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Quarta-feira, 15/8/2001
Digestivo nº 45

Julio Daio Borges

>>> HELLO, DOLLY! O PT está provando que vale para ele a mesma regra que para os jovens (se for possível parafrasear Nélson Rodrigues): o PT tem todos os defeitos dos outros partidos e mais um, o da inexperiência. Quem acompanha os jornais, tem constatado a fogueira das vaidades em que se transformou a cúpula do partido, por conta do romanceco de Marta Suplicy com Luis Favre. Eduardo Suplicy já andara espalhando por aí que o presidente de honra do PT não simpatizava muito com a sua (hipotética) candidatura à Presidência da República. Agora deu para acusá-lo de prejudicar sua estabilidade emocional pois, segundo consta, Lula teria estimulado o enlace entre a prefeita e o "consultor para assuntos internacionais". Administrativamente falando, as coisas não vão nada bem em São Paulo, e o PT recorre aos mesmos ardis que condenou outrora. A CPI do Lixo, que originalmente investigaria os contratos suspeitos das empresas que patrocinaram a campanha de Marta, de repente, foi neutralizada: vai revisar os contratos desde Jânio Quadros (1987), e ameaça ser presidida e "redigida" por vereadores do PT. O programa do Leve Leite (uma marca registrada dos anos Maluf-Pitta) continua com os preços superfaturados: são R$ 976 mil de prejuízo ao contribuinte por mês. O déficit da Previdência paulistana gira em torno de R$ 1 bilhão, e a União anuncia que abocanhará um pedaço maior do orçamento da cidade (caso São Paulo não consiga equilibrar suas contas). E como o PT planeja reverter esse quadro? É simples: a prefeitura comprará espaço publicitário no horário nobre da televisão e, pela bagatela de R$ 2,4 milhões, vai propagandear as realizações do Começar de Novo, do Renda Mínima e do Bolsa Trabalho. Quem dá as dicas é a agência DPZ, e o marqueteiro do Doutor Paulo. Nada mal para 8 meses de governo. Na política, o Brasil tem produzindo imitações sempre melhores do que o modelo original. (E olha que nem começamos a clonar.)
>>> Jornal da Tarde
 
>>> TELEGUIADO S/A Mais uma entrevista bombástica em que uma celebridade televisiva instantânea "conta tudo". É Carlos José de Araújo Pecini, ou então Cazé Peçanha, na revista Trip de agosto, afirmando que seu programa saiu do ar (da Globo) porque não tinha "nem peito, nem bunda, nem (ninguém) famoso". Ele aparece em cima de um televisor estraçalhado por uma marreta, em pose triunfal (de quem, com o gesto, está pronto para conquistar o mundo). Se Carlos Pecini ainda tivesse cabelo, a produção providenciaria uma ventania, para dar mais efeito à pose, e ao gesto. Enfim. E pensar que muita gente ainda compra isso na banca, achando que é tudo verdade, que ele está mesmo querendo quebrar as regras. Só se for as regras da menstruação. Algumas contradições gritantes saltam da boca dessa gente que se diz rebelde, que se diz alternativa (literalmente), que se diz inovadora da "linguagem televisiva" (sic), mas que, na primeira oportunidade, corre para os braços de Marluce Dias. Original mesmo seria encontrar um depoimento de alguém que tivesse sido convidado, mas que não tivesse aceitado, bem ao estilo "me chamaram mas eu não fui". (Será que essa gente ainda existe?) Não, não existe. A tevê de massas é um caso perdido. (Será mesmo? Por que então todo esse esforço para tentar salvá-la? Por quê tanta discussão em torno desse aparelho sem sentido?) Aí é que está, não é nada disso. Ninguém quer salvar ninguém. Ninguém quer converter a invenção em algo "positivo". São apenas meia dúzia de intelectuais (ressentidos), que ficam tentando provar-se "superiores" ao que é "popular" (e a tudo o que dele deriva). Não adianta, ninguém escapa. Quem nasceu a partir do século XX, só se contenta mesmo com audiência, e com ibope (no duro). Vai dizer que não queria sentar na cadeira do Roberto Marinho, e decidir o que é bom e o que é mal para o Brasil?
>>> Revista TRIP
 
