Entrevista com Spacca | Digestivo Cultural

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ENTREVISTAS

Segunda-feira, 3/8/2009
Spacca
Julio Daio Borges
+ de 14800 Acessos


Foto: Jornal A Tarde

Spacca é, hoje, o celebrado autor de graphic novels como Santô (2006), Jubiabá (2009) e Debret (2007) — todas elas pela Companhia das Letras. Atualmente trabalha na adaptação de As Barbas do Imperador, clássico contemporâneo de Lilia Moritz Schwarcz, com previsão de lançamento em 2011. Mas Spacca também foi chargista prodígio e estreou na Folha aos 21 anos — passando lá uma década.

O que pouca gente sabe é que Spacca foi, igualmente, um dos primeiros artistas gráficos brasileiros a ter
site na interent — o Spacca Tutto, na aurora dos anos 2000 (quando teve seu momento de webdesigner). Spacca participou, ainda, da gênese do Digestivo Cultural, onde publicou algumas Colunas — e, recentemente, até fundou um blog, "com informações para consultas de 5 segundos".

Nesta Entrevista, Spacca revela suas preocupações culturais: "Será que a nossa época ficará apenas retomando a velha mitologia do século XX?". Faz piada com as chamadas mídias sociais: "Em breve, o Twitter será substituído por um editor de 12 caracteres". Tem dúvidas quanto às mídias antigas: "O que é o jornal, hoje?". E, também, quanto às novas...: "Do que viverão os
bloggers?". No meio do turbilhão, Spacca exercita seu bom humor, reconhecendo o momento oportuno na carreira: "Estamos vivendo uma época favorável às HQs (estou tentando entender o que está acontecendo...)". — JDB

1. Eu não lembro mais onde a gente se conheceu. Foi no "Fórum Paciência"? Talvez tenha sido no Observatório da Imprensa, quando eu colaborava e você ilustrava. Sinceramente, não tenho certeza. Mas, de qualquer jeito, queria começar falando daquela época. A internet era tão pequena, não era? E a gente trombava com cada cabeça... Queria aproveitar e também te perguntar do Spacca Tutto. Antes da bolha, a gente construía sites para melhorar o mundo? Por que será que hoje ninguém constrói mais nada, prefere "tuitar" e só? (Éramos idealistas felizes e não sabíamos?)

Caro Daius Julius, como faço para responder estas perguntas-pauta? Cada pergunta se compõe de várias... Só se eu respondesse 1a, 1b, 1c... Começarei pelo que mais incomoda, que é o site Spacca Tutto. Trata-se de um fóssil: não atualizo há anos, cada vez que atualizei precisei estudar o Dreamweaver de novo...

Para amadores, como eu, isso não faz mais o menor sentido — é tão mais fácil criar um blog e deixar umas informações lá para consultas de 5 segundos.

Mas os fósseis têm sua utilidade. De fato, o Spacca Tutto registra uma época em que eu estava procurando um norte, por isso eu fuçava o Observatório, o "Patientiam" e também escrevia longas filosofices no grupo de discussão Imagodays, criado pelo ilustrador Kipper, momento importantíssimo para a carreira, e novas amizades, de muitos ilustradores brasileiros, por volta do ano 2000...

2. Pesquisando mais sobre você para esta Entrevista, topei, aliás, com um blog... Abandonado? (Mas tem comentários de 2009!) Imagino um blog seu há um tempão. Para falar o que anda fazendo; publicar o que vem desenhando... (Por que não colocou no Spacca Tutto?) Queria, também, sua opinião sobre a blogosfera de artistas do traço, no Brasil (se é que ela existe)... Outro dia descobri o do Nani. Tem os da Geração 00, como os do Dahmer e do Arnaldo. Sua geração está mais atrelada a grandes veículos? (Falo de Angeli, Glauco, Laerte...) Os chargistas e ilustradores, no nosso País, se atrelam mais a estruturas maiores e saem menos "solo", como você fez? (Ou não?) Por quê?

O blog é atual, o Spacca Tutto é que é o vestígio de eras passadas... Minha "blogosfera de artistas do traço" é quase privada e se restringe às conversas com os colegas da SIB (Sociedade dos Ilustradores do Brasil) e alguns amigos. Não tenho espaço mental para participar de outros grupos ou veículos. Acompanho o Nerdcast toda semana, e o YouTube se converteu no grande canal de trivialidades e tesouros. Visito o Orkut só para aceitar algum novo contato e caio fora em seguida. E acabou aí, nem Twiter, MSN, Facebook... não dá.

