Quarta-feira,
14/4/2004
Digestivo nº 170
Julio
Daio Borges
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SURVIVING IPO FEVER
E o Google é a mais nova bolha da internet. Quem diria... A internet não tinha acabado? A “bolha” não era uma insanidade financeira relegada ao passado? A nova economia não havia sido apontada simplesmente como a “velha” reciclada? Se os profetas da era digital desapareceram, na aurora do século XXI, os catastrofistas, também. O Google, como todo mundo sabe, começou como uma ferramenta de busca. Diferente do Yahoo! (e do seu equivalente brasileiro, o Cadê?), que começou (começaram) como um “bookmark” (ou “lista de favoritos”, para traduzir). Diferente também do Altavista, que começou como ferramenta de busca – mas que não soube evoluir, pois jamais pôde separar o “joio” do “trigo”. Aparentemente, a grande novidade do Google era “ranquear” os endereços de acordo com a preferência dos usuários (leia-se: através do número de cliques). Seria então uma “busca inteligente”, onde os “melhores” subiriam para as primeiras posições, e os “piores” desceriam para as últimas. Mas isso, aparentemente também, não é um “modelo de negócio”. Ou seja: – Como se ganha dinheiro com isso? Reza a lenda que o Google começou a vender “links” pagos, à direita de cada página – gerando uma taxa de resposta cinco vezes maior que a dos banners: 15%. E, segundo a “Wired” (de março deste ano), pôde evoluir de alguns milhões de dólares (receitas) em 2000 e 2001 para mais de 100 milhões em 2002 e para aproximadamente 900 milhões em 2003. Agora o Google vai para a bolsa de valores. Está bem: antes se desdobrou em serviço de notícias, em “Zeitgeist”, em comunidades virtuais e até – dizem – em e-mail gratuito (o não-tão-secreto-assim “Gmail”). O temor, ainda segundo a revista, é perder a competição para a já anunciada ferramenta de busca da Microsoft (como a Netscape perdeu a guerra dos browsers). Ou crescer tanto a ponto de tropeçar nas próprias fusões & aquisições (Yahoo! e AOL). Ou, por fim, acabar nas malhas da justiça americana, que teoricamente impede o monopólio (Windows, Internet Explorer e Microsoft). Será que o céu é o limite para Larry Page e Sergey Brin, os inventores do Google? Desta vez, a internet não sabe a resposta.
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Wired |
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ALTO ASTRAL, ALTAS TRANSAS, LINDAS CANÇÕES
Gilberto Gil não entendia porque estava sendo preso, depois de declarar que “gostava da maconha”. Caetano Veloso insistia para que Florianópolis fosse incluída na turnê, porque “ele e Gil” apreciavam muito a cidade. Maria Bethânia, irritada se maquilando e concedendo entrevista, declarava que “veado” e “não-veado” era tudo igual. Gal Costa, antecipando a indumentária de Marisa Monte, sorria despreocupada com sua gengiva. Eram, em 1976, os Doces Bárbaros – em 1º de abril de 2004, no telão do Vivo Open Air, armado no Jockey Club de São Paulo. As pessoas se trombavam, com pipocas a tiracolo (eram grátis), nas subidas e descidas – ao mesmo tempo em que pulavam as grades para garantir um melhor assento (reservado). Enquanto isso, o quarteto executava “Fé cega, faca amolada”, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos; justificava seu planejamento (de lançamento) com uma solene “falta de planejamento”; misturava referências orientais com africanas e indígenas; cultivava uma magreza de faquir; transbordava em alegria no palco – num desejo supostamente despretensioso e infantil de transformar o Brasil. Conseguiram? Surpreendentemente, vendo o filme, parece que atribuímos, aos Doces Bárbaros, uma importância que nem eles mesmos, na época, se atribuíam. Como (a)os Beatles. Inconscientes daquilo que realizavam (mudar o mundo), John, Paul, George e Ringo morreriam sem entender o que – naqueles anos – teria acontecido. “Nós éramos apenas uma banda que se tornou muito, muito grande. E é tudo”, resumiria Lennon. “O planeta estava enlouquecendo e, de repente, nós éramos os culpados”, concluiria Harrison. No caso dos Doces Bárbaros, não dá para entender, por exemplo, como um disléxico Gilberto Gil conseguia compor; como uma meninota Maria Bethânia tinha aquela voz de trovão; como um simplesmente altivo Caetano Veloso organizava movimentos (artísticos); como uma arisca Gal Costa arrancaria, outro dia, aplausos de uma platéia embevecida. Se em matéria de atitude os “Bárbaros” não estavam muito longe dos atuais “Tribalistas” (descontando-se o retardo mental destes últimos), a produção musical se revelaria muito menos dependente de seus agentes do que do “entorno”. E se a intuição não mudou nestas décadas, já a realização... quanta diferença.
