Sexta-feira,
26/1/2007
Digestivo nº 313
Julio
Daio Borges
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AQUI VOCÊ ENCONTRA?
As páginas de classificados foram, quase sempre, o ganha-pão dos jornais. Até a chegada da internet, para onde os classificados estão migrando desde meados dos anos 90. No Brasil, a reação dos jornais a esse fenômeno demorou, mas veio, neste mês, com o ZAP. Iniciativa dos detentores dos dois maiores cadernos de classificados do País, os jornais O Estado de S. Paulo e O Globo, o ZAP quer ser o maior portal de classificados da internet brasileira, atacando simultaneamente em três frentes: imóveis, automóveis e vagas para emprego. Apesar de todo o aparato e do marketing, nas respectivas mídias e em publicações especializadas, o ZAP enfrenta, para começar, o crescimento incontrastável dos classificados grátis. O caso mais eloqüente, nos Estados Unidos, é ao do Craigslist, que com uma interface quase primitiva tornou-se campeão de audiência a partir de São Francisco. A ponto de o Google ter lançado a sua versão, o Google Base, dentro daquela cesta cada vez maior de serviços gratuitos. No Brasil, o ZAP, apesar de ter incorporado, numa manobra acertada, o site Planeta Imóveis, ainda enfrenta o ImovelWeb, em parceria com o portal MSN, da Microsoft, o Webmotors, que, de tão bem-sucedido, foi encampado pelo Banco Real, fora o onipresente Grupo Catho, rei do calhau no UOL, permitindo ao candidato que pendure seu CV, por uma semana, de graça, num vastíssimo banco de dados. A chegada do ZAP é, ao mesmo tempo, a prova de que a grande mídia quer estar na internet em peso, novamente, e o exemplo de que grandes marcas off-line já não dispõem da mesma hegemonia na Web, como há dez ou mais anos. O menosprezo pelas novas mídias, pós-estouro da bolha da bolsa de valores em 2000, cobra seu preço também através do estabelecimento de novos players no mercado.
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ZAP |
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UM PRESENTE PARA LUÍS XIV
Maurício de Nassau – pai da invasão holandesa no Brasil do século XVII – teve, em 2006, um bom ano para si, com o lançamento do bastante elogiado perfil, por Evaldo Cabral de Mello, dentro daquela coleção da Companhia das Letras. E a entourage de Nassau recebeu, também, uma homenagem à altura, mais especificamente o pintor Frans Post, com seu primeiro catálogo raisonné (volume único com sua obra completa), pela editora Capivara, de Bia e Pedro Corrêa do Lago. Apesar do termo “invasão”, é sabido e notório que os holandeses, nas décadas em que ocuparam o Nordeste do País, realizaram uma contribuição cultural sem precedentes, a ponto de seu legado ser estudado, justificadamente, até hoje. Esse Frans Post (1612-1680): obra completa é uma amostra exuberante da sensibilidade de Nassau, que, com sua iniciativa de registrar as paisagens brasileiras, produziu, justamente, o primeiro registro que se tem das Américas desde a sua descoberta. Impossível não se deixar transportar para Recife, Olinda, a ilha de Itamaracá e o rio São Francisco, entre outras lindas paisagens, nos 1600s, graças às reproduções e às explicações pormenorizadas dos autores. Além dos Corrêa do Lago, foram convidados Frederik J. Duparc, diretor da Casa de Maurício de Nassau em Haia, para falar de pintura holandesa do século XVII, e George Gordon, diretor da Sotherby’s de Londres, para analisar tecnicamente a pintura de Frans Post. Esse catálogo, além de ser um feito de importância artística mundial, é um acontecimento em matéria de história da arte brasileira, até para lembrar que, sim, o Brasil inspirou (e ainda inspira) grandes homens a grandes realizações.
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Frans Post (1612-1680): obra completa |
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WILD MAN BLUES
A clarineta é um instrumento muito caro à música. Sua sonoridade é sempre suave, bastante reconhecível e, não raro, envolvente. No jazz, Benny Goodman não conseguia largar da sua; mesmo já sendo o Rei do Swing, quis, numa certa época, explorar o repertório clássico, obsessivamente, comme d’habitude, com sua filha ao piano. Woody Allen, estridente e clownesco atuando nos próprios filmes, prefere se resguardar, num club em Nova York, quando vira clarinetista amador (mesmo que no documentário a esse respeito, de 1997, procure parecer jovial e despreocupado com a auto-imagem). Ainda no repertório clássico, Mozart foi o primeiro a integrar o instrumento ao universo da chamada música de câmara, e Brahms, lá na outra ponta, não deixava de arrebatar a si próprio, e aos seus, quando produzia partituras para clarineta e cordas. No Brasil, em 2005 (com repercussões em 2006), Cristiano Alves e Tamara Ujakova resolveram gravar um CD, pelo selo Biscoito Clássico, só com o repertório brasileiro para, respectivamente, clarineta e piano. O disco abre belamente com Villani Côrtes, suas peças Luz e Águas Claras (recentes), passa por Estudos de José Siqueira, se deixa embalar pela Valsa-Choro de Osvaldo Lacerda, alça vôo com a Sonatina para clarineta e piano, de Ernest Mahle e encerra, comme il fault, com o inevitável Heitor Villa-Lobos, e sua Fantasia Concertante para clarineta, fagote e piano. Marcas D’Água é um álbum, no mínimo, revelador – uma vez que, da música erudita brasileira, estamos mais acostumados a ouvir peças com considerável dose de orquestração ou, com sorte, alguma coisa escrita para piano ou, mais raro, para violão. Para nossa música – quase sempre relegada a uma parcela pequena do repertório anual de concertos e a uma fatia cada vez menor do dial (AMs e FMs) – Cristiano Alves & Tamara Ujakova estão fazendo um verdadeiro trabalho de resgate.
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Marcas D’Água |
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Julio Daio Borges
Editor |
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