Quarta-feira,
7/3/2001
Digestivo nº 22
Julio
Daio Borges
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SOU FUNK DA PERIFERIA
Como não poderia deixar de ser, o verão trouxe mais uma onda (que passa junto com o carnaval). Desta vez, o Funk Carioca - que os grandes grupos insistem em elevar à categoria de fenômeno. Em comum com as manifestações musicais mais recentes, o ritmo tem também sua coleção de danças, de expressões e de vocábulos chulos. Como novidade, atrela um certo apelo racial e as raízes que remontam à favela. Os criadores, para variar, não são reconhecidos, e nem tem seus ganhos contabilizados proporcionalmente. Como de costume, o grosso dos rendimentos é desviado para o bolso de empresários, animadores e conjuntos que rapidamente trocam de bandeira. A juventude, transbordando de energia eternamente, se deixa embalar pelos movimentos, pelos dizeres e pela indumentária dos funkeiros. Faz parte. O que não dá para entender é essa raça de intelequituais ditos letrados que agora se esforça para, de repente, desaprender o português.
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O TIGRE E O DRAGÃO
Quase todas as tentativas ocidentais de retratar o Oriente resultaram em simplificações e em falsificações de culturas milenares. Não foi diferente com o filme de Ang Lee. Embora taiwanês, o celebrizado diretor não fez mais que reduzir à pantomima e à filosofia de almanaque algumas das lendas populares que há séculos circulam pela China. Atacado pela síndrome de Roberto Benigni, tratou de empacotar suas tradições de modo a satisfazer as platéias de Hollywood e de Cannes, resumindo uma saga e uma busca existencial ao dualismo mocinho-bandido e aos efeitos de videogame. Ainda que disponha de belas paisagens e dos ases que montaram Matrix, Ang Lee apostou suas fichas no evidente e no óbvio, carregando no sentimentalismo e pintando a mulher oriental como uma figura submissa, ou então como uma rebelde desorientada que, sem o seu homem, está condenada a uma existência vazia.
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O Tigre e o Dragão |
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ESCREVO PARA NÃO PASSAR AO ATO, PARA EVITAR UMA CRISE
Cioran tem editados os seus "Exercícios de Admiração", pela Rocco. Impossível conter o prazer de ler seus ensaios e perfis. O livro fino reúne suas opiniões e impressões sobre Borges ("O azar de ser reconhecido se abateu sobre ele"), Fitzgerald ("É próprio de um espírito de segunda categoria não poder escolher entre a literatura e a 'verdadeira noite da alma'"), Beckett ("É um destruidor que amplia a existência, que a enriquece minando-a"), Valéry ("Em vez de deixar para os outros o trabalho de decifrá-lo, ele próprio o assumiu") e sobre outros autores que conheceu ou cultivou. Senhor de um estilo carregado e excessivo, Cioran não pretende ser imparcial. É veemente e altamente subjetivo. Romeno de origem, adotou o francês como língua e, prevendo o desaparecimento do idioma de Voltaire, sentenciou o seu próprio fim.
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Cioran, o grande pensador do século |
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A HUMANIDADE ESTÁ EM DESLOCAMENTO URGENTE
Sebastião Salgado, o fotografo brasileiro mais reconhecido internacionalmente, está em exposição no Centro Cultural Fiesp. Tendo como tema os refugiados, perseguidos e excluídos do planeta, equaciona as misérias do mundo em termos de ricos e pobres, apenas. Embora tecnicamente irrepreensível, a orientação ideológica do artista acaba comprometendo a espontaneidade de seus retratos em branco e preto. Ainda que persiga as catástrofes e os desastres mais pungentes do nosso tempo, seus painéis - com mensagens prontas e acabadas - evocam as milionárias campanhas publicitárias que bem conhecemos. É natural que seja ovacionado em países como a França, em que a intelectualidade chique observa com horror e fingido interesse as mazelas da África, da América Latina e do Leste Europeu.
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A ALMA ENCANTADORA DAS RUAS
O GNT exibiu um bem realizado documentário acerca do maior cronista carioca do fim do século XIX, início do século XX. Hoje ignorado por alfabetizados e analfabetos, Paulo Barreto foi velado, em 1921, por uma multidão de 100 mil pessoas, num Rio de Janeiro de pouco mais de 1 milhão de habitantes. Dono de um lirismo que formou, para dizer o mínimo, Nélson Rodrigues e Rubem Braga, João do Rio mergulhou nas veias do popularesco, registrando movimentos que iriam desembocar na explosão do samba e no sincretismo religioso que permeia a alma do brasileiro. Homossexual, teve em Oscar Wilde um modelo, consolidando sua visão marginal e distanciada da sociedade que tanto amava. Sérgio Cabral, Bárbara Heliodora, Zuenir Ventura, dentre outros, entoaram suas loas a esse precursor do jornalismo, do teatro e do conto modernos.
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O Homem de Cabeça de Papelão |
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>>> MINHA PÁTRIA É MINHA LÍNGUA
"Seu filho duma... jaca!"
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Julio Daio Borges
Editor |
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