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Sexta-feira, 9/12/2005
Digestivo nº 256

Julio Daio Borges

>>> HISTÓRIAS MIRABOLANTES DE AMORES CLANDESTINOS Existe um esforço concentrado no sentido de se conferir à literatura um outro status dentro da vida social. Pois todo mundo sabe: nas últimas décadas, a literatura não fez parte da vida das pessoas. (Das pessoas não diretamente ligadas à literatura.) A Flip, por exemplo, pode ser tomada como um tipo de evento realizado para “pessoas comuns” (e não só para literatos); e o Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira, como um tipo de premiação aberta a outros setores da vida nacional (que não só os “literários”). Assim, mais do que o mérito de ter verdadeiros escritores laureados – como, em 2004, Paulo Henriques Britto e Sérgio Sant’Anna –, e de ter verdadeiros escritores indicados – como, em 2005, Cintia Moscovich e Michel Laub –, o Portugal Telecom esmera-se no intuito de trazer a literatura para o centro da discussão. Seja pela homenagem, este ano, a Érico Verissimo – um grande autor, mas considerado popular e, por isso, às vezes criticado. Seja pela performance, também agora, de Luis Fernando Verissimo, como saxofonista (!) – e, surpeendentemente (para bem), de seu filho Pedro, neto de Érico, como crooner. Não fosse essa abordagem, dessacralizante, seria impensável um prêmio literário que reunisse, além de escritores, editores e profissionais do meio, gente como Nizan Guanaes, que parecia impaciente antes da abertura dos envelopes, como Ruth Escobar, que reclamava nos bastidores de não receber, de seu teatro, nenhum tostão, e finalistas da qualidade de José Nêumanne Pinto e Manuel de Barros. No que se refere ao pódio, Fabrício Carpinejar cantaria, minutos antes, por telefone, a bola de Amílcar Bettega Barbosa (o vencedor), e a crítica literária do Brasil seria, de alguma forma, reconhecida com o segundo lugar de Silviano Santiago. Claro que a literatura brasileira, e os seus sempre desconfiados representantes, ainda está aprendendo a conviver com premiações desse porte... e muitas vezes se sente meio deslocada – mas, pelo valor significativo, não vai tardar a se acostumar.
>>> Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira
 
>>> ADULTS’ SONGS Todo mundo reclama da baixa qualidade da música contemporânea – daquela divulgada pela mídia estabelecida, diga-se de passagem –, mas as pessoas estão preparadas, por exemplo, para o jazz? Não foi o que pareceu durante o evento São Paulo Music Masters, promovido pelo Tom Brasil Nações Unidas, e que trouxe músicos do calibre de Chick Corea, Robert Cray e Billy Cobham. Se jazz é quase sinônimo para improviso, a platéia não parecia querer saber de músicos improvisando, e foi saindo de fininho do meio para frente do show... Chick Corea, por exemplo, certamente um dos maiores expoentes do piano durante o século XX, não deixou por menos: anunciou logo, ao microfone, que todo o material sonoro, a ser apresentado, seria praticamente inédito – e que a audiência abandonasse as ilusões de reconhecer algum trecho, alguma melodia, algum som. Prometeu e cumpriu. O máximo que fazia, além de tocar poderosamente teclados variados, era enunciar a peça que seria executada. Era – para ele mesmo – difícil de definir suas tão recentes composições. A primeira, a que abriu, era “North Africa” – provavelmente evocando, em seu título, e em sua estruturação, a ligação do Brasil, via Rubem Dantas, o percussionista do grupo, com os ritmos latinos, todos aparentados à Mãe África, desde o jazz, claro. Mais para o meio, Corea anunciou certos “ghouls”, que, pela pronúncia, formavam a imagem mental de criaturas emprestadas da ficção científica. Pois quando os “ghouls” efetivamente emergiram, os ouvintes iam e voltavam do banheiro sem saber se a performance estava no meio, no começo, no fim – ou se já havia passado ao bis. Incompreensões à parte, foi uma noite de grande música – com destaque para, além de Chick Corea, o baixista Carles Benavent e o baterista Tom Brechtlein.
>>> Chick Corea & Touchstone (entrevista) | Tom Brasil
 
>>> A LUZ DA OUTRA CASA Hoje é quase moda colocar a palavra “cultura” (e sua variante, “cultural”) em todo lugar. Mas em termos de “espaços culturais”, poucos encontram realmente sua vocação. Com o excesso de oferta de eventos na cidade, e a programação da maior parte dos “centros culturais” caminhando num ritmo alucinante, o paulistano às vezes parece, com o perdão da palavra, uma barata tonta – um mero culturette, sem a bússola da crítica, que abdicou, há muito, da sua função. Aos espaços culturais, em geral, falta “conceito” – na verdade, algum sentido, alguma identidade, que amarre a programação e que oriente o freqüentador. Na contramão desse estado de coisas, felizmente, está o Chakras. Além do consagrado restaurante – pelo qual terminou mais conhecido –, o Chakras Espaço Gastronômico e Cultural estreou, por exemplo, a primeira curadoria dos proprietários Fabiana Vizzani e Miguel Reis, que, por intermédio de Antonio Peticov, estabeleceram contato com o artista multimídia Ivald Granato. De posse das chaves da casa e do ateliê do realizador do Rio de Janeiro, Miguel e Fabiana transportaram, para o Chakras, um pouco da atmosfera que exala dos pequenos seres forjados pelo criador carioca. Não à toa, a mostra se intitula: Personagens à Procura de Autor – também os fruidores? –, numa aproximação com Pirandello, autor do texto teatral clássico. No mesmo embalo criativo, o Chakras lançou, também neste segundo semestre, seu CD duplo, inspirado nos melhores clubs europeus – que permitem aos freqüentadores, igualmente através da música, carregar o espírito especialíssimo da casa para outras paragens. Miguel Reis, aka Djourney, dividiu as pick-ups com Dieter Kornherr, aka DJ Sin Plomo, na última etapa do lançamento – depois de passar por Roma, Ibiza e Sardegna –, em São Paulo, com uma bela festa no próprio Chakras. O ano praticamente se encerrou com uma seção extraordinária de cinema no mesmo Chakras. E 2006 se anuncia, como não poderia deixar de ser, com muitos projetos, de expansão, de reforma, de intervenções e de iniciativas sempre inspiradas. O desejo é de que a assinatura do Chakras, do Miguel e da Fabiana, continue se espalhando mais e mais.
>>> Chakras Espaço Gastronômico e Cultural
 
>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA



>>> Palestras
* Cartas a um jovem empreendedor - Ozires Silva
(Qua., 14/12, 19h00, VL)

>>> Noites de Autógrafos
* Princípios Constitucionais Fundamentais - Carlos Mário da Silva Velloso, Roberto Rosas e Antonio Carlos Rodrigues do Amaral (Coord.)
(Seg., 12/12, 19h00, CN)
* Norma, Contingência e Racionalidade - Luiz Fernando Schuartz
(Qui., 15/12, 18h30, CN)
* Inteligência nos Negócios - Claudio Silveira
(Sex., 16/12, 18h30, VL)
* O Áspite - Ziraldo Alves Pinto
(Sáb., 17/12, 16h00, VL)

>>> Shows
* CD 40 Anos - Traditional Jazz Band
(Sex., 16/12, 20h00, VL)
* Big Party at Livraria Cultura - Banda Liverpool
(Sáb., 17/12, 19h00, VL)

* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional (CN): Av. Paulista, nº 2073
*** a Livraria Cultura é parceira do Digestivo Cultural
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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