DIGESTIVOS
Sexta-feira,
6/3/2009
Digestivo
nº 405
Julio
Daio Borges
+ de 2600 Acessos
|
Imprensa
>>> O fim (da era) dos jornais, por Paul Starr
Paul Starr escreveu, até agora, o melhor epitáfio para os velhos jornais, na New Republic. Talvez porque, de maneira inédita, ganhamos um ensaio de um veterano observador, que não foge aos fatos, que não nega a internet em toda a sua complexidade e que prevê um cenário sombrio "além do bem e do mal". Starr extrapola a extinção, em si, do antigo suporte que conhecíamos como "jornal" e procura entender o que isso significa para a nossa sociedade. O texto lamenta, por exemplo, que algumas cidades dos Estados Unidos corram, atualmente, o risco de perder seu último diário. E se algumas seções do vetusto embrulha-peixe já foram substituídas — até com vantagens — por veículos de nicho, na internet, Paul Starr não acredita que alguma organização, oriunda da WWW, vá assumir a cobertura política de outrora. Não com o mesmo "espírito cívico" — como se um repórter de política, ou de assuntos políticos, se sentisse um legítimo representante da sociedade, fiscalizando, cobrando (e até aperfeiçoando) governos, governantes e governados. Starr remete à invenção da TV a cabo e atribui-lhe a culpa pela programação de "entretenimento" que desviou a atenção das massas dos telejornais. Divorciados das hard news — por pura preguiça mental —, muitos cidadãos se alienariam politicamente, tornando-se lenientes para com a corrupção (este trecho nos soa familiar?). A escassez de cobertura política diária, combinada com uma audiência refratária à realidade em volta, resultaria num retrocesso em termos de civilização. O fim dos jornais, para Paul Starr, não seria um fato isolado, mas desencadearia o fim da era dos jornais...
[5 Comentário(s)]
>>> Goodbye to the Age of Newspapers
|
|
|
Cinema
>>> Na Natureza Selvagem, de Sean Penn
"A alegria de viver surge nos nossos encontros com novas experiências, e, portanto, não existe felicidade maior do que a de ter um horizonte em constante mutação, e, para cada dia, ter um novo e diferente sol". Assim falava Alexander Supertramp. Depois de se formar, Christopher McCandless resolveu mandar uma banana para seus pais "materialistas, manipuladores e dominadores", destruiu todos seus cartões de crédito, livrou-se de todos seus documentos e doou suas últimas economias para uma instituição de caridade, a fim de sair numa cruzada solitária pelos Estados Unidos da América, tendo, como objetivo final, viajar até o Alasca e vivenciar sua natureza selvagem em primeira mão. Até aí nenhuma novidade, em termos de ambição, não tivesse McCandless existido de fato — e realizado tal façanha, rompendo com a família por mais de dois anos, e morrendo, de inanição e fome (por descuido), no mesmo Alasca, sem nunca mais retornar. Foi no início dos anos 90. Jon Krakauer transformou em livro, em 1996, Sean Penn transformou em filme (roteirizando e dirigindo), no ano retrasado, e agora podemos assistir em DVD, com trilha premiada de Eddie Vedder e atuação "hipnótica" (segundo Roger Ebert) de Emile Hirsch — como "Alex Supertramp", codinome de Christopher McCandless, em sua jornada vertiginosa e fatal. Leitor de Tolstói, Thoreau e Jack London, "Surpertramp" deixaria, ainda, um diário, cartas e máximas quase filosóficas: "Tantas são as pessoas que vivem infelizes e que, contudo, não tomam a iniciativa de mudar sua própria vida — afinal, estão condicionadas a uma existência de 'segurança, conformismo e conservadorismo'; os quais, aparentemente, trazem paz de espírito — embora, na realidade, nada possa haver de mais danoso ao espírito humano do que um 'futuro seguro'". Paisagens deslumbrantes e personagens exóticos completam o quadro. A crítica foi praticamente unânime. Afinal de contas, não é todo dia que "o melhor ator de sua geração" realiza, na direção e no roteiro, um projeto tão pessoal.
[7 Comentário(s)]
>>> Into the Wild
|
|
|
Literatura
>>> O Outro, um conto de Jorge Luis Borges
"A cegueira gradual não é uma coisa trágica. É como um lento entardecer de verão", escreveu, ou ditou, Jorge Luis Borges, em um dos diálogos de "O Outro", conto dos anos 70, onde conversa com uma versão cinco décadas mais jovem de si próprio, como num sonho... A ideia — de dar conselhos a si mesmo —, se não era nova, foi copiada, indefinidamente, desde então. Com muita poesia, o velho Borges procurava metáforas que correspondessem a afinidades íntimas, "que a imaginação já aceitou"; enquanto isso, o jovem Borges era ardente, taxativo e, poeticamente, queria "inovar" — ainda que seus "hinos (ou ritmos) vermelhos" remetessem ao verso azul, de Rubén Darío, e à canção cinza, de Verlaine... "O poema ganha se imaginarmos que é a manifestação de um anseio, não a história de um fato", sugere o velho Borges, embora o jovem só quisesse saber de Os Demônios, de Dostoiévski ("o mestre russo [que] mais penetrou[...] nos labirintos da alma eslava")... Idealista, o jovem Borges prometia ser a voz dos que, justamente, "não tinham voz", mas o velho não lhe perdoaria o cacoete ideológico: "Sua massa de oprimidos e párias não passa de uma abstração. Só existem os indivíduos, se é que alguém existe". Rebelde contra os modernismos, era chegada a vez do velho se horrorizar com a contemporaneidade: "Não me surpreenderia se o ensino de latim fosse substituído pelo de guarani"... Perdidos num banco qualquer do tempo, depois de uma conversa (que não poderia ser um sonho), os dois se afastaram, assustados, e combinaram outra no dia seguinte, mas nunca mais voltariam a se encontrar... A história está em O Livro de Areia, relançado ultimamente, dentro da Biblioteca Borges.
[2 Comentário(s)]
>>> O Livro de Areia
|
|
|
|
Julio Daio Borges
Editor
* esta seção é livre, não refletindo
necessariamente a opinião do site
|
|