Sobre os grandes veículos e a nossa geração: Angeli, Glauco e Laerte têm pelo menos uma década de diferença de mim, mas você está certo em nos agrupar de certo modo, nós ainda pegamos a rabeira dos grandes veículos — nós crescemos durante a "Segunda Onda" (Toffler). Os artistas desse tempo — peguemos Chico Buarque como paradigma — causavam impacto numa massa inteira, unificada por uns poucos canais de televisão, o sucesso era monopolizador e homogêneo. Quem era famoso... era para todo mundo. Isso, como se sabe, passou. Hoje só conhecemos "mega" sucessos internacionais (exemplo: Ronaldinho) e milhões de segmentos. Uma especie de "era feudal" midiática.

Hoje precisa um esforço e investimento muito grande para atingir um público grande, e mesmo assim o impacto dura pouco. Algum tipo de relevância o artista precisa obter. Talvez seja a hora do "biscoito fino" profundo, bem feito e para poucos. Mas como viver disso?

3. Quando a gente se conheceu, você saía de um período de anos de charges na Folha. Pelas minhas contas — e pelo seu site —, foi dos 21 aos 31 anos, de Sarney (sempre ele) até FHC. Você me contava das madrugadas que virava até as bancas de jornal abrirem, e, então, era possível conferir o trabalho do dia anterior... Tem saudades daquele período? (Eu suspeito que não, mas queria perguntar assim mesmo.) As charges foram perdendo seu peso com a queda de circulação dos jornais nas últimas décadas? Hoje fazer carreira, como você fez, não é mais a mesma coisa? Isso é bom ou ruim para as novas gerações?

Suas suspeitas estão corretas, não sinto saudade nem um pouco desse tempo de charges. Nem do assunto, nem do processo de criação e aprovação, nem mesmo do tipo de idealismo político que me movia, que era muito míope e preconceituoso. As boas lembranças estão mais nos amigos que fiz.

É verdade, hoje em dia não sei o que justifica a charge. Ela sem dúvida faz parte do jornal, e o que é o jornal hoje? (Adianto um pouco a resposta da seguinte:) O jornal até pode acabar, mas o jornalismo continua...

Veja a tira diária. Este gênero de quadrinho foi a alavanca dos 10 anos iniciais da carreira de Maurício de Sousa.

Mas, nas minhas HQs históricas, eu noto uma certa intenção jornalística, de participar do debate público com uma versão alternativa de um grande tema. E não meramente uma versão alternativa qualquer, mas uma visão documentada, apoiada em fatos. Por exemplo, nos 200 anos da vinda da família real portuguesa ao Brasil, lançamos Lilia Schwarcz e eu D. João Carioca, que pretendeu recontar essa história de maneira mais séria do que o filme Carlota Joaquina. É uma HQ revisionista, que desafiou uma noção bem assentada do rei bobão e da rainha louca etc.

Essa missão de botar os pingos nos "is" e citar as fontes é, tirante o detalhe de ser notícia velha, prática do bom jornalismo. Posso considerar minhas HQs históricas "super" charges, em que posso usar o desenho de humor para representar as forças em jogo num determinado momento político...

Meu próximo personagem será D. Pedro II (vide resposta 7).

4. Queria ser autorreferente agora e falar dos primórdios do Digestivo, quando você participava. O que achava daqueles malucos que, escrevendo textos, queriam dominar o mundo? Publiquei você, escrevendo, algumas vezes. Numa delas, você contava do encontro com o Maluf no aniversário de 80 anos da Folha... Muita gente, hoje, fala que, se os jornais acabarem mesmo, vamos perder uma era e, não, apenas um suporte. Sei que esta pergunta se sobrepõe à anterior, mas queria insistir neste ponto — porque acho que o início do Digestivo guarda esse desejo de ser respeitável, sério e impactante como um grande jornal... (É minha impressão ou revista não é a mesma coisa? Você que já trabalhou em várias...)

