Sexta-feira,
23/9/2005
Digestivo nº 245
Julio
Daio Borges
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FARFALLA
Geralmente quando um adulto sem graça, do mundo artístico ou da mídia, quer fazer graça para o filho que acabou de nascer, ou para o sobrinho que acabou de conhecer, inventa projetos “infantis” – e tenta encaixá-los em sua trajetória. Soa artificial ou bobo, típico de pai (ou tio) babão; embalado pela emoção do momento e sem nenhuma inspiração. Adriana Calcanhotto, felizmente, fez diferente. Primeiro, tomou o gênero infantil (ou a ausência dele) como gênero, e não se dedicou a compor para uma criança específica. Compôs para todas e para nenhuma, e saiu Adriana Partimpim (2004). O disco foi elogiadíssimo, mas os adultos pouco ouviram (ou comentaram) porque pensaram que fosse por demais... infantil (!). Ledo engano. Também agora com o show. Desde Cantada (2002), pelo menos, que todo mundo sabia que Adriana era sofisticada e – atravessando os corredores abarrotados de crianças no Cie Music Hall – pouca gente conseguia entender como Calcanhotto (e Partimpim) iria(m) conciliar os infantes e os papais e mamães (babões). Adriana tirou de letra. Para começar que entrou no palco sobrevoando a platéia, e para terminar que saiu voando (pra lá e pra cá) numa gangorra. Traquinices à parte, sua banda manteve a mesma sofisticação musical e até a aumentou. Quem imaginaria um repertório (aparentemente para crianças) que contivesse, além dos óbvios Vinicius e Chico Buarque (que se dedicaram seriamente ao gênero), também Ferreira Gullar? Pois ele entrou graças a “Um gato chamado Gatinho”, poema por ela musicado do soturno poeta do Maranhão. E quem supôs que a artista reflexiva, com o olhar sugestivamente distante, e a voz seca bossa-novística (reloaded), não se relacionaria com a infância, caiu do cavalo de novo. “Tem crianças na platéia?”, Adriana toda hora perguntava e arrancava gritos do seu (novo?) público. “Eu digo que é um prazer estar aqui e digo isso em todo lugar, mas a diferença é que aqui é de verdade”, Calcanhotto Partimpim ou Partimpim Calcanhotto destilou esse tipo de humor, que, antes, parecia impossível de se encaixar na gaúcha (enganosamente) taciturna. Do palco emanava um colorido todo especial (sonoro e cromático, claro); a diversão estava no ar e os pais (ou as mães) às vezes saltitavam mais do que as crianças. Hoje é comum apelar para a nostalgia da MPB e uma nostalgia que caberia aqui é a do Circo Místico. Pois bem: Adriana, até agora, é a melhor continuadora de Edu&Chico (Partimpins os dois).
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Adriana Partimpim |
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ARCO DA PROMESSA
O que esperar de um romance de Daniel Pellizzari? Pellizzari era aquele que, nos Wunderblogs, não entendia como se podia brigar tanto... por política. Era aquele de delírios juvenis, no livro, e aquele cujo blog, sabiamente, cometeu suicídio. Pois então: quando Pellizzari matou seu Failbetter, fê-lo com um golpe de mestre: introduziu o suspense, dado que anunciava, justo no último post, o término de um romance... Dedo negro com unha – que saiu agora pela DBA. Pellizzari era também aquele com dezenas de fãs no Orkut (sendo que o negócio ainda nem era uma febre), e que cometeu suicídio também lá. Logo, seria temerário, e perigoso, e arriscado, criticar um dos fundadores da já mitológica Livros do Mal (essa menção ao seu currículo não foi esquecida – de tão obrigatória, ela é automática). O fato é que Dedo negro com unha funciona como uma espécie de anticlímax. Não que não se soubesse que a linguagem de Pellizzari poderia ser extremamente rebuscada (que outro autor colocaria a palavra “cousa” no frontispício de um volume?); e não que não se soubesse que Pellizzari era dado a experimentações narrativas, obviamente literárias e, às vezes, até editoriais. O problema é que a verborragia, mais do que soar exótica e mesmo (se se quiser) digna de um virtuose, em Dedo negro com unha, cansa; e o problema é que os experimentos (com as notas de rodapé intermináveis, com os capítulos que vão e voltam) atrapalham o fluxo da leitura e – voilà – o desenrolar do próprio romance. Para alguém com uma experiência como a de Pellizzari, as referências cruzadas seriam mais que naturais e encontrar uma cena que parece ter saído de um conto de fadas, com personagens de nome russo, toques de realismo fantástico e estética de HQ (ou de videogame), não deveria ser surpresa. Afinal, existe qualidade nelas. Ocorre que Dedo negro com unha padece do mal de que tantos primeiros romances (e de que tantas primeiras obras) padecem igual: quer conter o todo, quer abarcar o mundo, quer ser completo e, na medida to possível, total. Termina rocambolesco; quando não abandonado no meio; ou resenhado da mesma maneira grandiloqüente com que foi composto. Daniel Pellizzari tem, auspiciosamente, uma promissora carreira de escritor – mas a dúvida é se ela passa por (ou se embasa em) Dedo negro com unha.
