busca | avançada
52329 visitas/dia
1,9 milhão/mês
Quarta-feira, 14/5/2003
Digestivo nº 133

Julio Daio Borges

>>> SONGS IN THE KEY OF STEVE Tudo indica que o mercado da música vai sair do seu atual impasse. Estamos falando da disputa entre as gravadoras e a pirataria, que, por incrível que pareça, caminha para uma solução. A solução em si, aliás, não parece mirabolante, mas tem todo o jeito de ser “para o bem de todos” – de sorte que os executivos da indústria fonográfica prometem ser menos gananciosos; os consumidores, mais conscienciosos; e os artistas, menos irascíveis. Pelo discurso reinante, todo mundo sai ganhando, mas é preciso conhecer os detalhes. Resumindo a ópera, a história é a seguinte: com a digitalização generalizada, a música caiu na internet, os gravadores de CD se popularizaram e a máfia se organizou. Então, metade da venda de compact discs passou para a mão de atravessadores (esses são os dados apenas do Brasil), ameaçando a hegemonia e mesmo a sobrevivência das “majors”. Acontece que a distribuição de arquivos sonoros na Grande Rede veio para ficar; a “queima” de CDs, em ambiente doméstico, também. E os piratas, obviamente, não querem largar o osso. O que a indústria fez? Primeiro, massacrou o Napster (principal programa que permitia o compartilhamento de faixas na Web). Não adiantou: surgiram substitutos, como o Kazaa. Então a indústria resolveu criar a sua própria versão da coisa, cobrando diretamente o usuário pelo “download”. Surgiram: Pressplay (Universal+Sony) e MusicNet (AOL Time Warner+Bertelsmann+EMI+RealNetworks). Apesar da competição entre os dois modelos, houve até alguma aceitação por parte da audiência – mas ainda não foi dessa vez. Qual o próximo passo? Conseguir um nome “neutro”, para arbitrar a disputa entre as gravadoras, os consumidores e os artistas. Mobilizar, em seguida, a mídia em torno dessa figura, de modo que a sua solução não seja exatamente a “invenção da roda”, mas que seja vista, por todos os envolvidos, “com bons olhos”. Foi o que aconteceu com a entrada, na jogada, de Steve Jobs, o fundador da Apple: o gênio da computação, com respeitabilidade e cacife suficientes para mediar os conflitos e impor um acordo. Pela primeira vez nessa história, os executivos, os músicos e os fãs estão satisfeitos e praticamente “fechados” em torno de uma proposta. Trata-se do “iTunes”, que por enquanto só existe para o Mac, e que vai cobrar 99 cents por faixa “baixada” no formato AAC. O usuário pode ouvir no seu micro, no seu “iPod” (o walkman de Jobs) e até gravar CDs. Mas não consegue converter em MP3, nem distribuir de volta na internet, muito menos aumentar a produção em escala. Vai funcionar? Ninguém sabe, mas a “Fortune” desta semana decidiu investigar – e preparou a melhor reportagem sobre o assunto até agora. O “auê” já promete – e em termos de “showbiz”, às vezes, é o que mais importa.
>>> Songs in the Key of Steve
 