Admiro o propósito sério dos jornalistas que têm esse sentido de missão, e repito minha frase na resposta anterior: o jornalão pode até morrer, mas o jornalismo e os jornalistas sobreviverão... Sempre haverá pessoas que desejarão praticar o jornalismo: informar, comentar e interpretar. Não sei se haverá gente suficiente para ler, e ainda mais para pagar por isso... Este é o problema.

O jornalão, por inércia, continua desempenhando uma função "cartorialista", eu diria: é lá que as coisas se tornam oficialmente públicas. A notícia em si, a novidade, corre muito mais fácil nas outras mídias, com a rapidez das fofocas. Mas a "declaração" precisa ainda aparecer no jornalão, que é por natureza dominador, institucional, único e geral. É por ele que as coisas entram para a História. Lá só cabe um ou dois chargistas, uma dúzia de críticos e opinadores. Quem quer ter reconhecimento público — digamos, a resenha de um show —, quer ser mencionado lá. É um espaço público central.

Já o trabalho intelectual mais sério, talentoso de verdade, divertido, pertinente etc., não está necessariamente lá... Está nos nossos nichos favoritos, que pode ser um blog com 20 leitores...

Mas, de novo: do que viverá esse blog?

5. Queria voltar nos anos 80 e falar da época da Níquel Náusea. Eu lembro de ir sábado à tarde no shopping Iguatemi, flertar com as meninas, sair andando pela Faria Lima, cruzar a ponte Cidade Jardim e comprar as revistas de histórias em quadrinhos que vocês faziam, para sair carregando, no bolso de trás da calça, em direção ao Jockey Club (pois tinha um amigo que morava nas redondezas)... Vocês faziam a internet da época! Eram os "independentes" que consumíamos. Ao mesmo tempo que frequentávamos a Baratos Afins... Como foi aquele tempo para vocês? Aquelas revistas poderiam ter durado para sempre (ou não)?

Eu lembro de andar pela Cidade Jardim lendo Piratas do Tietê na mesma época...

Esse tipo de relacionamento em grupo, que hoje existe como "blogosfera", existiu muito no passado sob outras formas.

No meu livro Santô e os Pais da Aviação, eu falo sobre um engenheiro aposentado, Octave Chanute, que se correspondia com pesquisadores do mundo inteiro, dos EUA à Austrália, e mantinha uma rede de informações aeronáuticas em 1890-1900. É por aí que os Irmãos Wright conheceram o trabalho dos europeus e vice-versa. (Já Santos Dumont foi um fenômeno da grande mídia mundial...).

Meus "independentes" são um pouco mais antigos que os seus, eu peguei a geração de músicos independentes paulistanos do Premê, Língua, Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé; e vi o nascimento do humor do Planeta Diário/Casseta Popular, rompendo com o humor da geração Pasquim...

A revista Níquel Náusea reunia amigos que tinham referências em comum, a MAD, Tio Patinhas e uma certa cultura de almanaque: Fernando Gonsales e Newton Foot — de certa maneira, eram HQs nerds, com muitas citações históricas, religiosas e veterinárias... (Angeli & cia. já eram profissionais mais velhos e de outra turma, de outro universo.)

6. Hoje você é autor de graphic novels como Santô, Jubiabá e Debret. São suas obras-primas? Foi um salto muito grande? Ou algo que você sempre acalentou? Como é ter esse tempo, atualmente, para pesquisar e desenhar, durante meses? Como você se equilibra com as outras coisas? Porque imagino que não consegue sair do mundo real, tem de dar conta de outras obrigações... É de se admirar porque qualquer um que trabalhe com arte, sonha em ter esse tipo de independência. O exemplo maior, para H.L. Mencken, era Beethoven. É minha impressão ou as demandas do mundo moderno vão, frequentemente, contra esse projeto?

As duas coisas: um salto muito grande e um sonho que sempre acalentei.

Um salto muito grande especialmente como técnica de desenho e narrativa: os quadrinhos são uma arte exigente e múltipla, apesar de sua aparente simplicidade. Tive que aprender muito, em muitos campos, e ainda há muito o que aprender. Mas não aconteceu como eu imaginei... Santô eu já quis fazer um longa de animação, mas o álbum já me satisfez.

Esse trabalho de HQ está em primeiríssimo plano hoje, adiante de todo o resto.

