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Sexta-feira, 28/10/2005
Digestivo nº 250

Julio Daio Borges

>>> CONTA OUTRA Maria Rita continua presa ao estigma: ou constrói uma carreira em cima do cânone da MPB (pressão feita por nove entre dez críticos brasileiros)... e segue a trilha aberta pela mãe; ou então abraça a interpretação de jovens autores (não consagrados)... e vive à sombra da mãe. Porque Elis Regina fez, também, as duas coisas – partiu do cânone e se consagrou com O Fino da Bossa (embora inicialmente abominasse João Gilberto e a bossa nova), mas também lançou compositores em que ninguém mais, na época, apostava: Belchior, Fagner, João Bosco e Aldir Blanc. Fora esse dilema, por enquanto sem solução, Maria Rita enfrenta outro: o difícil equilíbrio entre a independência e o mainstream. Ou seja: como manter o mínimo de autoria (autenticidade) em seus trabalhos e, ao mesmo tempo, ser lançada por uma major do disco, que não poupa esforços de divulgação (como o caso escandaloso do i-Pod e até o recurso invasivo do spam)? Portanto, criticar Maria Rita é facílimo. Ou ela está “vendida para o sistema”... ou ela tem “problema de repertório”; ou ela é oportunista e não se desvincula da imagem da mãe... ou ela solta um disco em que “a melhor coisa” é Chico Buarque & Edu Lobo. (Talvez, ainda por cima, esse seja um recurso muito bem urdido pelo marketing da cantora: não importa que não se fale da música de Maria Rita, o que importa é que ela continue sendo notícia...) Enfim. O fato é que o Segundocomo o primeiro –, é um bom álbum. E como são inevitáveis as comparações: Maria Rita tem o mesmo ouvido musical de Elis (ouvido de músico); tem o mesmo faro para autores que estão despontando (Marcelo Camelo e Los Hermanos); e é uma virtuose inegável da interpretação (vide “Muito pouco”, faixa em crescendo, inimaginável na voz de 99% das nossas cantoras). Pode até ter a mão de Cesar Camargo Mariano em Segundo (outra “acusação” comum), mas, se fosse assim simples, teriam estourado igualmente João Marcelo Bôscoli e Pedro Mariano. Algo que não houve. A diferença talvez seja um único fator: Maria Rita.
>>> Maria Rita
 
>>> ARQUETÍPICO Mais até do que Freud, Jung foi vítima da diluição do homem comum. Se Freud foi incorporado à “sabedoria popular” em expressões hoje esvaziadas de sentido como “Freud explica” e “complexo de Édipo”, Jung nem teve essa chance – ou teve, mas de uma maneira ainda mais vaga e caricata. Jung terminou ligado à corrente new age, ao orientalismo de segunda mão e a toda essa massa oportunista de tópicos “espirituais”, “espiritualizados” e “espiritualistas” (o melhor seria “espirituosos”) que permeia todo o boom editorial da auto-ajuda, de Paulo Coelho até autores ainda menos cotados. Pobre Jung: se houve – se é que houve –, algum trabalho sério de sua autoria, em toda a carreira (provavelmente ligado ao popularíssimo tema do inconsciente coletivo), acabou soterrado pelos clichês e slogans de “religiosos” e “sensitivos” sem noção. Infelizmente, é o Jung diluído que prevalece em Jung: Sonhos de uma Vida, peça de Eliana Zuckermann, em cartaz em São Paulo. Jayme Periard (Jung) passeia por instantes biográficos do autor de Memórias, Sonhos, Reflexões, mas é tão óbvio e superficial que todos os seus “momentos” (as suas cenas) poderiam simplesmente fazer parte da vida de qualquer pessoa: o confronto com o pai (e com a família); a descoberta da vocação; o encontro (e a decepção) com o mestre (Freud); o amor, os laços familiares, o casamento (a separação)... Não é preciso ser Jung para ter vivido essas coisas (elas podem ser vividas, estatisticamente, por qualquer pessoa). Traduzindo: não são esses fatos, geralmente apresentados de maneira banal no espetáculo, que fazem de Jung o Jung da psicanálise (e do “esoterismo”, se quisermos acrescentar). Existe uma tendência – nas adaptações populistas de vidas & obras – no sentido de querer aproximar o grande homem do homem comum. São pura perda de tempo, porque todo mundo sabe da singularidade do grande homem. A não ser o homem comum...
>>> Jung: Sonhos de uma Vida
 
>>> OPA! Os podcasters brasileiros aparentemente se dividem entre os faladores e os pesquisadores. Os faladores são habilíssimos em contar “causos”, incrementar com piadas, comentários e informação. Já os pesquisadores mergulham fundo num gênero ou num tema e procuram esgotá-lo em um programa ou até numa série. Faltava alguém que talvez oscilasse entre as duas coisas, mas que principalmente fizesse o contraponto com o rádio. Esse alguém, salvo alguma injustiça aqui cometida, é Ricardo Senise. Seu podcast 5 a 1 tem muito blablablá instrutivo e tem também mergulho fundo em arquivos de épocas ou assuntos. Num programa ele pode entrevistar Fabio Silvestre Cardoso (em Paris ou em Londres) e num outro ele pode proclamar que os (ou “as”) love songs are back again (ou, ainda, escarafunchar o tema não tão óbvio de “I’m just a gigolo/ I ain’t got nobody”)... O interessante é que, embora seja um podcaster, Senise traz à memória os locutores de rádio de outrora – que tinham programas! –, seja espontaneamente (quando evoca as velharias da Transamérica e da Rádio Cidade), seja inconscientemente (quando conduz a conversa ou a apresentação na melhor tradição do dial brasileiro, atualmente morto e sepultado). Outra sacada de Senise – que talvez esteja presente na composição de outros podcasts, mas que no caso dele é mais ululante – é usar a própria internet como ponto de partida para complementar os dados de sua programação. Senise utiliza amplamente – e dá os créditos devidos de – sites obscuros, quando fala, por exemplo, dos anos 80 e de assuntos correlatos ao, digamos, Dia das Crianças... Senise volta e meia reclama da falta de comentários. Não deveria se preocupar: se seguir nesse espírito, será um dos pais fundadores da “podcastologia” no Brasil.
>>> 5 a 1
 
>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA



>>> Palestras
* Autonomia universitária no Direito Educacional Brasileiro - Mônica Mansur Linhares
(Qui., 03/11, 19hs., VL)

>>> Noites de Autógrafos
* Pedra de Luz - Rodrigo Petrônio
(Seg., 31/10, 19hs., CN)
* O Livro do Palhaço - Claudia Thebas
(Qua., 02/11, 15hs., VL)
* Inquilina do Intervalo - Maria Lucia Dalfarra
(Qui., 03/11, 18h30., CN)
* Palmares, Ontem e Hoje - Pedro Paulo Funari e Aline Vieira Carvalho
(Qui., 03/11, 18h30, CN)

>>> Shows
* The Red Hot Peppers - Traditional Jazz Band
(Sex., 4/11, 20hs., VL)

* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional (CN): Av. Paulista, nº 2073
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>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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