,
mesmo que ninguém nos aguarde. O caminho não precisa ter um
rumo certo. O importante é o encontro, porque os caminhos
mudam, misturam-se a outros caminhos que inventamos somente
para celebrarmos o encontro.
Os urbanistas modernos planejaram a cidade sem os espaços de
comunicação. Talvez os futuros urbanistas se lembrem das
agradáveis praças italianas, das piazzas medievais, do fórum
romano e da ágora grega. Embora seja difícil prever o futuro.
Segundo o poeta Jorge da Cunha Lima, corremos riscos: da
miséria antecipar-se ao apogeu. Dos números serem mais fortes
do que as palavras. Do traçado ser tragado. Da vida ser mais
frágil do que a morte. Da ordem prevalecer sobre a liberdade.
Do caos ser mais freqüente que a harmonia. Da razão
substituir a beleza.
Estes riscos devem ser analisados politicamente, e não
moralmente. Segundo Karl Marx, "a moderna sociedade burguesa,
uma sociedade que liberou tão formidáveis meios de produção e
troca é, como a feiticeira, incapaz de controlar os poderes
ocultos desencadeados por seu feitiço". É necessário pensar a
cidade como um espaço do indivíduo que se coletiviza. O homem
como o centro de todo planejamento urbano.
A cidade de hoje e do futuro deve ser pensada como uma
sociedade da informática, onde a técnica e os elementos não-
físicos incluem o lado perceptivo, sentimental e espiritual
do homem. Esta é a condição prévia à existência de toda
sociedade.
Caro Pedro, parabéns pela escolha e qualidade na abordagem do tema. Infelizmente, não conseguimos estabelecer qualquer ligação entre o urbanismo e a cidadania e essa incapacidade está refletida nos projetos das edificações, nos planos diretores das cidades e nas legislações municipais de uso do solo. Os obstáculos urbanos, as calaçadas estreitas ou esburacadas, a preferência dada aos automóveis, a setorização que mata a diversidade, os isolamentos condominiais que impedem a convivência espontânea, tudo isso é causa e efeito dessa nossa miopia, que tira a nitidez do desenho da cidade e não vê o homem que nela habita. Um abraço. Bernardo Carvalho Goiânia-GO