DIGESTIVOS
Sexta-feira,
14/11/2008
Digestivo
nº 389
Julio
Daio Borges
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Imprensa
>>> A Eleição de Barack Obama
Mal foi eleito já estão acusando Barack Obama de querer salvar o mundo, sendo que salvadores da pátria não existem — todo mundo sabe — e sendo que a maior comemoração agora é pela saída de uma administração que não funcionou, que causou prejuízo para o globo e que, envergonhada, se retira... justamente esperando que... Obama...(!) salve a situação. Não é irônico? Mas, mais que uma disputa partidária, ou uma briga de torcidas (como no Brasil), a vitória de Barack Obama reflete um desejo de mudança mais ampla, que talvez não passe só pela política ou pelo que o virtual presidente pode, efetivamente, realizar: o planeta simbolicamente anseia por uma mudança de mentalidade, e parece sinalizar que está finalmente preparado para ela, consagrando não apenas um negro, mas, historicamente, uma minoria, um quase desconhecido, com objetivos — talvez ingênuos — de união suprapartidária, num esforço, também histórico, de diálogo na política externa, despertando, em grande parte da humanidade, uma esperança que verdadeiros líderes só despertam uma vez por século. Obama era o candidato do século XXI, da internet, do fim da guerra no Oriente Médio, das finanças menos descontroladas, da elite intelectual de Harvard, do enterro dos fundamentalismos religiosos... Agora, se o Barack Obama, presidente empossado dos Estados Unidos, vai encarnar isso... são outros quinhentos. Por enquanto, a votação deve ser encarada com um ato político em si — de repúdio a uma administração que fracassou no 11 de Setembro, com o furacão Katrina e durante o tsunami do subprime da economia. Obama pode não ser uma solução no futuro, mas é uma resposta no presente.
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>>> Vídeo do Discurso da Vitória (em Chicago)
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Além do Mais
>>> O Itaú Unibanco na Cultura
Ainda que tenha sido um golpe de mestre em matéria econômica, a fusão dos bancos Itaú e Unibanco lança interrogações sobre o futuro das ações das duas empresas no âmbito da cultura. Para além do Instituto Moreira Salles — que, por exemplo, edita periodicamente os Cadernos de Literatura Brasileira e comprou ultimamente o acervo do crítico musical José Ramos Tinhorão (entre muitas outras realizações) —, a marca Unibanco está intimamente relacionada ao cinema, seja por Walter e João Moreira Salles (os irmãos cineastas), seja pelos Espaços na rua Augusta e no shopping Frei Caneca; bem como está relacionada à literatura, pela participação adquirida há anos na editora Companhia das Letras, e pelo patrocínio anual da Flip (vide o irmão poeta Fernando Moreira Salles); sem contar o jornalismo aclamado da revista Piauí. Pedro Moreira Salles, o irmão financista, foi perfeito no timing ao salvar o Unibanco, como instituição financeira, de um beco sem saída, com a consolidação iniciada pelo Grupo Santander que adquiriu o Real no ano passado. Mas há temores de que o controle, majoritariamente nas mãos do Itaú, não seja benéfico para todas as ramificações culturais mantidas pela família Moreira Salles. Afinal, o Itaú já tem seu próprio braço nas artes, com o Instituto Itaú Cultural, e consta que sua aquisição recente do BankBoston privou a cidade de uma de suas melhores temporadas de concertos, renomeada "Personnalité", mas, em seguida, descontinuada. É logicamente cedo para tirar qualquer conclusão, até porque, neste momento, a cultura é a última prioridade, mas convém prestar atenção e torcer para que todas as iniciativas culturais sejam preservadas.
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>>> Itaú Unibanco
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Cinema
>>> Noel — Poeta da Vila
Passou em brancas nuvens, no cinema, o filme de Ricardo van Steen inspirado na célebre biografia de João Máximo e Carlos Didier. Mesmo com Camila Pitanga no papel de Ceci — pegando embalo no sucesso da sua personagem Bebel na novela das oito — não foi possível arrastar o público para as salas. O fato é que, apesar de esteticamente bem cuidada, a produção se rende ao ritmo do videoclipe e, no afã de dar conta do livro de Máximo e Didier, se atropela em termos de narrativa — muitos coadjuvantes, igualmente célebres, se revelam superficiais e o espectador termina com a sensação de que Noel Rosa não foi essa coisa toda. Embora a escolha do ator Rafael Raposo tenha sido feliz, pela convincente semelhança física, o Noel do longa se comporta freqüentemente como um menino que não quer crescer, entre farras diárias e amores irresponsáveis, apressando a própria morte por tuberculose e assumindo compromissos que não consegue honrar em vida. Por mais que esse retrato seja verdadeiro pelo lado pessoal, o gênio das letras de samba — cujos versos Carlos Heitor Cony comparou aos de Camões — não parece combinar com o Noel infantilizado e trapalhão em película. É certo que o cinema brasileiro, e a cultura brasileira como um todo, nutre(m) uma simpatia pelo talento intuitivo, que brota da terra e baixa como numa sessão mediúnica — mas, ainda que funcione para encantar algumas platéias, esse mito deveria ser aposentado, em favor de explicações mais lógicas, afinal queremos construir um país e não esperar sempre pelo maná que caia dos céus. Noel — Poeta da Vila, no fundo, talvez não tenha ambições assim, mas nossos heróis nacionais, de qualquer jeito, mereciam mais profundidade na abordagem.
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>>> Noel — Poeta da Vila
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Julio Daio Borges
Editor
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