>>> O MUNDO COBERTO DE PENAS Para relembrar os 50 anos da morte de Graciliano Ramos, a Record faz um plano de reedição da obra do alagoano que começa com “Vidas secas” (1938). Embora não seja o seu primeiro livro (o primeiro foi “Caetés” [1933]), é um dos mais representativos, na trajetória de um escritor que – considera-se – só compôs obras-primas. Além de um novo projeto gráfico, em tons pastéis, a edição traz um posfácio de Marilene Felinto, a colunista da “Folha”. Nele, há um esforço de reunir a fortuna crítica em torno do autor. Há também a chave para a criação de “Vidas secas”: numa carta endereçada à sua segunda esposa, Heloísa Ramos, Graciliano expõe as dificuldades na feitura de um conto sobre uma cachorra agonizante: Baleia. E o leitor não precisa conhecer o posfácio para perceber que a história de Fabiano, Sinhá Vitória e sua prole gira em torno da tal cachorra. Ao contrário do que às vezes se considera, é ela a suprema protagonista: quem salva a família da fome, logo nas primeiras páginas (ao caçar um preá); e quem encerra o romance, logo após o seu falecimento, épico (o tal conto que foi a origem de tudo). Ainda que não consuma mais que algumas horas do leitor, “Vidas secas” é denso e resulta de um esforço de concisão poética. Sendo Graciliano o mais importante romancista nordestino, não é difícil aproximá-lo da poesia de João Cabral de Mello Neto: bruta, econômica, vital. É um “escritor de escritores”, para ser saboreado a cada frase, a cada palavra. Dada a sua filiação ao Partido Comunista, e a forte temática social presente em seus trabalhos, a tendência, na segunda metade do século XX, foi de encerrá-lo nas muralhas da interpretação política. Talvez seja hora de reabilitá-lo no domínio estritamente literário, evocando Nélson Rodrigues, para quem não existiria uma “arte da leitura” e, sim, uma “arte da releitura”. Relendo Graciliano Ramos, poderemos redimensioná-lo e readmiti-lo no panteão de nossas influências, hoje tão parcas.
>>> Vidas secas - Graciliano Ramos - 175 págs. - Record
 
>>> BLAME IT ON THE U.S.A. Michael Moore, o documentarista que ultimamente vem agitando os Estados Unidos, prepara-se para desembarcar no Brasil. Com um livro, pela W11, e com “Tiros em Columbine” (“Bowling For Columbine”, 2002) que lhe conferiu um Oscar na Academia. Moore tem uma tese interessante e quer prová-la nos cinemas: – Por que os americanos (do norte) são um dos povos mais violentos de toda a História? Ele percorre o seu país com uma câmera na mão para tentar responder a essa pergunta. Não é preciso raciocinar muito para perceber que Michael Moore critica, no fundo, a mídia. Para ele, e para o autor de “The Culture of Fear” (que presta também seu depoimento), o cidadão americano vive alimentado pelo medo. Conseqüentemente, por uma questão de segurança, arma-se até os dentes e cultiva uma certa animosidade em relação ao mundo exterior. O que faz dos Estados Unidos da América – segundo Michael Moore –, uma das nações mais belicistas de todos os tempos, e o “american people”, um dos mais homicidas de que se tem notícia. Acontece, porém, que Moore usa as ferramentas da própria mídia para forçar, no espectador, essa conclusão: os dados são exibidos em velocidade vertiginosa (sem que se consiga questioná-los); as cenas de violência servem de argumento (a tal “imagem” e as tais “mil palavras”); o sentimentalismo e a aparente indignação das personagens dão o acabamento final, induzindo ao choque e deixando a platéia paralisada. Esse é o calcanhar de aquiles do documentarista: ele é contra a manipulação da mídia, mas manipula igualmente o seu público. Claro, “Tiros em Columbine” não é só isso. Vale pela defesa do Canadá. E, claro, o homem escreveu um livro, onde, imagina-se, deva estar o embasamento para tudo isso. Mas não é obviamente para teses “sociológicas” nem “psicológicas”, como vão sugerir – já podemos advinhar – os articulistas da “Folha”. Um filme (ainda) é um filme – como escreveu alguém. Não passando disso.
>>> Bowling For Columbine
 
>>> MAU HUMOR

“Não se pode confiar em mulheres – nem em pistolas automáticas.” (John Dillinger)

* do livro Mau humor: uma antologia definitiva de frases venenosas, com tradução e organização de Ruy Castro (autorizado)

>>> AVISO AOS NAVEGANTES

O site do Digestivo Cultural passou por problemas técnicos, nos últimos quinze dias, e alguns Leitores acabaram não recebendo os "Digestivos" de número 131 e 132. A esses, o Editor pede desculpas e informa os mesmos boletins que podem ser acessados através dos referidos links.
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

busca | avançada
52329 visitas/dia
1,9 milhão/mês