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Dedo negro com unha - Daniel Pellizzari - 174 págs. - DBA |
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PAS DE DEUX
No já clássico documentário sobre jazz de Ken Burns, o baixista de Ornette Coleman, o mesmo do álbum Free Jazz (que inaugurou o subgênero), conta que, de repente, numa apresentação, apareceu um sujeito que posicionou a cabeça estrategicamente à boca de seu contrabaixo (acústico) e ele estranhou. Naquela época, ninguém entendia o tipo de música que faziam, onde parecia que um instrumento ia para um lado e o outro, para o outro (na mesma banda). No meio dessa incompreensão generalizada, subitamente, o baixista se tranqüilizou: o sujeito que queria escutar, com tanta atenção, as notas que ele tocava, apenas na aparência de forma aleatória, era ninguém menos que Leonard Bernstein. O célebre regente da New York Philarmonic (também um dos mais jovens de sua história) sempre flertou com o pouco convencional e quis, corajosamente, juntar o melhor de dois mundos: o da música erudita e o da música popular. Para isso, além de reger, e de marcar época com as suas interpretações (como aquelas para as sinfonias de Mahler), Bernstein compôs... musicais. Sim, musicais da Broadway – que se tornaram tão ou mais famosos (e celebrados) que os seus recitais rigorosamente clássicos –, como West Side Story, Candide e On the Town. Além disso, Bernstein foi precursor em uma outra pequena grande coisa – que hoje Daniel Barenboim brada como feito seu mas que não foi ele quem começou: Leonard Bernstein idealizou uma orquestra multicultural – que atravessasse as diferenças entre os homens, que promovesse a integração dos povos e que, sobretudo, celebrasse a paz. Pois a Montblanc, patrocinadora mundial da Philarmonia of the Nations (o sonho realizado de Bernstein pelas mãos de Justus Frantz), trouxe o seu CD até nós. No justíssimo tributo a Leonard Bernstein, que dá título ao álbum, estão os inesquecíveis trechos de “Maria”, a abertura de Candide e o “Times Square: 1944” de On the Town, entre outros. Bernstein que podia dançar com os Beatles e, no momento seguinte, dialogar com Beethoven talvez nutrisse natural simpatia pelo Brasil. Na falta de confirmação post-mortem, podemos devolver esse sentimento com a mesma intensidade – graças a essa iniciativa, local e global, da Montblanc.
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Philarmonia of the Nations |
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>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA
>>> Palestras
* Encontros Capitais: A mídia e a crise política - Mino Carta
(Ter., 27/9, 19h30, CN)
* Relações entre o analfabetismo funcional e o ensino da Língua Portuguesa - Cloder Rivas Martos, Floriana Toscano Cavallete, José De Nicola Neto, Maria Luiza M. Abaurre e Maria Sílvia Gonçalves
(Qui., 29/9, 19hs., VL)
>>> Noites de Autógrafos
* Da Independência a Lula - Bolívar Lamounier
(Seg., 26/9, 18h30, VL)
* Ser Executivo: Um Ideal? Uma Religião? - Jena Bartoli
(Ter., 27/9, 18h30, CN)
* Mais jovem a cada dia - Sônia Corazza
(Ter., 27/9, 19hs., VL)
* Guia prático de mediação em conflitos - Malvina Muszkat
(Qua., 28/9, 18h30, CN)
* Ouvir o Som - Paulo Zuben
(Qui., 29/9, 18h30, CN)
>>> Shows
* Concerto - Trio Opus 12
(Seg., 26/9, 20hs., VL)
* Show - Big Jam em New York - Traditional Jazz Band
(Sex., 30/9, 20hs., VL)
* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional (CN): Av. Paulista, nº 2073
*** a Livraria Cultura é parceira do Digestivo Cultural
>>> DIGESTIVO 5 ANOS
"Parabéns pelo seu trabalho. Acho que o Digestivo veio para ficar! E vai ficar melhor a cada dia. Beijo."
