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Sexta-feira, 12/1/2007
Digestivo nº 311

Julio Daio Borges

>>> POETA DAS MERCADORIAS Marx e sua análise econômica da sociedade estão de tal forma impregnados no nosso vocabulário, e mesmo no nosso modo de pensar, que às vezes é necessário um livro, como o de Edmund Wilson, para nos revelar esse fato. Ainda que Marx e o subseqüente marxismo sejam, de certa maneira, o tema central de Rumo à estação Finlândia, Wilson se orgulhava de ser um “jornalista cultural”, e o volume que ele dedicou às revoluções em 1940, da Francesa (1789) à Russa (1917), foi, surpeendentemente, o primeiro lançamento da Companhia das Letras, em 1986. O quebra-cabeças se completa com a notícia de que a editora relançou a obra, por ocasião de seus 20 anos, em formato pocket, e com a informação de que Rumo à estação Finlândia teve nada mais nada menos de 13 (treze) reimpressões no Brasil. É certo que Marx e o marxismo acabaram fora de moda neste século: o primeiro foi excomungado na era do capitalismo redivivo e o segundo – já uma massa disforme de idéias no tempo do próprio Karl –, terminou como cacoete ideológico de quem ainda não acredita em coisas como globalização. Por estar há mais de 60 anos atrás de nós, Edmund Wilson não faz campanha nem para este nem para aquele lado: Rumo à estação Finlândia permite, pela isenção, que a quarta capa o chame inclusive de “historiador” – e com seu talento de jornalista, o autor efetivamente nos convence de que as revoluções podem ainda ser emocionantes, e interessantes. De Michelet a Lênin, passando por Renan, Lasalle, Trotski e, claro, Karl Marx e Friedrich Engels, Wilson transita com segurança pela verdadeira História das Idéias – e, independentemente do resultado político, sobrevive galhardamente nos anos 2000. A preço mais acessível, agora pela Companhia de Bolso, o volume de pouco mais de quinhentas páginas pode servir de alento ao jovem leitor com saudade daquele tempo perdido do engagement...
>>> Rumo à estação Finlândia
 
>>> RELIGIOSO, MÁGICO, SOFISTICADO, PROFANO Infelizmente, no mercado, na opinião pública e até no meio artístico, “popular”, em matéria de música, acabou virando sinônimo de popularesco. O termo popular, muitas vezes hoje, se converte em arma política, no sentido de impor, à estética, um apelo comercial e uma demagogia indesejáveis. Assim, somos obrigados a concordar com os alto-falantes, já que eles supostamente representam o gosto da maioria – e ai de quem contra-argumentar: estará sendo, para começar, antidemocrático; e, para terminar, sectário. Mas, quando parecíamos perdidos no labirinto do mau-gosto da soi-disant “música popular brasileira contemporânea”, eis que Benjamin Taubkin e o Núcleo de Música de Abaçaí surgem para nos salvar. Com... verdadeira música popular: sim, sambas-de-roda do Recôncavo Baiano; uma ciranda pernambucana; três temas do Congado Mineiro; e duas peças das Caixeiras do Divino, do Maranhão. De início – para os ouvidos maltratados pelo pagode acrílico, pelo bolero sertanejo e pelo axé bumbum – pode soar, conceitualmente, assustador; porém, basta colocar o CD Cantos do Nosso Chão (Núcleo Contemporâneo, 2006) para tocar que, como proferiu o jornalista Belmiro Braga, surge logo “uma luz calma que torna o mundo maior”. Quem precisa do salvo-conduto do name-dropping, além do piano delicado de Benjamin, de suas harmonias e contracantos, e do trabalho de pesquisa de quase 30 anos do Grupo Abaçaí, vai encontrar: Mônica Salmaso, Teco Cardoso (à flauta) e Paulo Freire (até na viola de cocho). Cantos do Nosso Chão realiza, em outras palavras, a ambição feliz de Dorival Caymmi – de atingir a simplicidade (e a eternidade) de uma “Ciranda Cirandinha”. Numa época de crise de identidade do que se convencionou chamar de MPB, a resposta pode estar, de novo, na tradição.
>>> Cantos do Nosso Chão
 
>>> IT’S DIGITAL, IT’S DANICAST Se a expressão “artista multimídia” não existisse, ela teria de ser inventada para Daniela Castilho. Das artes plásticas à videoarte, passando pela escrita e pela educação (que pode ser também uma arte), não parece haver forma de expressão que a curiosidade de Daniela não tenha ainda tocado e em que seu talento não tenha se manifestado. Pioneira na internet (DaniCast está na Rede desde 1994) e, antes dela, nas mídias digitais, Dani já mexeu com webdesign, já empreendeu na Web, já ganhou dinheiro na época da bolha, já foi blogueira avant la lettre, já expôs em galerias virtuais e já foi convidada para a Bienal de Florença (a física – duas vezes). Antes do reconhecimento oficial, DaniCast já era um ídolo – no mundo dos games (por conta dos add-ons que inventou para o jogo The Sims e que, graças à WWW, se espalharam pelo mundo). Atualmente, além dos cursos em Direção de Arte para Cinema, Dani dá os primeiros passos num documentário sobre seu pai, o maestro Carlos Castilho, e prepara-se para sua primeira “individual”, no Dynamite Pub, cuja abertura acontece no próximo dia 15, segunda-feira, às 20. Ambiciosa como sempre, e sempre no bom sentido, Daniela Castilho vai expor – no espaço que fica na rua Cardeal Arcoverde, nº 1857, Vila Madalena – suas “fotopinturas” (fotos digitais impressas em vinil com pintura aplicada) e seus vídeos (realizados durante o ano de 2006 e disponíveis no YouTube). Como desdobramento, DaniCast quer comercializar, através da internet, tiragens limitadas (e especiais) das mesmas peças numeradas (e assinadas) que estarão em exposição e à venda no pub até 15 de fevereiro. Daniela Castilho nunca precisou apelar para sua árvore genealógica (ao contrário de muitos “artistas” que só tem o DNA, ou nem isso), mas parece reunir os dons de seis gerações de artistas plásticos, músicos, personalidades e ativistas políticos. Lá na ponta, ela comanda atualmente o show com seu primo... Marcelo Camelo. Será que ele vai aparecer para dar uma canja?
>>> Daniela Castilho no Dynamite Pub
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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