Sexta-feira,
25/5/2007
E se você me desse um beijo?
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 330 >>>
Coetzee vem aí, para falar de Beckett. Não devemos nos fiar, portanto, na opinião de Ferreira Gullar, em Vinicius, para quem Beckett “é muito chato”. Não pode ser isso; não pode ser só isso. E, em 2006, a editora Martins Fontes lançou Novelas, para quem quer uma introdução, por escrito (já que, em teatro, Beckett volta e meia é encenado). Como autor, é mais lembrado, claro, por Esperando Godot, mas quase não se fala que Beckett, por exemplo, foi pupilo de Joyce, com quem discutia Hume, e por quem a filha de Joyce, já meio desequilibrada, enlouqueceu de amores. Beckett nem por isso. Além das edições bonitíssimas da Cosac Naify – das obras-primas de Beckett –, o mercado brasileiro conheceu, há alguns anos, um perfil dele assinado por Cioran, o filósofo, numa edição da Rocco. Falou-se, então, da fase “francesa” de Beckett, em Paris, da sua obsessão em busca do nada, e da palavra que representasse, melhor, esse “nada”. Agora, em prefácio de Fábio de Souza de Andrade, e na cronologia da edição preparada por Vadim Nikitin, descobrimos que Beckett escreveu muito, assustadoramente muito, e foi sempre seu próprio tradutor do francês para o inglês e vice-versa. Morreu bastante velho e quando ligaram para falar do Nobel, provavelmente se lembrando de Joyce, respondeu que só podia ser engano, desligando o telefone (Gullar, um dos mais cotados, em língua portuguesa, possivelmente não daria a mesma corajosa resposta, diria repetindo-se: “Eu não quero ter razão: eu quero é ser feliz!”. E Beckett, teria retrucado: “Sempre me surpreendi com a pouca sutileza de meus contemporâneos, eu, cuja alma se contorcia da manhã à noite, na mera busca de si mesma”.) Novelas, o volume, cumpre bem sua função: os acontecimentos não são importantes, mas, ao mesmo tempo, é um prato cheio para aqueles apreciadores da mais pura linguagem. Poetas? “Não se deve fechar os olhos, deve-se deixá-los abertos no escuro, é minha opinião”.
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Julio Daio Borges
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