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Sexta-feira, 21/3/2008
O Passado, de Hector Babenco

Julio Daio Borges




Digestivo nº 359 >>> Qual o peso do passado? Ele pode atormentar o presente e até impedir que haja futuro? Baseado no livro de Alan Pauls, Hector Babenco filmou uma obra-prima, O Passado (pra quê mais?), com Gael García Bernal e Analía Couceyro, agora em DVD. Rímini e Sofía resolvem se separar depois de doze anos de casamento e um amor adolescente "de vida inteira". Mas não conseguem. Separam-se fisicamente apenas. Rímini, mais convicto, se atira sobre os primeiros relacionamentos que aparecem. Sofía, mais relutante, insinua que quer voltar, arrepende-se do rompimento, monitora a vida do outro, depois chantageia, se revolta contra a realidade e, por fim, enlouquece. Rímini enlouquece também, mas na solidão, depois de envolver-se com uma ciumenta paranóica, uma intelectual com inclinações fortes para a maternidade e uma ninfomaníaca de academia, e, de novo, com "Sophy", a inescapável Sofía. De diálogos literários, numa Buenos Aires que nunca é feia (e numa São Paulo que sempre é), O Passado não tem um "final", quanto mais feliz, porque a própria vida não "acaba", e porque, como em psicanálise, o que importa é o "processo". Incômodo para o espectador contemporâneo, que notoriamente tem dificuldade em manter longos relacionamentos, o filme é perturbador também para casais estabilizados, porque mostra, no fundo, que uma relação, hoje, está constantemente ameaçada pela instabilidade geral (externa) e pela instabilidade de cada um (interna). Vamos todos enlouquecer como Rímini ou Sofía? Ou será que já não enlouquecemos todos? É o que se fica perguntando, depois de assistir às idas e vindas dos personagens — às vezes arquetípicos, às vezes concretíssimos — de Pauls e Babenco. Gael, que vive seu auge como ator desde Almodóvar, está naturalmente em um de seus melhores momentos; e Analía Couceyro é uma revelação (ao menos para o lado brasileiro da platéia). Babenco, longe das temáticas sociais, se consagra também como um diretor intimista, dos "pequenos" conflitos, nesse claro-escuro que mexe com as nossas poucas certezas e que, portanto, nos diz tanto. O Passado é o presente e talvez seja, ainda por muito tempo, também o futuro.
>>> O Passado
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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