Marta Fonterrada, Cultura FM
"Parabéns, Julio!!! Parabéns, Digestivo!"
Márcio Seidenberg, revista Ocas
"Happy Birthday!"
Sérgio Augusto
"Julio, parabéns pelos cinco anos! Abração."
Marcelo Kahns, site Nanquim
"Oi, Julio! O Caetano pegou a frase do Pessoa que, por sua vez, a
foi buscar em Pompeu, aquele da Roma antiga. No original
em latim: 'Navigare necesse est; vivere non necesse'. Amplexos nemonoxianos."
Nemo Nox
"Oi, Julio, adorei ler isso... Cinco anos [na internet] já são um tradição milenar! []s."
Vicente Tardin, editor do Webinsider
"Parabéns, Julio. Quem não busca seus sonhos, fica sozinho com eles. Quanto ao Francis, é bom que tenha herdeiros. Indignação e sarcasmo nunca são demais em qualquer tempo. Parabens pelo Digestivo e pela coragem. Esta é a nova mídia, com sua característica inconfundível e principal, a interatividade rápida e os primeiros a descobrir isto fizeram e fazem história.
Eu sou uma escritora virtual, tenho orgulho disto, como meu tio-avô, Manuel Bandeira, foi pioneiro no Modernismo. Nós sonhamos o mundo, dizia Borges. De uma forma ou de outra. Um grande abraço."
Maria Helena Bandeira
"Viva, Julio! Claro que fez bem. Fez ótimo. Vida longa. Além do abraço, beijo."
Silvana Guimarães
"Julio, venho acompanhando cá em meu canto a epopéia do site e gostaria de parabenizá-lo pelo aniversário. O Digestivo Cultural é um dos sites que mais considero e visito, sempre recomendando a amigos e inimigos. Sinta-se igualmente abraçado. Abraços."
Alexandre Sivolella Barreiro
"Falou e disse (tudo?)!"
Celso Mattos
"Ah, Julio, como é bom recebê-lo na intimidade dos nossos esconderijos e como á bom saber que você existe,que você é um presente adorável, raro e maravilhoso, um belo ser humano! Orgulhe-se de ser quem é, apenas um defeitinho encontro em você: frequentar o McDonald's. Não me diga que também bebe Coca-cola! É imperdoável! Está proibido de contribuir com mais uma bala que os USA usam para matar os pobres do mundo, mesmo assim amo você!"
Adeir T. Reis
"Leitor abraçado e feliz com a performance do Digestivo. Que venham os próximos aniversários. Parabéns."
Aurélio Prieto
"Oi, Julio, dia 19 não consegui entrar no DC, então fica para hoje mesmo meus parabéns!"
Marcelo Maroldi
"Oi, Julio! Parabéns, meu amigo, pelos 5 anos do Digestivo. Não é sempre que nos deparamos com um trabalho de tanta qualidade como o seu. Muito sucesso para você e para o Digestivo! Grande beijo."
Thaise Hagge
"Cara, admiro muito sua persistência, coragem e, fundamentalmente, seu talento. Desde o início acreditei nesse projeto e vc sabe disso. Parabéns e muitos anos de vida!!! Os anos de vida serão um privilégio para todos nós, leitores do Digestivo Cultural! Grande abraço."
Alfredo Andrade de Mello
"Prezado Daio, estive fora do ar por uns dias, o suficiente para descumprir o que me prometi: cumprimentar-me logo no começo da semana pela regalia de fazer do Digestivo um hábito desintoxicador e revigorante; não o fiz na segunda, mas a terça está aqui para que eu me regozije – e envie a você meu abraço pela idéia, pela persistência, pela expansão, pela continuidade. Boa semana e muito trabalho!"
Maria Luiza Palhas
"Querido Julio, você deve estar recebendo muitas mensagens pelos cinco anos do Digestivo. São merecidas, pois não é fácil fazer um projeto dar certo como é o caso do Digestivo Cultural. Depois da Flip, andei relendo Clarice e vou mencionar uma frase dela: 'Na verdade, sou atriz porque faço malabarismos de entonação e obrigo o respirar alheio a me acompanhar no texto'. É isso o que o Digestivo tem feito, malabarismos de entonações, suas e de seus colaboradores, obrigando, por prazer, o respirar alheio a acompanhá-lo. Não é a toa que o número de leitores aumenta dia a dia! Parabéns! Comemore como todas as grandes vitórias devem ser comemoradas! Beijo grande."
Vera Carvalho Assumpção
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Julio Daio Borges
Editor |
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