Quarta-feira,
7/3/2007
Ora, ora
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 319 >>>
Se você não tinha nenhuma pista sobre de onde vinha a voz de Marcelo Camelo, sua impostação e o seu cantar, agora pode sanar essas e outras dúvidas. A resposta está na família mesmo, no CD de Bebeto Castilho, Amendoeira, do ano passado, pela Biscoito Fino, cuja música tema, aliás, é composição do mesmo vocalista do Los Hermanos. É um disco manso, como o Camelo – novamente – em 4 (2005), que, de início, não espanta, mas que, devagar, vai conquistando. Na contramão das superproduções da MPB – com “maestros” e arranjos engessadíssimos –, Bebeto Castilho vai conduzindo seu Amendoeira valorizando uma forma muitas vezes considerada fora de moda, a forma-canção. Canta baixo – de modo que se tem de abaixar o volume do acompanhamento –, mas produz um canto sincero, de quem ficou anos fora do circuito, aperfeiçoando sua mensagem, como um João Gilberto ainda mais arredio ao estúdio e ainda mais radical em relação à indústria. Como o mestre baiano, não importa tanto o quê Castilho está cantando mas que ele está cantando, ponto. “A Vizinha do Lado”, de Caymmi, por exemplo, é virada pelo avesso: em Amendoeira, é mais a admiração do vizinho tímido do que a provocação máscula, e atrevida, do compositor Dorival. “Beijo Distraído”, no contraponto perfeito de Nina Becker, dá o caráter da interpretação de Bebeto Castilho: “Um dia, a gente dá um beijo distraído/ E aí, olha nos olhos, comovido/ E vê que não há nada mais para falar”. “Amendoeira”, a própria, confunde-se com “Porta de Cinema”... – numa, canta Marcelo Camelo, o compositor da outra (adivinha, se conseguir, qual é qual). Mais “uma”, para encerrar a exemplificação: “Pode ser?”, de Geraldo Pereira e Marino Pinto, porque, fora Bebeto e Thalma de Freitas, ninguém mais dá “bonjour” ou tem “rêve d’amour”... Caetano Veloso confessa, no encarte, que morreu de inveja de Camelo em Amendoeira. Caetano, que quer estar em todas – e que, por isso, não tem nada a ver com esta –, talvez sofra, entretanto, o efeito benéfico dos eflúvios do CD. Como Camelo, quem sabe abandone as guitarras roqueiras de vez em quando.
>>> Amendoeira
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Julio Daio Borges
Editor |
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