DIGESTIVOS
Quarta-feira,
4/7/2001
Digestivo
nº 39
Julio
Daio Borges
+ de 1700 Acessos
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Imprensa
>>> E Deus por todos
A Carta Capital, de 4 de julho, estampa, em suas páginas, a recente tese européia de que não adianta mais proibir o consumo de drogas. Ao que parece, ninguém segura um négocio de 400 bilhões de dólares, quase 10% do comércio global, perdendo apenas para a venda de armas e para o petróleo. Autoridades e estudiosos afirmam que essa guerra já foi perdida há muito tempo. Mas, considerando-se as cifras envolvidas: será que, algum dia, houve real interesse em erradicar os vícios, e em reabilitar os viciados? O individualismo, cada dia mais em voga, no Velho Continente, vem sempre com aquela teoria de que cada um é responsável por seus atos e palavras. Em geral, lava-se as mãos, como Pôncio Pilatos. As cidades, no planeta inteiro, vivem um clima de "salve-se quem puder", de modo que o termo "solidariedade" não passa de um verbete, há décadas, aposentado do vocabulário. Acontece que o drama dos dependentes (químicos ou psíquicos) é um drama que simplesmente não se encerra numa pessoa só, pelo contrário, ele se espalha em forma de teia, vitimando emocionalmente todos os que estão à volta (e que minimamente se importam). Quem conviveu com isso sabe. Conseqüentemente, é preciso ser bastante leviano para supor que, quando o tema é drogas, "cada um sabe se virar", "cada um sabe do seu nariz", "cada um sabe até onde pode chegar". Sabe nada. Sabe uma ova. Enquanto não houver o comprometimento (e o propósito), da maioria, em extirpar esse flagelo social, não se pode transferir, o fardo da responsabilidade, justamente para as costas daqueles que sofrem do mal. Eles, mais do que ninguém, não o sabem o que fazem.
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>>> Carta Capital
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Gastronomia
>>> O Conselheiro também come (e bebe)
Malgrado a vocação gastronômica paulistana, também um símbolo da megalópole, ao qual se recorre com freqüência e de boca cheia, São Paulo ainda estava devendo, aos internautas, um portal à altura de sua fama e de seu potencial. Não mais. O Portal do Sabor, da Editora Abril, chegou para saciar e para educar os famintos e esfaimados, reunindo o melhor do acervo de Veja, Guia Quatro Rodas, Playboy, Vip Exame, Cláudia Cozinha e Boa Forma. São mais de 4 mil receitas (para quem se cadastrar), centenas de bares e restaurantes por todo o Brasil, indicações de cursos de aperfeiçoamento e dicas que remontam ao bê-a-bá da cozinha, comparações entre escolas e regiões, conselhos e segredos dos chefs, sugestões de acessórios e de como tratar os alimentos, glossário gastrômico, livros, pesos e medidas - enfim, a viagem mais completa e minuciosa por esse universo e por tudo o que ele oferece, ao alcance da mão. A equipe que recheia as páginas do Portal do Sabor conta com quase 20 especialistas, despejando forma e conteúdo numa velocidade alucinante (difícil de acompanhar até para os aficcionados pelo tema). A torcida é para que esse time permaneça com o mesmo entusiasmo, despertando e civilizando paladares por meio da Web. Como iniciativa de empreendedores mais experimentados, o Portal do Sabor procura se estabelecer através de parcerias, com clientes e fornecedores - algo que pode se consolidar como uma solução para empresas em situaçao semelhante, quem sabe até tirando a internet brasileira do estágio de água na boca.
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>>> http://www.portaldosabor.com.br
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Teatro
>>> A confusão mais organizada que eu já vi
Elizabeth Bishop está bem representada, no texto de Marta Góes, e na interpretação de Regina Braga. A cenografia, de Jean-Pierre Tortil, e a direção, de José Possi Neto, proporcionam uma das experiências estéticas mais recompensadoras da temporada. Teatro, no Brasil, tem sido, praticamente, texto (em altos brados) e gestual (socos e pontapés no ar). Há que se louvar, portanto, soluções que permitam, ao espectador, vagar por entre imagens e suspender o discurso, com música. Nesse sentido, Um Porto para Elizabeth Bishop aproveita os recursos cênicos, com maturidade, desenvolvendo novas relações: seja do ator com o espaço; seja do ator com a iluminação; seja do ator com as intervenções sonoras. A história é um marco do homossexualismo feminino no País: a poeta americana, então com 40 anos, vem de passagem pelo Rio de Janeiro e termina se apaixonando por Lota Macedo Soares, com quem vive um romance, de 1951 a 1966. Registra suas impressões e, principalmente, seu estranhamento, em cartas e poemas, lidos e encenados, num arranjo bem construído. Desde a sua chegada, hesitante, em Santos, até o sucídio de sua companheira, fora do Brasil, passando pelo Prêmio Pulitzer, pelo Aterro do Flamengo, por Carlos Lacerda, e por 1964. Serve como uma tocante introdução à obra de Bishop, uma das maiores poetisas do século XX, e serve também para provar que sobre este solo já se produziram livros respeitáveis, longe da fama de esterilidade intelectual que paira no ar.