O relacionamento com os editores é muito harmonioso, tem muito respeito, capricho, honestidade, entusiasmo. Além disso, estamos vivendo uma época muito favorável à HQ (ainda estou tentando entender o que está acontecendo).

O fato da Cia das Letras ter criado um selo só para quadrinhos (Quadrinhos na Cia) parece-me algo muito importante, então o mundo moderno parece que está a favor...

7. Você se sente reconhecido? Como é a recepção crítica ao seu trabalho (se é que, no Brasil, existe alguma...)? Como você quer ser lembrado? Como chargista da Folha, autor da Companhia das Letras ou sócio da For Fun Business (como diz no seu site, "especializada em utilizar a linguagem do desenho de humor em comunicação empresarial")? Eu às vezes fico me perguntando se quem mexe com criatividade, em nosso País, é obrigado a "jogar nas onze" (ou não). Porque a glória não paga as contas. (Ou, de alguns, até paga?) Best-seller tem glória? Como conciliar esse negócio todo?

A recepção crítica tem sido bastante benevolente...

"Fun for Business" é coisa que você cavou naquele site fóssil de que já tratei. Mas já que está aqui: foi uma aposta no segmento de cartuns para treinamento empresarial, RH, essas coisas.... Que até hoje é, em termos de criação de desenhos, bastante amador em relação à publicidade e ao marketing. O pessoal de RH sabe que pode se virar com desenhos encontrados na internet e um flipchart, e não tem como competir com essa simplicidade.

Quanto às HQs, esta é a atividade com a qual me identifico hoje em todos os sentidos, pelo prazer de fazer, pela receptividade, pela evolução profissional e até, pouco a pouco, pela viabilidade financeira.

Meus livros de HQ, que estão sempre atrelados a algum tema forte da cultura brasileira (e quase sempre tratam de um tema histórico), já nascem velhos e por isso têm um desgaste menor com relação ao tempo... Por isso — quem sabe? — talvez se tornem "long-sellers"...

Esta é uma carreira que estou construindo de 2005 para cá. A cada dois anos pretendo lançar um álbum de quadrinhos pela Cia. das Letras (Quadrinhos na Cia). O próximo livro, como já disse, é a adaptação de As Barbas do Imperador, de Lilia M. Schwarcz, em quadrinhos (para 2011)...

8. Queria que você falasse um pouco da sua formação. No seu recorrente site, tinha uma seção de que eu gostava muito, que era a "Mestres" — onde você discorria, justamente, sobre a sua formação. E não incluía profissionais do traço, só, não. O último "mestre" a figurar lá foi o Bruxo do Cosme Velho, o Machadão! Eu sempre me impressionei porque você lia muito, tinha muita curiosidade intelectual — que não é algo que a gente espere de um profissional da imagem... A briga de "uma imagem" versus "mil palavras" faz sentido na sua cabeça ou é tudo preconceito meu (que não conheço tanto os profissionais da imagem)?

A seção "Mestres" (copiem o que interessa de lá antes que eu tire aquele fóssil do ar!) é mais uma atitude reverente aos mestres da minha área — o Machadão foi emprestado... Ela faz mais sentido em relação a Le Blanc, aos italianos da Disney, ao Henfil e a outros...

Quanto à briguinha entre texto e imagem: quando você escreveu "tinha muita curiosidade intelectual — que não é algo que a gente espere de um profissional da imagem", quem você tinha em mente, Leonardo da Vinci? Touché!

Bem, esse negócio de "uma imagem vale mais que mil palavras" é razoavelmente verdadeiro em termos sensoriais muito básicos, quando, por exemplo, você tenta descrever minuciosamente uma paisagem ou, até mesmo, o seu retrato. Mil palavras, nesse caso, não dão nem para o começo... Mas é uma bobagem. "Mil palavras" — mas quais palavras?

Se eu digo "caos urbano", com duas palavrinhas já evoco no leitor um monte de lembranças visuais e sonoras, carros, prédios e multidão, sem precisar desenhar um único poste... Esse é o poder da palavra, de representar com muita facilidade qualquer coisa da experiência humana, seja abstrata, concreta, racional, emocional, relações, possibilidades... (O que nos leva àquela outra estupidez de considerar o texto "racional" e a imagem "emocional" — e atribuir, a cada um, um lado do cérebro... É coisa de gente com meio cérebro.)

