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Sexta-feira, 5/3/2010
Digestivo nº 456

Julio Daio Borges

>>> O FIM DO PAPEL COMPARADO AO FIM DA MÚSICA Quem ainda acredita naquele velho papo de que "uma mídia não substitui a outra" (geralmente porque trabalha numa mídia que ameaça ser substituída), deveria ler o relatório E-Books: The Next Killer Application?, de Sampo Timonen, diretor da divisão de papéis gráficos para a Europa, na RISI. Timonen, ao contrário de muita gente que finge que não se abala com as mudanças trazidas pela digitalização, é um representante da indústria do papel, mas anda tão preocupado com o futuro que decidiu, sem rodeios, abordar o assunto. Em seu artigo, parte logo para o "pior cenário" e constrói uma analogia com a combalida indústria musical. Usando dados da própria indústria fonográfica (disponíveis na Wikipedia), Sampo nos conta que, antes da internet, a "canibalização" teve início já com a fita cassete. O LP teve seu auge em 1981, com 1,1 bilhão de unidades vendidas. Ocorre que o walkman (alguém se lembra?) surgiu no horizonte em 1979 e, até 1988, o mercado de fitas cassete foi crescendo 13% a cada ano (mesmo com a qualidade sonora inferior). Enquanto isso, a venda do LPs caiu 39% de 1981 até 1986; 74% até 1991; e 98% até 1996. Lógico que o CD já havia surgido nos mesmos anos 80 — e cresceria, na casa dos dois dígitos anualmente, nos 1990s. Enquanto isso, a fita cassete experimentaria seu auge em 1989 (com 1,54 bilhão de unidades vendidas), para decair 12% até 1994, 45% até 1999 e 76% até 2004. Já o CD chegaria ao topo do mundo no ano simbólico de 2000, com 2,45 bilhões de unidades vendidas. E, com o advento do MP3, o compact disc despencaria, logicamente, 21% até 2005 e 45% até 2008. Hoje, 95% da música que circula ou é distribuída de graça ou é ilegal mesmo. "Isso tudo poderia acontecer com o papel?", Sampo Timonen se pergunta no meio do texto. Para responder que já aconteceu (alô, jornalistas) com a mídia impressa — cuja demanda caiu 16% de 1999 (o pico) até 2004; e 57% (mais da metade) até 2009. Se a analogia realmente funcionar, a demanda por notícias impressas deve cair, segundo Sampo, de 75 a 98% nos próximos 5 anos. E para aqueles que tentam se convencer de que "o papel nunca vai morrer", afirmando que o velho LP triplicou suas vendas nos últimos 3 anos — afinal "uma mídia não substitui a outra" etc. —, Sampo Timonen informa que o long play, em sua gloriosa ressurreição, alcançou exatos 0,8% do que vendia no seu auge (despencando outros exatos 99,2% de 1981 até hoje)...
>>> E-Books: The Next Killer Application?
 