>>> PRINCESINHA DO MAR Ainda não foi com Copacabana que Carla Camurati se consagrou como cineasta (embora elogios rasgados já a tenham elegido faz tempo). Desde que foi apontada como musa do renascimento do Cinema Brasileiro, tudo o que Carla Camurati toca vira ouro (é o que afere a crítica especializada). Carlota Joaquina tinha lá a sua diversão como sátira (para alguns, de gosto duvidoso), mas valia como primeira tentativa. Copacabana, porém, expôs a diretora e, por conseguinte, todas as suas falhas, que são muitas. Novamente aquela pretensão (frustrada) de querer revisar a História. O blablablá sobre o surgimento da Nossa Senhora de Copacabana funciona como desenho animado logo no início da fita, mas acaba se perdendo na vocação mundana do resto do filme. As aparições do hotel da Família Guinle, o Copacabana Palace, são tantas e tão recorrentes que a impressão que dá é que Carla Camurati planejava contar a história do "Copa", mas como não conseguiu, teve de juntar os cacos e montar um longa mais humilde. Também não funcionou. Marco Nanini faz 90 anos, mas teve uma vida tão comum e prosaica que quaisquer episódios que evoque de sua existência comezinha não são suficientes para despertar a atenção do espectador, que fica se perguntando: "E daí? Qual a graça?". Para não dizer que é tudo um desperdício, a montagem se salva e o resultado (visual e sonoro) é, sim, de Primeiro Mundo. A trilha é até interessante (afinal qualquer coisa que cante o Rio e não seja bossa-nova já merece um prêmio pela criatividade). Pena que, mesmo a música tema, apele para aquele ranço de "mundo cão", que os realizadores brasileiros tanto adoram. Prostituição, por exemplo, é quase um lugar comum em Copacabana. O Rio, por mais vilipendiado que esteja, merecia mais do que loucos, aposentados e foras-da-lei. (Vide a cinematografia recente.) As verbas governamentais e as leis de incentivo, também.
>>> Carla Carmurati
 
>>> PAYING DEBT TO KARMA O que significa ouvir o Depeche Mode hoje em dia? Sofrer de nostalgia, tentar alcançar a onda eletrônica, ou comprar um disco por engano? Provavelmente tudo junto, ao mesmo tempo. Afinal, as modulações de voz de Dave Gahan continuam lá (para quem tiver saudades de seus graves e agudos), o trio assimilou os loops e o minimalismo da geração atual (engrossando o coro dos niilistas), e Exciter é um álbum que fisga eficientemente os incautos (desde a capa, a contracapa, até a produção apurada). Em todo caso, é curioso lembrar que, no Brasil, as lamúrias dessa turma (que efetivamente flertou com o suicídio) sempre foram interpretadas e dançadas como um ato de liberação e alegria (vide os hits I just can't get enough, Strangelove, Enjoy the Silence, It's no good). Para que se tenha uma idéia, as canções que têm mais chance de emplacar nas pistas paulistas contêm versos como "We are the dead of night" (The Dead of Night) e "It's the dark night of my soul" (I Fell Loved), mas não surpreende que sejam entoadas como as mais vivazes declarações de amor. Independentemente disso, aqueles que se identificam com o som do Depeche Mode têm um motivo adicional para comprar Exciter: Airto Moreira, um percussionista brasileiro, toca em duas faixas, uma delas muito delicada e positiva, Freelove. Aliás, se existe real novidade nesse lançamento, é porque decorre essencialmente das baladas: Shine, When the body speaks e Goodnight Lovers apontam para uma espécie de lirismo esperançoso, de quem dá conselhos. Superada a depressão mais aguda, é realmente auspiciosa a notícia de que Gahan, Gore e Fletcher continuam em forma.
>>> http://www.depechemode.com/
 
>>> PORTEÑO, MILONGUERO Y VARÓN Escondido numa rua menos badalada de Moema, está o Parrilla Puerto Madero, uma autêntica churrascaria (com todas as implicações boas e más que essa palavra suscita). Oferece primordialmente nacos de carne, porções e entradas generosas (de uma fartura nunca antes vista). Outros restaurantes primam pela decoração ousada, ou então pela atmosfera envolvente, ou ainda pela desenvoltura dos garçons, mas o Puerto Madero não, o negócio deles é o produto final, e se o interesse for de se esbaldar (sem necessariamente ser fino e bem educado), o local é lá mesmo. Em estações de vacas magras (e de crise argentina), é notável que, num restaurante, os pratos mal caibam à mesa, exigindo (de quem serve) verdadeira engenharia e logística. Surpreendemente, porém, os preços não são exorbitantes e, aos finais-de-semana, o Puerto Madero vive tomado por famílias, e entusiastas de um bom bife. À parte o universo da gastronomia, é interessante notar que o dono do estabelecimento teve também preocupações eminentemente práticas. É possível, por exemplo, entregar aos manobristas o automóvel e, no final, recuperá-lo limpo e asseado (um lava rápido, bem na frente, do mesmo proprietário, dá conta do recado). Hoje em dia, em São Paulo, a clientela quer tranquilidade, e aprecia enormemente que pequenas questões do dia-a-dia sejam resolvidas sem esforço, e num piscar de olhos. Moema, um bairro originalmente residencial, vive pipocando com bares e "casas de comida" (como se diz em Buenos Aires), nesse contexto, a estratégia do Puerto Madero (de fixar-se no utilitarismo e na saciedade da freguesia) pode ser um tremendo diferencial.
>>> Parilla Puerto Madero - Rua Canário, 408 - Tel.: 5051-1628
 
>>> DIGA O SEU NOME E A CIDADE DE ONDE ESTÁ FALANDO
Rodolfo Gonzalez, o rei da mordomia em São Paulo: "Antes o mordomo era mais para fazer pompa, hoje ele é um facilitador e, às vezes, uma grande orelha atenciosa. Já fiz barricadas de toalha com o Luís Miguel e cozinhei para o Plácido Domingos. Os mais estrelados são assim, na maioria das vezes, mais simples do que água."
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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