Como desenhar o significado de "talvez"? Nem com mil desenhos... A imagem tem o poder de apresentar dados direta e simultaneamente, o que, na escrita, e na fala, somos obrigados a fazer palavra a palavra, aspecto a aspecto...

HQ reúne imagem e palavra — e pode representar a experiência humana tanto sequencial (quadro a quadro, página a página, o texto escrito) como simultaneamente (o quadro, a página etc.).

9. Queria voltar no papo das gerações, porque, pelo que você fala, cresceu nos anos 70, entre Tio Patinhas, Mônica e o programa História do Desenho Animado. Fora que, depois, queria ser animador da Disney... Hoje, olhando para a sua família, as crianças e os jovens com quem você convive: mudaram completamente as referências ou não? A televisão ainda é muito forte, como era na sua geração (mesmo na minha, a dos anos 80)? Como a internet nunca suporta Flash direito, o máximo de vídeo que conseguimos foi o YouTube, vão crescer menos animadores (ou candidatos a) nos próximos anos? Ou vão todos sonhar com a Pixar (a Disney, de novo)? Talvez esteja me repetindo, mas esse assunto de crescer com a internet (coisa que não tivemos) me interessa bastante...

Pois é, em parte eu toquei nesse assunto nos parágrafos acima.

O que é mais marcante na internet, e no nosso mundo de hoje, não é exatamente o formato da mídia; mas a sua disponibilidade, a facilidade com que se obtém as coisas. Se eu tenho saudade de um velho comercial de TV, vou no YouTube, baixo... e nem assisto inteiro, porque já matei a curiosidade.

O que caracteriza nosso mundo é a volubilidade. Como lançar algo novo e impactante, para durar? Nem nós, nem o showbiz, nem o cinema está conseguindo...

Os seriados de TV têm conseguido. O resto não cola e não decola... Até por isso: os "mega" sucessos do século XX, e anteriores, continuam com prestígio — ganham aura quase mítica... Star Wars, Star Trek, Michael Jackson, Jorge Amado, Machado de Assis, Monteiro Lobato... "super" franquias!

Será que a nossa época será de apenas ficar retomando essa mitologia? Sei lá, meu amigo...

10. E o que você diria para quem quer ser o "Spacca do futuro". Se inscrever nos programas da Folha, por exemplo, ainda é bom negócio? E ser chargista lá, por uma década? Participar de publicações independentes? (Estão todas na internet, ou não?) Montar um site? Um blog? Apresentar o currículo para a Companhia das Letras, funciona? Eu estou brincando com você porque sei que não existe fórmula. Queria que você falasse para quem pensa em seguir uma carreira na sua área... O que faria de novo e o que não faria? Existem atalhos ou o Brasil não é para principiantes, como o Tom Jobim coroou?

Só consigo imaginar uma atividade cultural que possa virar também uma profissão. Seja o que for, depende de editor, mercado, ou patrocínio estatal, enfim: parceiros que produzam... e consumidores.

Está tudo mudando, há facilidades tão incríveis para se produzir, e consumir, e ao mesmo tempo, ou por isso mesmo, tudo fica muito banal.

Voltando ao "paradigma Chico Buarque": era possível um cara ser Chico Buarque sem o mercado das gravadoras, sem o LP? Não bastavam os olhos verdes, o talento e a censura...

Quando, nos anos 90, os DJs começaram a "fazer música" com retalhos sampleados de outras canções, e o rap apareceu com aquela bateria eletrônica — e essas coisas funcionaram muito bem para animar festas —, eu disse: "Ih, acabou..."

As facilidades eletrônicas, piratas ou não, pulverizaram o poder das gravadoras, o CD matou o LP e a pirataria matou o CD... Como imaginar um artista sem essa estrutura (física e econômica)?

Por isso, os meus livros "feitos para durar" — quem sabe? — talvez sejam um caminho... Opostos à velocidade, e à instantaneidade, da era do Twiter — que, em breve, será substuído por um editor de 12 caracteres!

"Micro mensagens" e "terabytes" de memória...

Para ir além
Spacca Tutto e blog do Spacca


Julio Daio Borges
São Paulo, 3/8/2009

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