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Sexta-feira, 11/11/2005
Deus ex machina

Julio Daio Borges




Digestivo nº 252 >>> O problema de espetáculos unânimes como Os Sete Afluentes do Rio Ota é que a sua consagração se impõe quase como uma norma e as suas idéias, incondicionalmente assimiladas, não são discutidas de fato. Alguns fatores contribuem para a consagração peremptória. O primeiro é, certamente, o tema pungente, ou os temas pungentes, de uma sobrevivente da bomba atômica, de um doente terminal de Aids, de judeus torturados durante o Holocausto... e assim vai. Diante de uma tragédia humana encenada, coletiva ou individual, quem ousaria criticar? (O criticado pode insinuar que o crítico menospreza o sofrimento do outro...) O segundo fator de consagração é a grandiloqüência do espetáculo, misturando a pirotecnia de uma superprodução com os desempenhos hercúleos de personagens como as de Maria Luisa Mendonça. Afinal, são cinco horas quase ininterruptas de performance... Quem ousaria então apontar o dedo para uma falha diante do esforço monumental de atores e produtores? Só um monstro... O crítico de teatro? O fato é que Os Sete Afluentes do Rio Ota não está acima do bem e do mal. Primeiro, pelo que foi exposto. (Existe inocência na blindagem anticrítica?) Depois, porque poderia ser todo esse espetáculo grandioso que promete – e que se proclama em toda parte –, não apelasse tanto para o cross-media que infesta o teatro atual. (O teatro brasileiro, em outras palavras, anda por demais contaminado de cinema e de televisão...) Por último, Maria Luisa Mendonça não precisava de toda essa ginástica para se revelar como a grande atriz que sempre foi. Enfim: Os Sete Afluentes do Rio Ota vai entrar para a história por ter emocionado uma multidão, mas também por conta de um “juízo crítico”, hoje hegemônico, que se deixa contaminar mais por emoções do que por verdadeiras razões.
>>> Os Sete Afluentes do Rio Ota - Monique Gardenberg e Michele Matelon - Sesc Pinheiros
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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