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Vivo Open Air |
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UM TRONO EM MINHA ALMA
São Paulo fez 450 anos em janeiro, mas nem todo mundo conseguiu processar a efeméride em todos os seus desdobramentos. Um deles foi o livro “A capital da solidão”, de Roberto Pompeu de Toledo, lançado já no ano passado (é verdade), pela editora Objetiva. O autor, também colunista de “Veja”, publicou a mais divertida e informativa crônica sobre a cidade nos últimos tempos. Parte das origens, como indica o subtítulo, revisitando Manuel da Nóbrega, José de Anchieta, João Ramalho, Bartira e Tibiriçá, para desembarcar nos primeiros anos do século XX, quando Oswald de Andrade se enroscava com Isadora Duncan, Ramos de Azevedo conferia nova feição à capital da província e Joaquim Eugênio de Lima concebia a emblemática Avenida Paulista. A tese de Roberto Pompeu de Toledo, lançada logo na introdução, é a de que São Paulo poderia ter falhado como cidade – dado o seu isolamento (a quase intransponível barreira da Serra do Mar, que desanimou os portugueses mas que encorajou os jesuítas). A Vila de Piratininga, que nasceu das disputas entre padres e índios, poderia ter ficado só nisso – mas lançou as “bandeiras” que praticamente descobriram as Minas Gerais; foi entreposto entre o café, do Vale do Paraíba e do interior do (hoje) estado, e o porto de Santos; abrigou uma das primeiras faculdades do País (a de Direito do Largo São Francisco); capitaneou a industrialização e adquiriu importância política ao formar algumas das principais lideranças a partir do século XIX. Como aquele povoado estabelecido às margens do Anhangabaú resultou nesta frenética metrópole – é a pergunta que Pompeu de Toledo indiretamente responde ao longo de mais de 500 páginas. Sua prosa é saborosíssima, misturando dados e informações colhidas em vasta bibliografia com observações argutas e bem-humoradas – como se nos arrastasse para um bate-papo sobre essa cidade com quem convivemos diariamente, mas que conhecemos tão mal. Compreender como ela veio se arrastando desde o Pátio do Colégio, até a Rua Direita, até a Barão de Itapetininga, passando pela Praça da República, subindo a Consolação, espalhando-se por Higienópolis, fixando-se na Paulista (para descer, de novo, do lado oposto) é muito mais que matar uma curiosidade histórica: é também dar o primeiro passo na direção de uma megalópole mais habitável.
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A capital da solidão - Roberto Pompeu de Toledo - 560 págs. - Objetiva |
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>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO*** RECOMENDA
(CN - Conjunto Nacional; VL - Shopping Villa-Lobos)
>>> Cafés Filosóficos
* A Revolução dos Cravos - 30 Anos de Um Novo Portugal - Lincoln Secco (2ª f., 12/4, 19hrs., CN)
* Jogando Cinco Marias - Marcelino Freire, Denise Silveira e poeta Fabrício Carpinejar (3ª f., 13/4, 19h30, CN)
>>> Noites de Autógrafos
* Do Positivismo à Desconstrução: Idéias Francesas na América - Leyla Perrone-Moisés (3ª f., 13/4, 18h30, CN)
* O Baú do Guerrilheiro - Ottoni Fernandes Jr.
(4ª f., 14/4, 18h30, CN)
* Teatro Baiano (1990-2000) - Ana Paula Dantas
(5ª f., 15/4, 18h30, VL)
* Terra de Ninguém - Contardo Calligaris
(Sáb., 17/4, 11hrs., CN)
>>> Shows
* Música das Nações - Duo As You Like It
(2ª f., 12/4, 20hrs., VL)
* Blues In The Air - Traditional Jazz Band
(6ª f., 16/4, 20hrs., VL)
* Espaço Aberto - Carlos Henry e Conjunto Flor Amorosa
(Dom., 18/4, 18hrs., VL)
** Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos: Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional: Av. Paulista, nº 2073
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Julio Daio Borges
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