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>>> Sesc Anchieta - Rua Dr. Vila Nova, 245 - Tel.: 256-2281
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Música
>>> I don't belong here
O Radiohead arriscou toda a sua reputação com Amnesiac, último CD, lançado em junho. Como banda, praticamente abriu mão dos instrumentos, erguendo canções a partir do mais extremo minimalismo eletrônico. Depois da primeira audição do álbum, tem-se a nítida impressão de que tudo não passou de uma só música. A postura afirmativa do pop foi, há muito, abandonada, e o Radiohead concentra-se em climas densos e sombrios, evocando as mais profundas depressões de Ian Curtis e do Joy Division. Mais de oito anos transcorridos, desde o estouro com Creep. O grupo sofreu tantas e tamanhas modificações que se tornou irreconhecível. Passos já haviam sido ensaiados e o rompimento, com a geração, com o estilo, com o público, vinha paulatinamente se concretizando, conforme atestam Ok Computer (de 1997) e Kid A (de 2000). O encarte não traz muitas pistas: não contém letras e foi ilustrado com rabiscos, fotogramas queimados, estilhaços e cenas aflitivas. A imagem mais próxima a que se consegue chegar, seja através do ritmo, seja através das inferências sonoras, é a das grandes forças da natureza: o sopro agudo e incontível do vento; a cadência orquestrada e infinita do mar; a opressão e a inevitabilidade das rotinas do Homem. Thom Yorke canta displicentemente, sem o menor cuidado com a voz. Amnesiac não quer ser um disco agradável, e não faz o menor esforço para se deixar compreender. Às vezes, isso pode ser bom. Às vezes, isso pode ser tornar uma coisa insuportável.
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>>> http://www.radiohead.com
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Internet
>>> Por detrás do espelho
Encerra-se a Digital Design World (DDW), no Expo Center Norte, com a intenção de abarcar o que se produz, graficamente, nas principais mídias eletrônicas. Como vedete, previsivelmente, a Web, o grande filão para quem quer vender seu peixe (aquele que ninguém mais compra) sob nova embalagem. Ainda não é senso comum, mas quem não tem sorte com e-commerce, ou não sobrevive de propaganda virtual, parte para a iniciativa de “prover soluções” para a vizinhança. Mais ou menos como num círculo vicioso: se um site não caminha, vai oferecer seu know-how para quem está começando. Como a ignorância tecnológica grassa, e o charlatanismo reina soberano, tem muita gente faturando com a boa-fé alheia. No caso da DDW, não é preciso ser um papa da informática para prever que os maiores estandes e lançamentos ficariam a cargo de marcas como Adobe, Corel e Macromedia, cujos aplicativos e utilitários são quase a “língua oficial” para quem quer criar formas no computador. Dentre os palestrantes, nada mais esperado que um representante da estética Global, como Luis Felipe Cavalcante, membros do universo das artes plásticas, como Cecília Consolo e Luciano Cardinali, sem contar, evidentemente, os jornalistas e publicitários, como Kátia Militello e Lulli Radfaher, respectivamente. Para muitos entendidos, o mundo virtual não passa de uma mera duplicação do mundo real. Não deixam de ter razão. O problema é que ninguém quer desafazer esse encanto, pois ganha-se muito enquanto a ilusão durar.
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>>> DDW
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>>> DIGA O SEU NOME E A CIDADE DE ONDE ESTÁ FALANDO
Roberto Araújo, de São Paulo, diretor da www com br: "Felizmente fizemos as apostas corretas na linha editorial da revista e não tivemos nada a corrigir na compreensão do 'negócio' Internet. Continuamos confiantes que onde tem público, bons negócios sempre dão certo. Não estou vendo isto na minha 'bola de cristal', mas simplesmente usando o princípio de que a rede mundial veio para ficar e seu público não pára de aumentar."
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Julio Daio Borges
Editor
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