Sexta-feira,
16/10/2009
Digestivo nº 436
Julio
Daio Borges
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O KINDLE NO BRASIL
Se o Sony Reader ameaçava conquistar mais rápido os leitores brasileiros de livros eletrônicos, a Amazon não deixou o Kindle para trás e resolveu liberar seu uso para quase o mundo todo. Se antes o leitor eletrônico da maior livraria da internet só funcionava perfeitamente nos Estados Unidos — porque exigia conexão via rede de telefonia celular (e "não conversava", por exemplo, com a rede do Brasil) —, agora a Amazon está anunciando que o Kindle poderá "baixar" livros tanto em São Paulo, quanto no Rio, quanto em qualquer outro lugar, do nosso País, onde haja um sinal para celular. A novidade é auspiciosa, sobretudo para os consumidores de livros em inglês, que, se tudo der certo, não terão mais de desembolsar um alto valor pelas edições importadas (mais o frete, mais a espera). O anúncio promete o desembarque, seguro, de lançamentos, em língua inglesa, em segundos, por uma fração do preço (livros eletrônicos são mais baratos do que livros impressos), mesmo no Brasil. Embora a revista Super Interessante de setembro tenha indicado — em matéria especial sobre livros eletrônicos — que a Câmara Brasileira do Livro está preocupada com o avanço da nova tecnologia, o fato de não haver lançamentos em português ainda disponíveis, no site da Amazon, é um indício de que as vendas, de volumes impressos, não tendem a ser afetadas pelo Kindle no nosso País. Mas é uma questão de tempo até que isso aconteça. Quais serão os próximos passos de editoras, livrarias e distribuidoras brasileiras? Talvez esses passos já estejam sendo dados, mas a chegada do Kindle, agora, obriga todo um setor a apertar o passo. Vale dizer que, entre as indústrias atingidas pela digitalização (e pela internet), a do livro impresso foi uma das que menos sofreu, ao contrário da indústria fonográfica, da cinematográfica (DVDs) e até mesmo da gráfica (de revistas e jornais). O compartilhamento de PDFs na rede não prejudicou a venda de exemplares como, digamos, a troca de arquivos MP3 prejudicou o formato CD. O teste dos cinco sentidos, que vinha salvando o livro impresso da digitalização, vai ser posto à prova, como nunca, com a internacionalização do Kindle.
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Kindle Wireless Reading Device (6" Display, International Wireless, Latest Generation) |
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NA CABEÇA, DE MARCOS SACRAMENTO, AO VIVO
Marcos Sacramentos pôs abaixo o Sesc Vila Mariana, numa quinta-feira deste início de outubro, cantando o repertório de Na Cabeça, seu último CD. Preservando fidedignamente os arranjos, trouxe, a São Paulo, o trio de violões que conferiu, ao álbum, uma identidade toda própria. À esquerda do palco estava Luiz Flavio Alcofra, também compositor, e, como Marcos disse, parceiro de uma década; à direita, Zé Paulo Becker, autor da impressionante "Canto de quero mais" (com direito a interpretação apoteótica de Marcos); e, no centro, Rogerio Caetano, o prodígio das 7 cordas (mesmo em sua bonomia, responsável pela maioria dos solos). Para completar o conjunto, a participação de Netinho Albuquerque, "uma escola de samba portátil" (Marcos), ao pandeiro, do meio do show em diante. A abertura foi uma perfeita recriação das primeiras faixas do disco, com Marcos Sacramento acertando tudo, em termos de afinação, ritmo, dicção e volume de voz (como sempre faz). "Na Cabeça", a faixa título, veio seguida de "Minha Palhoça", que deu sequência a "Um Samba", a oceânica composição do mesmo Marcos, e "Dia santo também". A densidade começou a aumentar, depois desse "aquecimento", com "Calúnia" e "Pavio" (dedicada ao Rio), ambas de Alcofra (a última com Sérgio Natureza). Noel Rosa fez uma primeira aparição em "Triste Cuíca", com trejeitos hilários de Marcos; e ninguém menos que Elis Regina reencarnou, no palco, com "Cai dentro", o clássico de Baden Powell e Paulo César Pinheiro (simplesmente irreproduzível depois dela; a não ser por Marcos Sacramento). "Sim", de Cartola (que não poderia faltar), evocou a versão de Ney Matogrosso, que pareceu até pálida. "Lamentos do morro", de Garoto, foi o pequeno show de virtuosismo do trio de violões. E um respiro. O bloco final foi de não deixar pedra sobre pedra, com "Último Desejo" (de Noel), numa de suas melhores interpretações de todos os tempos; "Bambo da Bambu", registrando o virtuosismo do próprio Marcos (cantando numa velocidade inumana); "Morena", recriada pelo artista desde seu registro com o compositor Maurício Carrilho; e "A Rosa", de Chico Buarque — viva, ressuscitada, genial e hilariante. O bis ainda brindou o público com "Baião da Penha", a mesma de Luiz Gonzaga, travestida de samba. Marcos Sacramento permanece, sem concorrentes, como o maior cantor do Brasil contemporâneo — quem ainda tem dúvidas, que vá vê-lo ao vivo...
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Marcos Sacramento |
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ANJOS E DEMÔNIOS, O FILME, COM TOM HANKS
Se O Código Da Vinci foi uma adaptação atabalhoada do best-seller, cercada de enorme expectativa, a versão cinematográfica de Anjos e Demônios, por parecer menos pretensiosa, funciona como entretenimento de primeira (agora em DVD). Esqueça a erudição forçada do primeiro filme; esqueça as explicações pormenorizadas, e intermináveis, do personagem de Tom Hanks; e esqueça, ainda, o desejo frustrado de misturar blockbuster com alta cultura. No segundo filme, Hanks passa menos por uma "enciclopédia ambulante" do que por um homem de cultura; as explicações ainda existem, mas, como alguém já se disse, elas "casam" melhor agora com a trama e, principalmente, com a velocidade dos acontecimentos; e, para completar, Anjos e Demônios não parece "alta cultura para dummies", ou um "milkshake de humanidades" para quem não gosta de ler; o filme não vai transformar ninguém em "literato" — e nem pretende —, mas vai envolver o espectador numa boa aventura, com final surpreendente. (Não é, exatamente, "sétima arte", mas está OK para cinema.) Para os fãs de Dan Brown, a ordem dos livros não bate — mas Ron Howard, o diretor, preferiu assim, porque, no cinema, o público já conhece o herói (logo, esperava uma sequência — não uma aventura prévia). Fora isso, Howard observa, acertadamente, que muitas pessoas leram Anjos e Demônios depois de O Código Da Vinci (por causa do sucesso deste). No mês que vêm, coincidentemente ou não, chega às nossas livrarias O Símbolo Perdido, a sequência anunciada do Código, que demorou cinco anos para ser composta e que apresenta mais uma aventura do professor Langdon. Poe inventou, sem querer, as histórias de detetive; e o detetive clássico, para nós, é Sherlock Homes, de Arthur Conan Doyle. É habilidosa, portanto, a capacidade de Brown em transformar um scholar (ou wannabe) em detetive. Numa época de ostentação, e ainda de culto à imagem, é, de certa maneira, reconfortante que alguém possa acreditar que um estudioso ainda consiga salvar o mundo... O irônico, disso tudo, é que essa crença se espalhou graças a um "arrasa quarteirão"... e nada indica que seus cultores tenham recebido a mensagem — alimentando o desejo, saudável, de saber mais e conhecer, mais profundamente, o mundo.
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Anjos e Demônios |
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Julio Daio Borges
Editor |
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