>>> A ARTE DE MEDITAR, DE MATTHIEU RICARD Um dos maiores imperativos dos últimos tempos, em conversas sobre administração (do que quer que seja), é "tenha foco". Pessoas "desfocadas" — não confundir com o personagem de Woody Allen — geralmente atiram em todas as direções e não acertam em quase nada. Ter "foco" significa, além de persistir, ter um objetivo claro em mente e não ceder às distrações de cada momento. No mundo do Twitter, isso parece quase uma impossibilidade filosófica — mas existe uma saída. Por incrível que pareça, chama-se meditação. Meditar não é levitar, andar sobre as águas ou tentar mover uma montanha com a força do pensamento. Também não é uma religião. É, na falta de melhores palavras, a prática da concentração. Quem medita, não fica num esforço inútil olhando para o nada e, milagrosamente, chegando a grandes conclusões. Simplesmente aprende a se concentrar num objetivo; ou — no modo mais avançando — a se concentrar na própria concentração. E o exercício diário da meditação traz benefícios para outras situações de "não-meditação". No trabalho, por exemplo. Quando é preciso mudar de uma tarefa para outra, e entrar rápido num outro assunto, concentrar-se nele, resolver o problema e passar à próxima atividade. No trânsito. Quando alguém te xinga e você, respirando fundo, evita bater seu carro, perseguir o agressor ou, até mesmo, xingá-lo de volta. Nos relacionamentos. Quando você consegue olhar a situação "de fora". E tomar uma decisão mais objetiva, mais ancorada na realidade — menos pessoal, menos baseada em suposições... Claro, a meditação também serve para valorizar a vida, para aproveitar, melhor, cada segundo e para exercitar a compaixão. Mas nem todo mundo quer virar o Dalai Lama. Para quem não quer — ou não pode — virar monge, a editora Globo lançou A Arte de Meditar. Não é autoajuda e não é filosofia barata. É um guia prático, e rápido, para quem quer se exercitar — digamos assim — na própria concentração. Quem escreveu foi Matthieu Ricard, o embaixador do budismo na França, mas não se trata de um guru com mensagens vazias ou abstrusas — A Arte de Meditar foi escrito para pessoas como nós. Afinal, o Twitter pode nos salvar — e nos matar também...
>>> A Arte de Meditar
 
>>> FESTIVAL DE CURITIBA 2010 A moda mais recente, depois da invenção da Flip, é a dos festivais literários. Escritores, editores, críticos e interessados, reunidos num único local ou numa única cidade, para viver e respirar literatura durante algumas horas ou alguns dias. Pode parecer estranho para quem não lê, mas a Flip lota Paraty todos os anos, a ponto de a cidade já ter ficado sem luz — no dia mais cheio — quando os literatos resolvem sair para jantar... Se a Flip começou nos anos 2000, o Festival de Teatro de Curitiba está chegando à sua 19ª edição em 2010. São, em meados de março, quase duas semanas dedicadas às artes cênicas, na capital paranaense. No reino da dança, por exemplo, o destaque vai ficar por conta da São Paulo Companhia de Dança (são grupos do Brasil inteiro e "de fora", também). Já no circo — não é o exorbitante "du Soleil" — o destaque fica por conta do Grupo Tholl (representante do "novo circo", ou do que quer que isso seja). Entre os musicais, no embalo do "Ano da França" ainda, Oui, Oui... A França é Aqui — A Revista do Ano, e revisitando o mestre Ariano Suassuna, A Farsa da Boa Preguiça. E por falar em comédia, ressurge Mário Bortolotto, com Música para Ninar Dinossauros. Também o italiano Dario Fo, um dos nobéis mais desconhecidos de literatura, com O Papa e a Bruxa. E, já separada de Gerald Thomas, a Companhia de Ópera Seca dá as caras com Travesties, de Tom Stoppard. Ainda, Produto, de Mark Ravenhill, um dos representantes da Generation ecstasy, e Dulcinea's Lament, direto do Canadá, homenageando Dom Quixote. Paulo Leminski igualmente ressurge com Vida e o Grupo Galpão viaja no tempo com Till, a saga de um herói torto. Nos dramas, Christiane Torloni dá o ar da graça em A Loba de Ray-Ban e Lygia Fagundes Telles, adaptada por Maria Adelaide Amaral, tem seu livro As Meninas encenado. Memória da Cana evoca Álbum de Família de Nélson Rodrigues e Ana Cristina César é resgatada em Um Navio no Espaço. Bia Lessa retorna, depois de 5 anos, com Formas Breves, e Nosso Estranho Amor (não é o filme da Xuxa) se baseia nas novelas do recorrente Beckett. Os clássicos serão bem representados por Macbeth, com Renata Sorrah e Daniel Dantas. E os monólogos terão Beth Goulart em Simplesmente eu, Clarice Lispector. Fora tudo isso, o Fringe, uma arena para a experimentação livre, oferece 368 espetáculos nos 13 dias do Festival. Não é à toda que o de Curitiba é o maior do Brasil. E não seria mal se os nossos literatos flertassem, mais, com a velha e boa dramaturgia.
>>> Festival de Curitiba 2010
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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